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ecursos naturais disponíveis é a única possibilidade de<br />

ascensão social. Essa foi a realidade que se construiu. E<br />

a nova oligarquia que se forma, pequena e pobre, antevê<br />

em qualquer mudança dessa dinâmica a perda de<br />

tudo aquilo que foi construído com o único modo<br />

que a fronteira permitiu. Nada é mais útil à verdadeira<br />

oligarquia do que esse pensar. Os pequenos são vistos<br />

como “fundo de investimentos futuros”. Hoje estão<br />

em terras mais afastadas e menos valorizadas, mas,<br />

assim que houver maior demanda por elas, a situação<br />

de irregularidade é a garantia certa de que serão novamente<br />

engolidos.<br />

Procederes do grande, ao ser reproduzidos pelo<br />

pequeno, sofrem curiosas adaptações. Até mesmo a<br />

exploração do trabalho escravo se torna prática desse<br />

“colonizado” a reproduzir o colonizador.<br />

Em 19 de dezembro de 2004, João Jacson fugia<br />

de Jacareacanga com a família rumo a Novo Progresso.<br />

A trajetória da família é ilustrativa. Originário de<br />

Altamira, João fora a Jacareacanga trabalhar numa<br />

derrubada na fazenda de um morador de Itaituba (antigo<br />

migrante nordestino). Após quatro meses de trabalho,<br />

nem o primeiro dos salários – combinado em<br />

500 reais mensais – havia sido pago e o trabalho terminava.<br />

O patrão autoriza, então, João a vender um<br />

pequeno motor (3,5 HP) para amortização do atrasado.<br />

Como o valor apurado com a venda foi apenas 800 reais,<br />

João solicita seu saldo ao contratante, que, em<br />

tom intimidatório, diz ter tido seu motor roubado e<br />

afirma ter feito um boletim de ocorrência. Em seguida,<br />

João é procurado pela polícia, que diz que irá<br />

prendê-lo caso não fuja imediatamente.<br />

O primeiro ônibus a partir levava, assustados e<br />

nervosos, pai, mãe, três crianças e um tranqüilo gato,<br />

MAURÍCIO TORRES 311<br />

emblematicamente batizado com o nome do patrão.<br />

Essa forma de trabalho escravo dispensa a figura<br />

do “gato” e vale-se da própria polícia, que se põe a serviço<br />

do “cidadão de bem”. Na delegacia local não fora<br />

lavrado nenhum boletim de ocorrência.<br />

Também é importante notar que um dos motivos<br />

que levaram a família a permanecer meses recebendo<br />

apenas um suprimento de alimento foi o acesso,<br />

quase inédito, a serviços públicos básicos como escolinha,<br />

creche e posto de saúde. Esses atendimentos<br />

acabaram por ser usados pelo contratante como modo<br />

de os manter sem salários e como argumento de que<br />

não teriam mais o que receber.<br />

O mesmo ônibus levava outros três trabalhadores<br />

em situações absolutamente idênticas. A única diferença<br />

era o uso de gado no lugar do motor.<br />

Quando perguntei a João se já se inscrevera em<br />

algum programa de reforma agrária, ele me olhou<br />

como se eu tivesse dito o maior disparate e respondeu:<br />

“Claro que não! Sou pobre. A terra a prefeitura dá<br />

pros ricos”.<br />

ENTRE TORAS E COVAS<br />

A autopromoção dos grupos madeireiros instalados<br />

no eixo da rodovia da divisa com Mato Grosso até<br />

Itaituba como “geradores de emprego” é o grande<br />

mote para pressionar o governo a conceder-lhes facilidades.<br />

Mas o argumento não resiste ao mínimo exame.<br />

Dificilmente se encontram, nos pátios das madeireiras,<br />

funcionários registrados e com direitos trabalhistas<br />

assegurados. A maioria dos trabalhadores é do<br />

Maranhão e Piauí. Dificilmente se vê alguém que<br />

more no lugar há mais de dois anos. Aliás, as princi-

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