26.04.2013 Views

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

crescido na d<strong>é</strong>cada seguinte. Outros deix<strong>ar</strong>am a Rússia p<strong>ar</strong>a continu<strong>ar</strong> seus<br />

es<strong>tudo</strong>s na Europa ocidental, principalmente na Suíça, e em geral nas<br />

faculdades de ciência e medicina. A vida na Nevski voltou ao <strong>no</strong>rmal: pass<strong>ar</strong>-se-<br />

ia mais de uma d<strong>é</strong>cada antes da próxima demonstração. Con<strong>tudo</strong>, por um breve<br />

momento, os petersburguenses sentiram o sabor de um confronto político nas<br />

ruas da cidade. Essas ruas tinham se definido irrevogavelmente como espaço<br />

político. A literatura russa da d<strong>é</strong>cada de 1860 se esforç<strong>ar</strong>ia p<strong>ar</strong>a preencher esse<br />

espaço imaginativamente.<br />

CHERNYSHEVSKI: A RUA COMO FRONTEIRA<br />

A primeira grande cena de confronto da d<strong>é</strong>cada de 1860 foi imaginada e escrita<br />

na cela de uma masmorra. Em julho de 1862, o editor e critico radical Nikólai<br />

Chernyshevski foi preso sob acusações vagas de subversão e conspiração contra<br />

o Estado. Na verdade, não havia qual<strong>que</strong>r evidência contra Chernyshevski, <strong>que</strong><br />

tom<strong>ar</strong>a o cuidado de limit<strong>ar</strong> sua atividade ao campo da literatura e das id<strong>é</strong>ias.<br />

Conseqüentemente, faz-se necessário fabric<strong>ar</strong> alguma evidência. Como isso<br />

tomou tempo do gover<strong>no</strong>, Chernyshevski permaneceu preso, sem julgamento,<br />

por quase dois a<strong>no</strong>s, nas masmorras da fortaleza Pedro-Paulo, a mais<br />

205<br />

antiga construção de São Petersburgo, e sua bastilha at<strong>é</strong> 1917. * No final, um tribunal<br />

secreto o conden<strong>ar</strong>ia à prisão perp<strong>é</strong>tua na Sib<strong>é</strong>ria, onde serviria por vinte a<strong>no</strong>s, e seria<br />

libertado somente quando sua saúde estava <strong>ar</strong>ruinada, sua mente perturbada e a<br />

morte próxima. Seu m<strong>ar</strong>tírio o f<strong>ar</strong>ia um dos santos dos anais da intelligentsia russa.<br />

Enquanto tremia de frio na solitária, esperando seu caso ser resolvido, Chernyshevski<br />

lia e escrevia febrilmente. Seu trabalho mais substancial na prisão foi um romance<br />

intitulado Que Fazer?. O livro, <strong>que</strong> ap<strong>ar</strong>eceu em 1863 sob forma de seriado, sobreviveu<br />

* A fortaleza <strong>é</strong> digna de <strong>no</strong>ta devido à sua ressonância simbólica e importância política e milit<strong>ar</strong>. Veja-se o caso de<br />

Trotski, em outubro de 1905, denunciando o manifesto de 17 de outubro de Nicolau II,.<strong>que</strong> havia prometido um<br />

gover<strong>no</strong> representativo e uma constituição: “Olhem ao redor, cidadãos. Alguma coisa mudou? A fortaleza Pedro-Paulo<br />

ainda não domina a cidade? Ainda não se ouvem gemidos e ranger de dentes por detrás de suas amaldiçoadas<br />

p<strong>ar</strong>edes?”. Em Petersburgo, romance po<strong>é</strong>tico de Andrei Bieli, tamb<strong>é</strong>m de outubro lê-se: “acima das p<strong>ar</strong>edes brancas da<br />

fortaleza, a torre impiedosa de Pedro-Paulo dolorosamente saliente avançava fria p<strong>ar</strong>a o c<strong>é</strong>u”. Vemos aí uma pol<strong>ar</strong>idade<br />

simbólica nas percepções dos petersburguenses quanto aos dois m<strong>ar</strong>cos verticais mais <strong>no</strong>tórios na paisagem urbana<br />

opressivamente horizontal: a torre dourada do Almirantado cristalizava toda a promessa de vida e alegria da cidade; o<br />

campanário de pedra da fortaleza m<strong>ar</strong>cava a ameaça do Estado à<strong>que</strong>la promessa, a sombra permanente contra o sol da<br />

cidade.<br />

213

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!