Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb
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Fala e escuta de professores em sala de aula<br />
222<br />
nos autoriza a substituir a expressão “relação<br />
analista – paciente” pela expressa “relação professor-aluno”.<br />
(KUPFER, 2001, p.88)<br />
As representações ancora<strong>da</strong>s na relação<br />
transferencial foram reveladoras de que a ênfase<br />
<strong>da</strong><strong>da</strong> às relações professor-aluno não estavam<br />
apenas no valor dos conteúdos transmitidos,<br />
mas sobretudo nas relações afetivas e de<br />
saber estabeleci<strong>da</strong>s entre estes atores e é nesse<br />
momento que a fala do professor ganha força,<br />
passando, com isso, a ser escuta<strong>da</strong>.<br />
Observou-se que, no momento de conclusão<br />
<strong>da</strong> aula, as representações sociais ancora<strong>da</strong>s<br />
na repressão se fizeram presentes. Nesse<br />
sentido, dizem os professores.<br />
A maioria de vocês não entregou o trabalho, o<br />
trabalho, me aguardem! Vocês vão ver o que vai<br />
acontecer com vocês <strong>da</strong>qui pra frente!<br />
Apenas cinco alunos apresentaram o trabalho e<br />
os demais não fizeram. Vou solicitar uma reunião<br />
de pais para apertar a cor<strong>da</strong> de vocês.<br />
Hoje está sendo o último dia de discurso, agora<br />
eu vou agir.<br />
Estas falas, possivelmente, têm a intenção<br />
de barrar comportamentos indesejáveis apresentados<br />
pelo aluno no que se refere às tarefas<br />
escolares. Constitui-se de um dispositivo que<br />
muitas vezes o professor utiliza para tentar<br />
modelar o comportamento do aluno. Chemama,<br />
falando de repressão diz: “Qualquer impulso,<br />
fora <strong>da</strong> consciência, de um conteúdo<br />
representado como desprazeroso ou inaceitável;<br />
ação do aparelho psíquico sobre o afeto”<br />
(1995, p. 192)<br />
Vale salientar que essas representações, simboliza<strong>da</strong>s<br />
nas falas do professor, são carrega<strong>da</strong>s<br />
de conteúdos repressivos para modificar a<br />
conduta <strong>da</strong> classe. O professor parece querer<br />
que os alunos apren<strong>da</strong>m a emitir um comportamento<br />
que possa se aproximar de maior disciplina<br />
e responsabili<strong>da</strong>de com vistas a atingir seus<br />
objetivos pe<strong>da</strong>gógicos.<br />
Nas entrevistas realiza<strong>da</strong>s, a fala dos professores<br />
foi submeti<strong>da</strong> ao mesmo processo de<br />
categorização que indicou duas categorias teórico-interpretativas:<br />
ambivalência e frustração.<br />
A ambivalência presente nos discursos dos pro-<br />
fessores revela a coexistência de tendências<br />
afetivas opostas em relação a uma mesma situação.<br />
As falas dos professores ilustram esta<br />
oposição:<br />
Não sei o que é melhor, ser professora <strong>da</strong> rede<br />
particular ou ensinar na rede pública. Essa profissão<br />
é mesmo difícil.<br />
Meus alunos em sala de aula são normais. Alguns<br />
alunos apresentam dificul<strong>da</strong>des, problemas<br />
de comportamento também. É normal, agora com<br />
certas restrições...<br />
Eles não estão querendo mais ouvir. Não ouvem.<br />
Estão só querendo conversar, brincar. Não<br />
sei se é o sistema mesmo de ensino que está<br />
decadente, mas acho que, particularmente, esse<br />
é o melhor ensino que ain<strong>da</strong> existe.<br />
São falas ambivalentes que pontuam os conflitos<br />
de sala de aula, onde o movimento de<br />
melhor/pior; saber/não saber, estão presentes e<br />
expressos em meio a dois sentimentos opostos.<br />
Neste contexto, Kaufmann diz: ”O mais freqüente<br />
e o mais dramático são essas publicações<br />
duplas serem próprias de representações<br />
de pessoas que o sujeito teme, ou ama ao mesmo<br />
tempo.” (1996, p. 25-26)<br />
Essa ambivalência, muitas vezes, é apresenta<strong>da</strong><br />
com certo mal-estar e denota a dificul<strong>da</strong>de<br />
que o professor tem enfrentado em li<strong>da</strong>r com<br />
o novo, com o diferente em sala de aula. Superar<br />
este mal-estar implica que o professor no<br />
cotidiano <strong>da</strong> sala de aula pense o sentido simbólico<br />
<strong>da</strong> ambivalência na relação pe<strong>da</strong>gógica<br />
e possa construir representações que forneçam<br />
o encontro <strong>da</strong> escuta desses discursos, com vistas<br />
a entender as marcas do desejo que circulam<br />
entre professor e aluno.<br />
Frustração foi também uma categoria que<br />
se evidenciou nas entrevistas dos professores.<br />
As falas a seguir são ilustrativas dessa representação:<br />
Sinto-me por baixo quando me esforço para ensinar<br />
e vejo os resultados estão abaixo <strong>da</strong> média.<br />
O nível do aluno está ca<strong>da</strong> vez mais baixo. O<br />
aluno está ca<strong>da</strong> dia mais chegando à sala de aula<br />
mais despreparado.<br />
O pior de tudo são as conversas paralelas. Eu<br />
acho que quando há conversas paralelas é por-<br />
<strong>Revista</strong> <strong>da</strong> <strong>FAEEBA</strong> – <strong>Educação</strong> e Contemporanei<strong>da</strong>de, Salvador, v. 15, n. 25, p. 211-225, jan./jun., 2006