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Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb

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constrangedora, as crianças nativas eram extremamente<br />

reprimi<strong>da</strong>s, suas vozes eram abafa<strong>da</strong>s,<br />

podíamos perceber, através de sua postura<br />

corporal, vergonha, susto e medo. Porém não<br />

era difícil roubar um sorriso de sua boca.<br />

A dificul<strong>da</strong>de no processo de aprendizagem<br />

apresenta<strong>da</strong> pelo grupo nativo era enorme em<br />

relação à comunicação e expressão, tanto corporal<br />

quanto emocional. A maioria <strong>da</strong>s crianças<br />

nativas já tinha freqüentado outro modelo<br />

escolar e trazia marcas de uma educação tradicional,<br />

autoritária, centra<strong>da</strong> na cópia e no castigo.<br />

Conhecia de perto a repressão escolar e o<br />

descaso dos órgãos públicos, no caso a prefeitura,<br />

com a Instituição Escola.<br />

Trabalhar o Teatro numa perspectiva libertadora<br />

significou a construção de uma proposta<br />

pe<strong>da</strong>gógica cujas bases eram o diálogo, o amor,<br />

a brincadeira, a improvisação e a construção<br />

coletiva. Acreditávamos que assim poderíamos<br />

contribuir para um melhor desenvolvimento físico,<br />

emocional e racional <strong>da</strong>s crianças. Coletivamente,<br />

na sala de aula com os alunos e no<br />

planejamento com os professores discutíamos<br />

nossas propostas, nossas experiências. Como<br />

aponta Freire (1996, p. 39) “é pensando criticamente<br />

a prática de hoje ou de ontem que se<br />

pode melhorar a próxima prática”. Assim busquei<br />

a construção de um Teatro experimental<br />

libertador.<br />

A partir <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de vigente me perguntava:<br />

Como construir uma proposta metodológica libertadora<br />

que consiga preencher as tantas lacunas<br />

detecta<strong>da</strong>s? Como formar ci<strong>da</strong>dãos capazes<br />

de ler e interpretar o mundo que os rodeia? Como<br />

impedir a evasão? Essas perguntas norteavam<br />

minha prática, por vezes me perseguiam.<br />

Além do impressionante quadro de abandono<br />

4 <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> no Vale do Capão, fiquei impressiona<strong>da</strong><br />

com a reação <strong>da</strong>s crianças diante<br />

dos alternativos. Quando as crianças viam um<br />

visitante ou um novo morador do Vale do Capão,<br />

corriam e se escondiam atrás <strong>da</strong> porta,<br />

deixando parte do rosto para o lado de fora.<br />

Num movimento de dentro para fora os seus<br />

rostos saíam, se moviam. Através dessa reação,<br />

dessa imagem, via um gesto de resistência<br />

à inibição, um espanto e uma curiosi<strong>da</strong>de dian-<br />

<strong>Revista</strong> <strong>da</strong> <strong>FAEEBA</strong> – <strong>Educação</strong> e Contemporanei<strong>da</strong>de, Salvador, v. 15, n. 25, p. 99-115, jan./jun., 2006<br />

Rilmar Lopes <strong>da</strong> Silva<br />

te do novo, confirmando a premissa de Freire:<br />

A curiosi<strong>da</strong>de como inquietação in<strong>da</strong>gadora,<br />

como inclinação ao desvelamento de algo, como<br />

pergunta verbaliza<strong>da</strong> ou não, como procura de<br />

esclarecimento, como sinal de atenção que sugere<br />

alerta faz parte integrante do fenômeno vital.<br />

Não haveria criativi<strong>da</strong>de sem a curiosi<strong>da</strong>de<br />

que nos move e nos põe pacientemente impaciente<br />

diante do mundo que não fizemos, acrescentando<br />

nele algo que fazemos. (1996; p.32)<br />

A curiosi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s crianças me deixava curiosa.<br />

Apostei nesta curiosi<strong>da</strong>de que nos movia.<br />

Juntos podíamos criar e recriar muitas<br />

estórias e através do Teatro contá-las. Nesse<br />

processo de reconhecimento, de troca, de práticas<br />

e de reflexões, íamos trocando, nos <strong>da</strong>ndo<br />

conta <strong>da</strong> nossa reali<strong>da</strong>de e <strong>da</strong>s nossas necessi<strong>da</strong>des.<br />

As interrogações me perseguiam: como interferir<br />

de maneira construtiva nos processos<br />

de aprendizagens <strong>da</strong>s crianças? Elas precisavam<br />

ler e entender o mundo em que viviam,<br />

precisavam falar, chorar, discor<strong>da</strong>r, brincar, gritar,<br />

<strong>da</strong>nçar, poetizar, pintar e teatralizar. Acreditava<br />

que através do Teatro-educação poderia<br />

ajudá-las a ler as palavras, os gestos, o olhar, o<br />

silêncio, as formas e o mundo.<br />

O diálogo tão defendido por Paulo Freire<br />

tornou-se ação imprescindível em nossas práticas<br />

pe<strong>da</strong>gógicas. A práxis pe<strong>da</strong>gógica passou<br />

a ter seu lugar de honra no Brilho do Cristal.<br />

Entre ação-reflexão-acão fui construindo minha<br />

proposta teatral. Sendo a coletivi<strong>da</strong>de terreno<br />

fértil para desenvolvimento <strong>da</strong>s crianças e<br />

inerente à natureza do Teatro, na busca de um<br />

fazer teatral crítico e criativo, procurávamos<br />

exercitar o máximo a valorização <strong>da</strong> coletivi<strong>da</strong>de,<br />

todos eram sujeitos do processo. Em ro<strong>da</strong><br />

refletíamos nossas práticas pe<strong>da</strong>gógicas, nossas<br />

propostas cênicas, as temáticas trabalha<strong>da</strong>s<br />

eram discuti<strong>da</strong>s e sugeri<strong>da</strong>s pelas crianças.<br />

As construções coletivas nasciam a partir de<br />

4 Abandono pe<strong>da</strong>gógico vivido por muitos anos, revelado<br />

por uma população basicamente composta de analfabetos,<br />

inconscientes <strong>da</strong> real necessi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> educação para o desenvolvimento<br />

<strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de. Até o final dos anos oitenta<br />

prevalecia a educação autoritária, as orelhas de burros, e o<br />

índice de abandono a Escola era alarmante.<br />

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