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Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb

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O teatro-educação enquanto componente curricular no meio rural: uma experiência na escola comunitária Brilho do Cristal<br />

brincar de pular virou as tranças de Rapunzel.<br />

Tais idéias, fruto <strong>da</strong> imaginação <strong>da</strong>s crianças,<br />

eram experimenta<strong>da</strong>s e refleti<strong>da</strong>s por todos<br />

nós. Sempre incentivei a experimentação <strong>da</strong>s<br />

idéias, tínhamos muito tempo, muito espaço,<br />

muito corpo, ain<strong>da</strong> éramos crianças, se errássemos,<br />

se não desse certo, mu<strong>da</strong>ríamos, misturaríamos<br />

e transformaríamos. Nosso lema era:<br />

vamos ver se dá certo.<br />

O principal objetivo em nossas construções<br />

cênicas não era a formação de ator e sim experimentar<br />

o fazer teatral baseado em brincadeiras<br />

e jogos teatrais. Para que, de maneira lúdica,<br />

a criança pudesse se apropriar dos elementos<br />

constituintes do Teatro e, conseqüentemente,<br />

fazer uso dos mesmos em seus processos criativos,<br />

expressivos e estéticos. Koudela observa<br />

que: “O objetivo do sistema de jogos teatrais não<br />

é a interpretação, mas a atuação que surge <strong>da</strong><br />

relação de jogo”. (1998, p.50)<br />

O jogo, a ludici<strong>da</strong>de propicia prazer, descontração,<br />

espontanei<strong>da</strong>de; pré-requisitos importantíssimos<br />

para a fluência dos processos criativos.<br />

Spolin substitui o termo ator por jogador. Com o<br />

intuito de formarmos jogadores teatrais (assumindo<br />

a terminologia de Spolin), produzimos<br />

muitas cenas interessantes. O desejo de mostrá-las<br />

era grande, as crianças se sentiam, de<br />

fato, autoras, criadoras <strong>da</strong>s cenas. Com certeza,<br />

compartilhar o resultado desse processo com<br />

a comuni<strong>da</strong>de escolar era inevitável.<br />

Apresentar o Teatro à comuni<strong>da</strong>de era interessante<br />

pelo caráter de entretenimento e pela<br />

oportuni<strong>da</strong>de do público, a partir <strong>da</strong> apreciação,<br />

identificar alguns elementos do Teatro: camarim,<br />

coxia, palco, platéia, personagens e texto.<br />

Mas, antes de tudo, era significativo pelo reconhecimento<br />

dos processos criativos <strong>da</strong>s crianças:<br />

reconhecê-las como construtoras de suas<br />

estórias, de seus conceitos. Precisávamos construir<br />

uma cultura teatral, cultura essa que valorizaria<br />

o processo criativo.<br />

Os finais <strong>da</strong>s apresentações eram fortemente<br />

marcados pelos aplausos que me enchiam<br />

de alegria. Sentia a pulsação do Teatro na nossa<br />

escola, não só enquanto entretenimento, mas,<br />

sobretudo, enquanto processo criativo-interativo.<br />

A maioria dos pais e amigos do Brilho do<br />

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Cristal gostava muito do Teatro, o que estava<br />

muito bem refletido através dos aplausos, <strong>da</strong>s<br />

risa<strong>da</strong>s, dos comentários positivos e incentivadores<br />

após as apresentações. Mas não só tínhamos<br />

aplausos, lamentavelmente havia<br />

aqueles que não assistiam, não aplaudiam e falavam<br />

assim: essa escola é de bruxa, essa<br />

Escola só faz brincar...<br />

A fama de Escola de bruxa parece ter nascido<br />

<strong>da</strong>s tantas apresentações de Rapunzel, <strong>da</strong>s<br />

tantas risa<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s bruxas que ecoavam na vizinhança.<br />

A personagem bruxa é muito popular<br />

no mundo <strong>da</strong> literatura infantil, cheio de mistério,<br />

tanto que a bruxa passou a ser cotadíssima<br />

pelas crianças no Teatro e <strong>da</strong>í tornaram-se inevitáveis<br />

às repeti<strong>da</strong>s apresentações de Rapunzel.<br />

Aos poucos, a idéia de escola de bruxa foi<br />

se diluindo na medi<strong>da</strong> em que vieram as fa<strong>da</strong>s,<br />

os gnomos, os sacis, os lobisomens e as crianças.<br />

Quanto ao comentário Escola que só faz<br />

brincar considero tal questionamento pertinente<br />

à reali<strong>da</strong>de dos pais <strong>da</strong>s crianças nativas, uma<br />

vez que eles não conheciam nenhuma escola<br />

que colocasse como priori<strong>da</strong>de a brincadeira, a<br />

alegria, no processo de ensino e aprendizagem.<br />

Apostamos nas brincadeiras, mesmo sabendo<br />

que teríamos que enfrentar um conflito cultural.<br />

Procuramos compreender o motivo de tais<br />

reações, afinal nossa escola abalava os princípios<br />

<strong>da</strong> educação tradicional, vigente no Vale<br />

do Capão. Sabíamos que o diálogo levaria a todos<br />

uma melhor compreensão <strong>da</strong> questão: brincar<br />

ou não brincar? Procuramos dialogar sobre<br />

tais questões em nossas reuniões pe<strong>da</strong>gógicas,<br />

em nossas assembléias e em visitas particulares<br />

às casas dos nativos. 5 Sempre procuramos<br />

falar <strong>da</strong> importância <strong>da</strong>s brincadeiras, do<br />

Teatro e <strong>da</strong>s artes em geral para o processo de<br />

desenvolvimento <strong>da</strong> criança. Também aproveitamos<br />

a temática em questão para esclarecermos<br />

e fortalecermos nossas propostas em<br />

relação a uma pe<strong>da</strong>gogia que respeita o homem<br />

integral, que tem corpo, que pensa, que brinca,<br />

que imagina, que cria. Em nossos encontros<br />

5 Nossas visitas aconteciam periodicamente a partir <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong>des.<br />

Inicialmente visitamos quase que to<strong>da</strong> a população<br />

para esclarecimento sobre os objetivos <strong>da</strong> nossa escola.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>da</strong> <strong>FAEEBA</strong> – <strong>Educação</strong> e Contemporanei<strong>da</strong>de, Salvador, v. 15, n. 25, p. 99-115, jan./jun., 2006

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