26.04.2013 Views

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

41<br />

e nós mesmos o veremos — <strong>é</strong> a radical transformação de todo o mundo físico, moral e<br />

social em <strong>que</strong> ele vive. A heroicidade do Fausto goethia<strong>no</strong> prov<strong>é</strong>m da liberação de<br />

tremendas energias humanas reprimidas, não só nele mesmo, mas em todos os <strong>que</strong> ele<br />

toca e, eventualmente, em toda a sociedade a sua volta. Por<strong>é</strong>m, o grande<br />

desenvolvimento <strong>que</strong> ele inicia — intelectual, moral, econômico, social — representa um<br />

altíssimo custo p<strong>ar</strong>a o ser huma<strong>no</strong>. Este <strong>é</strong> o sentido da relação de Fausto com o diabo:<br />

os poderes huma<strong>no</strong>s só podem se desenvolver atrav<strong>é</strong>s daquilo <strong>que</strong> M<strong>ar</strong>x chama de “os<br />

poderes ocultos”, negras e aterradoras energias, <strong>que</strong> podem irromper com força<br />

tremenda, p<strong>ar</strong>a al<strong>é</strong>m do controle huma<strong>no</strong>. O Fausto de Goethe <strong>é</strong> a primeira e ainda a<br />

melhor trag<strong>é</strong>dia do desenvolvimento.<br />

A história do Fausto pode ser acompanhada atrav<strong>é</strong>s de três metamorfoses: ele ap<strong>ar</strong>ece<br />

primeiro como O Sonhador; em seguida, graças à mediação de Mefisto, transforma-se<br />

em O Amador, e finalmente, bem depois do desenlace da trag<strong>é</strong>dia do amor, ele atingirá<br />

o clímax de sua vida, como O Fomentador.<br />

PRIMEIRA METAMORFOSE: O SONHADOR<br />

Quando as cortinas se abrem, 6 encontramos Fausto sozinho em seu qu<strong>ar</strong>to, t<strong>ar</strong>de da<br />

<strong>no</strong>ite, sentindo-se trapaceado. “Ah! Est<strong>ar</strong>ei ainda preso nesta jaula? Neste maldito<br />

buraco lugubre nas p<strong>ar</strong>edes! (...) De qual<strong>que</strong>r modo, há um mundo imenso lá fora!”<br />

(398-99, 418) Essa cena devia cham<strong>ar</strong>-<strong>no</strong>s a atenção: Fausto se insere em uma longa<br />

linhagem de heróis e heroínas moder<strong>no</strong>s surpreendidos falando a si mesmos <strong>no</strong> meio da<br />

<strong>no</strong>ite. Normalmente, por<strong>é</strong>m, o falante <strong>é</strong> jovem, pobre, inexperiente — decerto privado de<br />

experiências pelas b<strong>ar</strong>reiras de classe, de sexo ou de raça de uma sociedade cruel.<br />

Fausto não <strong>é</strong> apenas um homem de meia-idade (<strong>é</strong> um dos primeiros heróis de meia-<br />

idade na literatura moderna; o capitão Ahab talvez seja o seguinte), mas um homem de<br />

meia-idade tão bem-sucedido quanto <strong>é</strong> possível, <strong>no</strong> seu mundo. É reconhecido e<br />

estimado como m<strong>é</strong>dico, advogado, teólogo, filósofo, cientista, professor e administrador<br />

de ensi<strong>no</strong>. Surpreendemos Fausto cercado de belos e r<strong>ar</strong>os livros e manuscritos,<br />

pinturas e diagramas, instrumentos científicos — toda a p<strong>ar</strong>afernália de uma vida<br />

espiritual bem-sucedida. No entanto, <strong>tudo</strong> quanto ele conseguiu soa vazio, <strong>tudo</strong> em<br />

volta dele p<strong>ar</strong>ece um monte de sucata. Ele fala a si mesmo, sem cess<strong>ar</strong>, e diz <strong>que</strong> nem<br />

36

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!