26.04.2013 Views

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

tudo que é sólido desmancha no ar - Comunicação, Esporte e Cultura

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Pedro”. Aquilo <strong>que</strong>, de início, soa como um clichê cívico, mostr<strong>ar</strong>á ser uma horrível<br />

ironia: a n<strong>ar</strong>rativa <strong>que</strong> se segue deix<strong>ar</strong>á cl<strong>ar</strong>o <strong>que</strong> os elementos não fizeram as pazes<br />

com Petersburgo — na verdade, não foram nem dominados realmente —, <strong>que</strong> são de<br />

todo poderosos e <strong>que</strong> o espírito de Pedro permanece acordado, vigilante e vingativo.<br />

“Houve uma <strong>é</strong>poca terrível — da qual fal<strong>ar</strong>ei agora.” Assim começa a história. Puchkin<br />

enfatiza o pret<strong>é</strong>rito, como se a dizer <strong>que</strong> o horror havia passado, mas a história <strong>que</strong> se<br />

segue mostr<strong>ar</strong>á <strong>que</strong> isso <strong>é</strong> falso. “Na Petrogrado coberta de nuvens, <strong>no</strong>vembro<br />

respirava o frio de outo<strong>no</strong>. Qual doente inquieto <strong>no</strong> leito, o Neva se lançava p<strong>ar</strong>a fora,<br />

fustigando o belo cais com ondas altas. Era t<strong>ar</strong>de da <strong>no</strong>ite, e escuro. A chuva batia<br />

furiosa contra as janelas, e o vento uivava dolorosamente.” Neste momento, em meio à<br />

chuva e ao vento, divisamos Evgeni, o herói de Puchkin. Ele <strong>é</strong> o primeiro herói da<br />

literatura russa, e um dos primeiros da literatura mundial, a pertencer à grande massa<br />

urbana anônima. “Nosso herói ocupa um qu<strong>ar</strong>to pe<strong>que</strong><strong>no</strong>, e trabalha em algum lug<strong>ar</strong>”,<br />

um funcionário público de baixo escalão. Puchkin sugere a possibilidade de sua família<br />

haver tido posição social <strong>no</strong> passado, mas a memória e mesmo a imaginação se<br />

perderam. “E então, de volta p<strong>ar</strong>a casa, ele sacudiu o sobre<strong>tudo</strong>, tirou a roupa e foi<br />

p<strong>ar</strong>a a cama, mas não pôde dormir por muito tempo, perturbado <strong>que</strong> estava por<br />

pensamentos diversos. Que pensamentos? Que ele era pobre, <strong>que</strong> tinha de trabalh<strong>ar</strong><br />

por uma independência decente” — ironia, por<strong>que</strong> veremos quão indecentemente<br />

dependente ele <strong>é</strong> forçado a ser —, “<strong>que</strong> Deus poderia ter-lhe concedido mais<br />

inteligência e dinheiro, <strong>que</strong> ele teria de esper<strong>ar</strong> dois a<strong>no</strong>s pela promoção, <strong>que</strong> o rio<br />

estava cheio por demais, <strong>que</strong> o tempo não havia melhorado, <strong>que</strong> as pontes poderiam<br />

ser destruídas, e sua P<strong>ar</strong>asha certamente sentiria sua falta. (...) Nesse momento, ele<br />

se encheu de ternura; sua fantasia, tal qual a de um poeta, elevou-se às alturas.”<br />

Evgeni está apaixonado por uma g<strong>ar</strong>ota ainda mais pobre <strong>que</strong> ele e <strong>que</strong> mora numa<br />

das ilhas mais expostas e longínquas na extremidade da cidade. Enquanto sonha com<br />

ela, vemos a mod<strong>é</strong>stia e a simplicidade de seus desejos: “Cas<strong>ar</strong>-se? Bem, por <strong>que</strong><br />

não? Construirei eu<br />

178<br />

mesmo um cantinho p<strong>ar</strong>a nós e oferecerei tranqüilidade a P<strong>ar</strong>asha. Uma cama, duas<br />

cadeiras, um caldeirão de sopa de repolhos, e eu o chefe da casa. Que mais poderia<br />

<strong>que</strong>rer?... Nos fins de semana, lev<strong>ar</strong>ei P<strong>ar</strong>asha p<strong>ar</strong>a passe<strong>ar</strong> <strong>no</strong> campo; serei humilde e<br />

dissimulado, eles me d<strong>ar</strong>ão um c<strong>ar</strong>go confortável; P<strong>ar</strong>asha cuid<strong>ar</strong>á da casa, cri<strong>ar</strong>á os<br />

182

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!