26.04.2013 Views

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

poderia sobreviver — a junho de 1848, ou dezembro de 1851;<br />

132<br />

mas, num espírito am<strong>ar</strong>go como o de Baudelaire, foi belo enquanto durou. De qual<strong>que</strong>r<br />

modo, essa visão pastoral proclama a natural afinidade entre modernização material e<br />

modernização espiritual; sustenta <strong>que</strong> os grupos mais dinâmicos e i<strong>no</strong>vadores na vida<br />

econômica e política serão os mais abertos à criatividade intelectual e <strong>ar</strong>tística — “p<strong>ar</strong>a<br />

concretiz<strong>ar</strong> a id<strong>é</strong>ia de futuro em todas as suas formas”; essa visão enc<strong>ar</strong>a as<br />

mudanças econômicas e culturais como progresso huma<strong>no</strong> sem obstáculos. 7<br />

O ensaio de Baudelaire “O Pintor da Vida Moderna” (1859-60) apresenta uma esp<strong>é</strong>cie<br />

muito diferente de pastoral: aqui a vida moderna surge como um grande show de moda,<br />

um sistema de ap<strong>ar</strong>ições deslumbrantes, brilhantes fachadas, espetacul<strong>ar</strong>es triunfos<br />

de decoração e estilo. Os heróis de toda essa pompa são o pintor e ilustrador<br />

Constantin Guys e a figura <strong>ar</strong><strong>que</strong>típica do Dândi segundo Baudelaire. No mundo<br />

pintado por Guys, o espectador “se m<strong>ar</strong>avilha com a (...) esfuziante h<strong>ar</strong>monia da vida<br />

nas grandes cidades, uma h<strong>ar</strong>monia providencialmente preservada em meio ao tumulto<br />

da liberdade humana”. Leitores famili<strong>ar</strong>izados com Baudelaire se espant<strong>ar</strong>ão de ouvi-<br />

lo fal<strong>ar</strong> como o dr. Pangloss; perguntamo-<strong>no</strong>s qual <strong>é</strong> a piada, at<strong>é</strong> concluir <strong>que</strong><br />

lamentavelmente não há piada nenhuma. “A esp<strong>é</strong>cie de assunto preferido pelo <strong>no</strong>sso<br />

<strong>ar</strong>tista (...) <strong>é</strong> a pompa da vida (la pompe de la vie) tal como existe p<strong>ar</strong>a ser<br />

contemplada nas capitais do mundo civilizado; a pompa da vida milit<strong>ar</strong>, da vida<br />

elegante, da vida galante (la vie militaire, la vie <strong>é</strong>l<strong>é</strong>gante, la vie galante).” Se volt<strong>ar</strong>mos<br />

aos luzidios esboços do beautiful people e seu mundo, realizados por Guys, veremos<br />

apenas uma v<strong>ar</strong>iedade de fantasias ap<strong>ar</strong>atosas ocupadas por manequins sem vida e<br />

de rostos vazios. Mas não <strong>é</strong> culpa de Guys <strong>que</strong> sua <strong>ar</strong>te se assemelhe tanto aos<br />

anúncios de Bonwit ou Bloomingdale. O <strong>que</strong> <strong>é</strong> triste <strong>é</strong> <strong>que</strong> Baudelaire tenha escrito<br />

algumas páginas perfeitamente sintonizadas com isso:<br />

Ele (o pintor da vida moderna) se delicia com finas c<strong>ar</strong>ruagens e<br />

orgulhosos corc<strong>é</strong>is, a esplendorosa sagacidade dos caval<strong>ar</strong>iços, a<br />

destreza dos pedestres, o sinuoso and<strong>ar</strong> das mulheres, a beleza das<br />

crianças, felizes de est<strong>ar</strong>em vivas e bem-vestidas — numa palavra, ele<br />

se delicia com a vida universal. Se o estilo do talhe de uma roupa<br />

teve uma mudança sutil, se ondas e c<strong>ar</strong>acóis foram suplantados por<br />

topetes, se os laços se al<strong>ar</strong>g<strong>ar</strong>am e os co<strong>que</strong>s desceram um quasenada<br />

em direção à base do pescoço, se as cinturas se elev<strong>ar</strong>am e as<br />

saias se torn<strong>ar</strong>am mais cheias, não tenha dúvida de <strong>que</strong> o olho<br />

aquili<strong>no</strong> de Guys o detect<strong>ar</strong>á. 8<br />

134

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!