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tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

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e administrado e, em conseqüência, “mais agradável e vantajoso” <strong>que</strong> qual<strong>que</strong>r<br />

metrópole moderna poderia ser. Como uma visão de esperança p<strong>ar</strong>a a Rússia, o sonho<br />

de Vera Pavlovna <strong>é</strong> uma engenhosa v<strong>ar</strong>iação da famili<strong>ar</strong> esperança populista de um<br />

“salto” do feudalismo p<strong>ar</strong>a o socialismo, eliminando-se a sociedade burguesa e<br />

capitalista do Ocidente moder<strong>no</strong>. Aí, o salto será de uma vida rural tranqüila e<br />

subdesenvolvida p<strong>ar</strong>a uma vida desurbanizada, tranqüila e abundantemente<br />

desenvolvida, sem ter de se pass<strong>ar</strong> por uma vida de urbanismo turbulento. P<strong>ar</strong>a<br />

Chemyshevski, o palácio de Cristal simboliza a sentença de morte contra “São<br />

Petersburgo, Londres e P<strong>ar</strong>is”; essas cidades serão, na melhor das hipóteses, museus<br />

do atraso <strong>no</strong> admirável mundo <strong>no</strong>vo.<br />

Essa visão deverá <strong>no</strong>s ajud<strong>ar</strong> a localiz<strong>ar</strong> os termos do desacordo entre Dostoievski e<br />

Chemyshevski. O Homem do Subterrâneo diz <strong>que</strong> teme esse edifício por<strong>que</strong> “não se<br />

poderá mostr<strong>ar</strong> a língua, às escondidas, nem fazer figa dentro do bolso”. Ele está<br />

errado, <strong>é</strong> cl<strong>ar</strong>o, quanto ao palácio de Cristal de Paxton, a <strong>que</strong>m centenas de pessoas<br />

educadas e cultas mostr<strong>ar</strong>am a língua, mas certo quanto ao de Chemyshevski; em<br />

outras palavras, errado quanto à realidade da modernização ocidental, tão cheia de<br />

dissonância e conflito, por<strong>é</strong>m certo quanto à fantasia russa de modernização como um<br />

t<strong>é</strong>rmi<strong>no</strong> p<strong>ar</strong>a a dissonância e conflito. Esse ponto deverá cl<strong>ar</strong>ific<strong>ar</strong> uma das causas<br />

principais do amor de Dostoievski pela cidade moderna, principalmente por<br />

Petersburgo, a sua cidade: ela <strong>é</strong> o ambiente ideal p<strong>ar</strong>a se mostr<strong>ar</strong> a língua, isto <strong>é</strong>,<br />

p<strong>ar</strong>a se encen<strong>ar</strong> e trabalh<strong>ar</strong> os conflitos pessoais e sociais. Em outras palavras: se o<br />

palácio de Cristal <strong>é</strong> a rejeição do “sofrimento, dúvida e negação”, as ruas e praças,<br />

pontes e aterros de São Petersburgo são precisamente onde essas experiências e<br />

impulsos estão mais à vontade.<br />

O Homem do Subterrâneo progride <strong>no</strong>s infinitos projetos de sofrimento, dúvida,<br />

negação, desejo e luta de São Petersburgo. São precisamente essas experiências <strong>que</strong><br />

o tornam, como ele mesmo diz (e Dostoievski sublinha, na última página do livro), “mais<br />

vivo” <strong>que</strong> os leitores educados — ele os chama de “cavalheiros” — <strong>que</strong> fogem dele e de<br />

seu mundo (“Progresso seria Petersburgo <strong>que</strong>im<strong>ar</strong> por inteiro”, disse o general irritadiço,<br />

em Fumaça, de Turguenev). Devemos agora ser capazes de compreender como Notas<br />

do Subterrâneo pode ser, simultaneamente, um ata<strong>que</strong> severo às ideologias da<br />

modernização russa e uma das grandes obras canônicas do pensamento moder<strong>no</strong>.<br />

Dostoievski, na sua crítica ao palácio de Cristal, está atacando a modernidade dos<br />

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