26.04.2013 Views

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

um herói”. 1 O poeta Theodore de Banville desenvolveu esse tema dois a<strong>no</strong>s mais<br />

t<strong>ar</strong>de, em um tocante tributo diante do túmulo de Baudelaire:<br />

Ele aceitou o homem moder<strong>no</strong> em sua plenitude, com suas fra<strong>que</strong>zas,<br />

suas aspirações e seu desespero. Foi, assim, capaz de conferir beleza a<br />

visões <strong>que</strong> não possuíam beleza em si, não por fazê-las romanticamente<br />

pitorescas, mas por trazer à luz a porção de alma humana ali escondida;<br />

ele pôde revel<strong>ar</strong>, assim, o coração triste e muitas vezes trágico da cidade<br />

moderna. É por isso <strong>que</strong> assombrou, e continu<strong>ar</strong>á a assombr<strong>ar</strong>, a mente<br />

do homem moder<strong>no</strong>, comovendo-o, enquanto outros <strong>ar</strong>tistas o deixam<br />

frio. 2<br />

A reputação de Baudelaire, ao longo dos cem a<strong>no</strong>s após sua morte, desenvolveu-<br />

se segundo as linhas sugeridas por Banville: quanto mais seriamente a cultura<br />

ocidental se preocupa com o advento da modernidade, tanto mais apreciamos a<br />

originalidade e a coragem de Baudelaire, como profeta e pioneiro. Se tiv<strong>é</strong>ssemos<br />

de apont<strong>ar</strong> um primeiro modernista, Baudelaire seria sem dúvida o escolhido.<br />

Con<strong>tudo</strong>, uma das qualidades mais evidentes dos muitos escritos de Baudelaire<br />

sobre vida e <strong>ar</strong>te moderna consiste em assinal<strong>ar</strong> <strong>que</strong> o sentido da modernidade<br />

<strong>é</strong> surpreendentemente vago, difícil de determin<strong>ar</strong>. Tomemos, por exemplo, uma<br />

de suas assertivas mais famosas, de “O Pintor da Vida Moderna”: “Por<br />

‘modernidade’ eu entendo o efêmero, o contingente, a metade da <strong>ar</strong>te cuja outra<br />

metade <strong>é</strong> eterna e imutável”. O pintor (ou romancista ou filósofo) da vida<br />

moderna <strong>é</strong> a<strong>que</strong>le <strong>que</strong> concentra sua visão e energia na “sua moda, sua moral,<br />

suas emoções”, <strong>no</strong> “instante <strong>que</strong> passa e (em) todas as sugestões de eternidade<br />

<strong>que</strong> ele cont<strong>é</strong>m”. Esse conceito de modernidade <strong>é</strong> concebido p<strong>ar</strong>a romper com as<br />

antiquadas fixações clássicas <strong>que</strong> dominam a cultura francesa. “Nós, os <strong>ar</strong>tistas,<br />

somos acometidos de uma tendência geral a vestir todos os <strong>no</strong>ssos assuntos<br />

com uma roupagem do passado”. A f<strong>é</strong> est<strong>é</strong>ril de <strong>que</strong> vestimentas e gestos<br />

<strong>ar</strong>caicos produzirão verdades eternas deixa a <strong>ar</strong>te francesa imobilizada em “um<br />

abismo de beleza abstrata e indeterminada” e priva-a de “originalidade”, <strong>que</strong><br />

só<br />

130<br />

pode advir do “selo <strong>que</strong> o Tempo imprime em todas as gerações”. * Percebe-se o <strong>que</strong><br />

* M<strong>ar</strong>x, na mesma d<strong>é</strong>cada, reclamava, em termos surpreendentemente simil<strong>ar</strong>es aos de Baudelaire, das clássicas<br />

e antigas fixações na política de es<strong>que</strong>rda: “A tradição de todas as gerações mortas pesa como um sonho mau<br />

<strong>no</strong> c<strong>é</strong>rebro das gerações rivas. E exatamente quando p<strong>ar</strong>ecem engajados na revolução, na criação de algo<br />

inteiramente <strong>no</strong>vo (...), os homens ansiosamente conjurant os espíritos do passado, tomam de empr<strong>é</strong>stimo seus<br />

131

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!