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Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb

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A exclusão também ocorre na participação<br />

em ativi<strong>da</strong>des lúdicas, pois nos momentos em<br />

que as crianças deveriam estar freqüentando a<br />

escola e participando de ativi<strong>da</strong>des lúdicas, são<br />

explora<strong>da</strong>s no âmbito do trabalho, muitas vezes,<br />

escravo, conforme afirma este estu<strong>da</strong>nte<br />

em entrevista desta pesquisa:<br />

A melhor lembrança <strong>da</strong> infância era quando eu<br />

jogava bola com meus amigos. Só tinha o domingo<br />

para brincar, mas com tempo contado,<br />

porque às cinco horas <strong>da</strong> tarde tinha que soltar<br />

os animais que estavam amarrados. Eram só duas<br />

ou três horas de brincadeira por semana, só no<br />

domingo. Tinha domingo que nem brincava. Os<br />

meus amigos iam me chamar em casa, mas eu<br />

não podia sair, porque estava trabalhando. (Josias<br />

Brandão, 33 anos).<br />

Apesar de todo este panorama de exclusão<br />

social, percebe-se, por outro lado, que olhar para<br />

os estu<strong>da</strong>ntes jovens e adultos é possibilitar-se<br />

ao encontro com sujeitos que trazem consigo<br />

uma significativa bagagem de experiências<br />

construí<strong>da</strong>s ao longo <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, que contribuíram<br />

para o que são hoje e, ao mesmo tempo, para a<br />

construção <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> cultura.<br />

Considerar o analfabeto brasileiro apenas<br />

como um sujeito sem conhecimentos proporcionados<br />

pela falta de leitura sistematiza<strong>da</strong>, além<br />

do autoritarismo expresso nesta conduta, é desconsiderar<br />

que a educação se dá em diferentes<br />

contextos <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> humana e não somente na<br />

escola. Esse conhecimento construído por jovens<br />

e adultos, ao longo de suas vi<strong>da</strong>s, é expresso<br />

por Nelma Pereira Silva, estu<strong>da</strong>nte <strong>da</strong><br />

alfabetização de jovens e adultos, ao ser questiona<strong>da</strong><br />

sobre as ações que ela poderia desempenhar<br />

por meio <strong>da</strong> habili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> leitura e <strong>da</strong><br />

escrita:<br />

Ah! Eu ia escrever tudo o que aconteceu de bom<br />

e de ruim na minha vi<strong>da</strong>. Eu teria um diário ou<br />

escreveria um livro. Eu tenho muita coisa para<br />

contar. Mas só tenho coisas ruins para contar.<br />

Mas não vou falar, não. Se fosse escrever, eu<br />

escreveria. Um dia, você vai ler meu livro e vai<br />

saber <strong>da</strong>s minhas histórias, ia saber <strong>da</strong>s coisas<br />

que eu fiz e as que eu deixei de fazer. A senhora<br />

precisaria de muito tempo para ler to<strong>da</strong>s elas.<br />

(Nelma Pereira Silva, 27 anos, estu<strong>da</strong>nte <strong>da</strong> alfabetização<br />

de jovens e adultos).<br />

<strong>Revista</strong> <strong>da</strong> <strong>FAEEBA</strong> – <strong>Educação</strong> e Contemporanei<strong>da</strong>de, Salvador, v. 15, n. 25, p. 133-146, jan./jun., 2006<br />

Cilene Nascimento Can<strong>da</strong><br />

Compreender os educandos adultos que<br />

apresentam suas experiências de vi<strong>da</strong> marca<strong>da</strong>s<br />

pelo analfabetismo é considerá-los<br />

como parte integrante de uma classe social<br />

esqueci<strong>da</strong> pelos poderes públicos, fruto de<br />

uma cultura marca<strong>da</strong> por profun<strong>da</strong>s desigual<strong>da</strong>des<br />

sociais. Significa verificar que tais sujeitos<br />

não se consideram capazes de contribuir<br />

para a implementação <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> cultural e política<br />

do país. Olhar para a educação de jovens<br />

e adultos é conviver com sujeitos que<br />

apresentam a auto-estima espezinha<strong>da</strong> pelas<br />

práticas sociais excludentes. É confrontar-se<br />

com a busca e a esperança por uma digni<strong>da</strong>de<br />

a ser conquista<strong>da</strong> por meio <strong>da</strong> aquisição<br />

<strong>da</strong> leitura e <strong>da</strong> escrita, conforme ressalta a<br />

educan<strong>da</strong> entrevista<strong>da</strong>:<br />

Dizer que não sei ler é motivo para <strong>da</strong>rem risa<strong>da</strong><br />

ou criticarem quem não sabe ler. Eu fico com vergonha,<br />

me sinto muito mal. As pessoas só querem<br />

destruir a gente, só porque a gente não sabe<br />

como elas sabem. Quero aprender para poder<br />

ensinar aos meus netos também. (Rosa Maria<br />

Lima, estu<strong>da</strong>nte entrevista<strong>da</strong>, 53 anos).<br />

A análise desta estu<strong>da</strong>nte demonstra a imposição<br />

de um sistema hierárquico que estabelece<br />

a escrita como uma estrutura que está<br />

situa<strong>da</strong> acima dos seres humanos e não como<br />

um produto do processo de construções culturais.<br />

Indica também a impregnação cultural<br />

dos grupos sociais, nos quais a escrita<br />

estabelece uma relação de poder no convívio<br />

entre os sujeitos, separando aqueles que sabem<br />

e os que ain<strong>da</strong> não sabem ler. Esta distinção<br />

contribui, intensivamente, para ferir a<br />

auto-estima de jovens e adultos que se matriculam<br />

na escola, na busca de uma valorização<br />

humana nas relações estabeleci<strong>da</strong>s na<br />

família, no bairro, no trabalho e em outros<br />

setores sociais.<br />

Assim, para compreender os diversos fatores<br />

que contribuem para a baixa auto-estima de<br />

jovens e adultos, é necessária uma reflexão mais<br />

abrangente <strong>da</strong>s condições que estão submeti<strong>da</strong>s<br />

estas classes economicamente desfavoreci<strong>da</strong>s,<br />

frente a um processo de desqualificação <strong>da</strong>s práticas<br />

culturais volta<strong>da</strong>s para a coletivi<strong>da</strong>de e a<br />

inclusão social.<br />

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