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284 AMAZÔNIA REVELADA<br />

“o Pará foi vítima do maior espólio que um Estado já<br />

sofreu” e complementa que o governo federal,<br />

num passe de mágica e sem consultar o Estado, sem<br />

ouvir a classe política, transferiu para o domínio da<br />

União todas as terras situadas numa faixa de 100 quilômetros<br />

às margens das rodovias federais construídas<br />

ou em construção na Amazônia. Um segundo decreto<br />

assegurou para o domínio da União os 100 quilômetros<br />

laterais das estradas “projetadas”. Nesse dia, o Pará<br />

perdeu 70% do seu território, cuja administração evidentemente<br />

passou para os órgãos federais. E a inexistência<br />

do diálogo entre os órgãos federais e os estaduais<br />

gerou um caos na questão fundiária paraense. 35<br />

Barata atribui a esses fatos um imenso número<br />

de conflitos, pois algo em torno de 6 milhões de hectares<br />

já tinham sido alienados pelo Estado do Pará entre<br />

1955 e 196436 . O governo estadual não tinha controle<br />

das terras que alienava e os adquirentes, em sua maciça<br />

maioria do Centro-Sul, nem sequer imaginavam<br />

onde elas ficavam, então só lhes serviam como reserva<br />

de capital. Com a abertura das rodovias, a situação<br />

mudou, ocorreu valorização das terras e esses compradores<br />

foram atrás delas. E aí se estabelece um quadro<br />

tão kafkiano como trágico: deparam-se, frente a frente,<br />

os colonos, com títulos federais, e os investidores<br />

do Centro-Sul, com títulos estaduais. A lei do cão é o<br />

meio para resolver a demanda. E muitas vezes com o<br />

auxílio da própria Polícia Militar, que, a serviço dos<br />

grandes proprietários, passa a ser instrumento de<br />

opressão contra os posseiros.<br />

A contribuição do Estado ao clima de violência<br />

não se limitou à criação de condições ideais para os<br />

conflitos na região. Diante do caos e do ambiente tenso<br />

gerados pelo programa de “integração nacional”,<br />

sua própria consolidação requeria mais que financiamento<br />

e o Estado não hesitou em colocar suas agências<br />

e seu aparato policial do lado dos interesses privados<br />

dos grandes proprietários e contra os pequenos<br />

agricultores, ameaçadores do tão almejado “progresso”.<br />

Nas disputas entre pequenos e grandes, a simples<br />

omissão do poder público estimulava e deixava vigorar<br />

a lei do mais forte. A pistolagem e a formação de<br />

milícias por latifundiários nunca foram reprimidas;<br />

fraudes na titulação de terras nunca foram coibidas,<br />

graças a ausência, impotência, descaso ou colaboração<br />

do poder policial e judiciário. Há, ainda hoje, uma<br />

enorme população sem direito algum, tendo a injustiça<br />

como regra.<br />

Em 2001, a Comissão de Direitos Humanos da<br />

Câmara dos Deputados, debruçada sobre a violência<br />

no campo, encontrou um agravamento desse quadro,<br />

cujos responsáveis são, além de particulares, o próprio<br />

Estado, sempre a reafirmar suas preferências. Enquanto,<br />

das 534 execuções de trabalhadores rurais ocorridas<br />

entre 1971 e 200137 , apenas duas foram julgadas38 , de<br />

abril a julho de 2001, somente nas regiões sul e sudeste<br />

do Estado do Pará, foco histórico da violência no<br />

campo, 126 lavradores foram detidos por ocupação de<br />

terras, a maior média já registrada:<br />

O governo do Estado promoveu nesse período [abril<br />

a julho de 2001] uma ofensiva, por meio de diversas<br />

operações policiais de desocupação [...]. Grandes aparatos<br />

envolvendo dezenas de policiais, dotados de<br />

equipamentos novos (não disponíveis em outras áreas<br />

críticas de segurança pública no Estado), a um custo

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