26.04.2013 Views

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

gravatas e em <strong>no</strong>ssas botas de couro legítimo. No próximo a<strong>no</strong>,<br />

esperemos <strong>que</strong> os verdadeiros pesquisadores <strong>no</strong>s contemplem com a<br />

extraordinária delícia de celebr<strong>ar</strong> o advento do <strong>no</strong>vo! 15<br />

O pensamento não está desenvolvido de maneira adequada, con<strong>tudo</strong> dois aspectos<br />

merecem ser salientados. Primeiro, a ironia baudelaireana a respeito das “gravatas”:<br />

muitos poderão pens<strong>ar</strong> <strong>que</strong> a justaposição de heroísmo e gravatas <strong>é</strong> uma piada; e <strong>é</strong>,<br />

mas a piada consiste precisamente em mostr<strong>ar</strong> <strong>que</strong> os homens moder<strong>no</strong>s são<br />

heróicos, não obstante a ausência da p<strong>ar</strong>afernália heróica tradicional; com efeito, eles<br />

são ainda mais heróicos, sem a p<strong>ar</strong>afernália p<strong>ar</strong>a infl<strong>ar</strong> seus corpos e almas. * Segundo,<br />

a tendência moderna de fazer sempre <strong>tudo</strong> <strong>no</strong>vo: a vida moderna do a<strong>no</strong> <strong>que</strong> vem<br />

p<strong>ar</strong>ecerá e será diferente da deste a<strong>no</strong>; todavia, ambas f<strong>ar</strong>ão p<strong>ar</strong>te da mesma era<br />

moderna. O fato de <strong>que</strong> você não pode pis<strong>ar</strong> duas vezes na mesma modernidade<br />

torn<strong>ar</strong>á a vida moderna especialmente indefinível, difícil de apreender.<br />

Baudelaire vai ainda mais fundo <strong>no</strong> heroísmo moder<strong>no</strong>, um a<strong>no</strong> mais t<strong>ar</strong>de, <strong>no</strong> breve<br />

ensaio assim intitulado. 16 Aqui ele se faz mais concreto: “O espetáculo da vida elegante<br />

(la vie <strong>é</strong>l<strong>é</strong>gante) e as milh<strong>ar</strong>es de experiências fluidas — crimi<strong>no</strong>sos e mulheres<br />

reclusas — <strong>que</strong> se<br />

139<br />

amontoam <strong>no</strong>s subterrâneos de uma grande cidade; a Gazette des Tribunaux e o<br />

Moniteur provam <strong>que</strong> <strong>tudo</strong> o <strong>que</strong> precisamos <strong>é</strong> abrir os olhos p<strong>ar</strong>a reconhecer <strong>no</strong>sso<br />

heroísmo”. O mundo da moda aí está, como est<strong>ar</strong>á <strong>no</strong> ensaio sobre Constantin Guys;<br />

apenas ap<strong>ar</strong>ece aqui sob uma forma nitidamente não-pastoral, vinculada ao<br />

submundo, com seus sombrios desejos e compromissos, seus crimes e castigos;<br />

ganha assim uma profundidade humana muito mais <strong>ar</strong>rebatadora <strong>que</strong> os pálidos<br />

esboços de “O Pintor da Vida Moderna”. O ponto crucial do heroísmo moder<strong>no</strong>, como<br />

Baudelaire o vê aqui, <strong>é</strong> <strong>que</strong> ele emerge em conflito, em situações de conflito <strong>que</strong><br />

permeiam a vida cotidiana <strong>no</strong> mundo moder<strong>no</strong>. Baudelaire dá exemplos da vida<br />

burguesa, bem como das altas esferas da moda e das formas mais baixas de vida: o<br />

político heróico, o ministro de gover<strong>no</strong> vergastando, na Assembl<strong>é</strong>ia, os seus opositores<br />

com um discurso inflamado e contundente, clamando contra sua política e contra si<br />

* “Vejam-se os comentários de Baudelaire, <strong>no</strong> ensaio “Heroísmo da Vida Moderna”, sobre o ter<strong>no</strong> preto ou cinza,<br />

<strong>que</strong> estava se tornando a moda masculina stand<strong>ar</strong>d: ele expressa “não apenas beleza política, <strong>que</strong> <strong>é</strong> uma<br />

expressão de igualdade universal, mas tamb<strong>é</strong>m beleza po<strong>é</strong>tica, expressão da alma pública”. A emergente moda<br />

padronizada confere “o necessário g<strong>ar</strong>bo à <strong>no</strong>ssa idade sofrida, <strong>que</strong> veste o símbolo da perp<strong>é</strong>tua lamentação sobre<br />

os seus negros ombros fi<strong>no</strong>s” (p. 118).<br />

141

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!