Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb
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que inviabilizam ou dificultam um trabalho que<br />
se paute na ludici<strong>da</strong>de. Dessa forma, defendo<br />
a importância dos cursos de formação, seja inicial<br />
ou continua<strong>da</strong>, em possibilitarem o acesso<br />
às discussões que vêm sendo feitas sobre a relevância<br />
<strong>da</strong> ludici<strong>da</strong>de. Essas discussões, porém,<br />
devem vir acompanha<strong>da</strong>s de vivências lúdicas<br />
para que os/as professores possam desbloquear<br />
suas resistências e experienciar sensações, como<br />
flexibili<strong>da</strong>de, inteireza e prazer. Assim, os professores<br />
compreenderão melhor o interesse <strong>da</strong>s<br />
crianças por essas ativi<strong>da</strong>des e se sentirão mais<br />
permeáveis em oferecer essas oportuni<strong>da</strong>des<br />
para os seus alunos. Essa junção do conhecimento<br />
teórico e vivencial pode possibilitar mexer<br />
nos valores e nas crenças que as professoras<br />
têm sobre a ludici<strong>da</strong>de, fazendo com que elas<br />
compreen<strong>da</strong>m a importância desse elemento no<br />
trabalho educativo.<br />
Acrescento o fato de que essas experiências,<br />
juntamente com um momento de reflexão<br />
sobre elas e a posição assumi<strong>da</strong> frente à vivência<br />
lúdica na escola, podem possibilitar às professoras<br />
reverem as suas crenças, a partir <strong>da</strong><br />
instauração <strong>da</strong>s dúvi<strong>da</strong>s, do desafio de caminhar<br />
por lugares ain<strong>da</strong> incertos. Nesse sentido,<br />
as crenças podem ser mobiliza<strong>da</strong>s a partir <strong>da</strong><br />
atitude aprendente, flexível do educador em<br />
relação a questionar as suas “ver<strong>da</strong>des”. Desestabilizar<br />
as “certezas” que temos também<br />
constitui movimento de formação para os educadores.<br />
As crenças não são imutáveis. Assim, trazê-las<br />
à tona não é “culpar” as professoras pelos<br />
males <strong>da</strong> educação, mas demonstrar como<br />
essas convicções, associa<strong>da</strong>s a outros mecanismos,<br />
interferem na elaboração e perpetuação<br />
de ideais que nem sempre são os mais<br />
adequados para a efetivação de um processo<br />
educativo de quali<strong>da</strong>de para as crianças pobres.<br />
Ao mesmo tempo, constato que o movimento<br />
realizado pelas ludici<strong>da</strong>de e as ativi<strong>da</strong>des<br />
lúdicas é exatamente o de romper com esses<br />
estereótipos presentes na sala de aula, pois<br />
mexe com a lineari<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s crenças, por exemplo,<br />
em relação ao papel que professores e alunos<br />
assumem no processo pe<strong>da</strong>gógico: professor<br />
que transmite aluno que absorve. Esse aspecto<br />
<strong>Revista</strong> <strong>da</strong> <strong>FAEEBA</strong> – <strong>Educação</strong> e Contemporanei<strong>da</strong>de, Salvador, v. 15, n. 25, p. 55-77, jan./jun., 2006<br />
Ilma Maria Fernandes Soares; Bernadete de Souza Porto<br />
causa desconforto em alguns/mas professores,<br />
pois é com essas “ver<strong>da</strong>des” que foi possível<br />
construir a sua compreensão do trabalho educativo.<br />
Ain<strong>da</strong> sobre os estereótipos, em vários<br />
momentos durante a fala <strong>da</strong>s professoras, em<br />
especial de Teresinha e Margari<strong>da</strong>, ficou clara<br />
a sensação de desconforto que sentem quando<br />
se propõem a fazer ativi<strong>da</strong>des lúdicas; inclusive<br />
é essa sensação que determina continuar ou<br />
não um trabalho com esse caráter.<br />
Um aspecto que considero relevante e que,<br />
na minha compreensão, pode ser considerado um<br />
fator que justifica a resistência de algumas professoras<br />
em realizar um trabalho pautado na ludici<strong>da</strong>de,<br />
diz respeito ao fato de que a<br />
incorporação desse elemento à prática pe<strong>da</strong>gógica<br />
não significa somente modificar as suas convicções<br />
sobre esse aspecto contingencialmente,<br />
mas incita a mexer em to<strong>da</strong> a sua rede de crenças<br />
sobre o processo educacional, que abrange<br />
sua visão de educação, escola, papel assumido<br />
por professores e alunos, processo de ensinoaprendizagem<br />
etc. Diante desse fato, de que alterar<br />
um dos componentes interfere em to<strong>da</strong> a<br />
estrutura do sistema de crenças, a viabilização<br />
de um trabalho lúdico não é fácil de ser congregado<br />
ao trabalho docente, pois incita outra forma<br />
de sentir, pensar e agir, o que justifica a<br />
presença do tradicionalismo no fazer de muitos/<br />
as educadores/as, pois foi assim que aprenderam<br />
a exercer o seu papel educacional, mas, ao<br />
mesmo tempo, é algo possível e enriquecedor.<br />
Por meio desta análise, é possível também<br />
sinalizar a marcante presença dos pressupostos<br />
tradicionais no trabalho pe<strong>da</strong>gógico <strong>da</strong> maioria<br />
<strong>da</strong>s professoras. Essa presença justifica-se<br />
porque tal tendência oferece ao professor maior<br />
segurança, uma vez que estabelece papéis<br />
bem determinados entre educandos/as e educadores/as,<br />
frente ao tratamento com os conteúdos,<br />
o ensino etc. Já a ludici<strong>da</strong>de corta essa<br />
polarização, pois, tanto o/a professor/a quanto<br />
o/a aluno/a assumem um papel ativo na elaboração<br />
do conhecimento, estabelecem uma relação<br />
mais horizontaliza<strong>da</strong>, o que, diante <strong>da</strong>s<br />
crenças dos/as professores/as, torna o trabalho<br />
pe<strong>da</strong>gógico mais difícil e, ain<strong>da</strong>, na compreensão<br />
de alguns deles/as, muitas vezes, inviável.<br />
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