Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb

More documents

Recommendations

Info

que aquilo que se está ensinando não está interessante para o aluno. Pode-se dizer que a frustração é um estado do sujeito que se acha impossibilitado de obter o objeto de prazer que almeja. Nesse sentido, frustração é compreendida como “denominando qualquer impossibilidade do sujeito se apropriar daquilo que deseja.” (CHEMAMA, 1995, p. 88). Os discursos dos professores são reveladores do quanto o professor expressa o desejo de algo que lhe falta: os resultados desfavoráveis podem ser entendidos como a insatisfação do professor devido à recusa do aluno em atender uma exigência libidinal. É possível afirmar que as falas dos professores são marcadas de representações que desvelam sentimentos frustrados que implicam falta, ou seja, falta algo, há um obstáculo que precisa ser revisto. É possível dizer que a fala dos professores participantes da pesquisa é permeada de frustração porque seus objetivos disciplinadores e pedagógicos não foram alcançados. Uma insatisfação bordeja seu trabalho pedagógico, denuncia a não escuta do aluno, o professor, por isso, busca encontrar o objeto perdido... Pode-se pensar que essas representações sociais emergiram porque se revelam em ato. Este ato foi conduzido pelo pesquisador que no olhar, percepção e escuta, tentou fotografar algumas imagens, mesmo que tênues, da escuta da fala do professor em sala de aula, uma vez que revelaram, ainda que inconscientemente, ser ele mesmo o sujeito da falta, sujeito do desejo. Em alguns momentos da observação e da entrevista, pude perceber que havia por parte dos professores um movimento de transmitir. Mostraram algo mais do que comunicar a informação, evidenciaram o desejo de escutar o aluno, mas é possível pensar que a escuta realizada tenha sido um trabalho feito pelas bordas, na medida em que não se registrou participação da classe, o que ficou registrado foi uma voz apenas – a do professor – que tentou anunciar uma mensagem ainda que difusa, mensagem de falas que não foram (des)cobertas. Maria de Lourdes S. Ornellas Diante dos passos construídos, a minha argumentação é de que a fala e a escuta de professores em sala de aula vão além da transmissão de conteúdos, mas se revestem de subjetividades em que afetos, emoções, crenças, valores, contradições e representações permeiam seu discurso. O professor é possuidor da sua cultura e da sua história, desenvolve relação consigo mesmo, com o outro e com o mundo, e essas dimensões estão (entre) laçadas na sala de aula. Estes achados, sem dúvida, representam um avanço no conhecimento sobre a temática, na medida em que apontam alguns elementos essenciais das representações da fala e escuta de professores em sala de aula. No entanto, ao mesmo tempo, tornam cada vez mais precisa a necessidade de transpor o nível de constatação, seja do que se passa no cotidiano da sala de aula, seja do que ocorre no imaginário do professor e do aluno. Faz-se necessário refletir como e por que essas falas e escutas são construídas e ressignificadas. Constituímos, como educadores, nossas próprias representações e, em razão delas, orientamos nossas atividades e as impomos ao aluno, na suposição de que sabemos o que é melhor para ele. Conhecer as representações sociais dos professores constituiu-se uma boa trilha para ajudar a ajustar com maior visibilidade o quanto a fala e a escuta em sala de aula podem contribuir na eficácia do projeto pedagógico da escola. Este estudo pode contribuir para a educação na medida em que permite elaborar um novo problema: o que o professor acha que o aluno fala e escuta? Talvez seja uma outra porta que poderá ser aberta com vistas a dar passagem para outros achados na busca de também dar voz e ouvido ao aluno. Pode-se também arrematar que os professores envolvidos neste estudo exercitaram, em certa medida, a transmissão; os trabalhos de preenchimento da falta foram estruturantes para o ensaio das representações sociais pela via de ancorar sua fala e escuta em sala de aula. Esta pesquisa não esgota aqui e agora, por isso ela não se conclui de quase todo, mas exige outras Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 15, n. 25, p. 211-225, jan./jun., 2006 223
Fala e escuta de professores em sala de aula etapas processuais num ato em que o movimento de fala e escuta canaliza a interlocução do suposto saber. Como todo investimento libidinal, parece-me que o debate não está suspenso, há arquivos incandescentes a serem achados, ajustados, arremates a serem feitos, uma vez que me constituo no lugar do sujeito da falta. Confesso que 224 REFERÊNCIAS gostaria de continuar escrevendo sobre essa temática, uma vez que o escrever exige sempre recomeçar. Mas, talvez esta escrita não acabasse, não tivesse medida e, possivelmente, seria uma simples repetição. Como remédio ou até como “receita”, prefiro tentar tirar alguns véus e, quem sabe, troco a repetição por um ato de criação. E começo de novo... ALMEIDA, A.R.S. A emoção na sala de aula. Campinas: Papirus, 1999. ALVES, R.A. Conversas com quem gosta de ensinar. São Paulo: Arte Poética, 1995. ARANHA, M.L. de A. Filosofia da educação. São Paulo: Moderna, 1996. ARRUDA, A (Org.). Representando a alteridade. Petrópolis: Vozes, 1998. BAUDELAIRE, C. Obras estéticas: filosofia da imaginação criadora. Rio de Janeiro: Vozes, 1993. BARTHES, R. A aula. São Paulo: Cultrix, 1978. BATAILLE, L. O umbigo do sonho: por uma prática da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994. BIRMAN, J. Mal-estar na modernidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. CHARLOT, B. A relação com o saber e com a escola. Paris VIII, 1992 (mineo). CHEMAMA, R. Dicionário de psicanálise. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. FERNANDES, F. A condição do sociólogo. São Paulo: Hucitec, 1978. DERNANDEZ, Alícia. A mulher escondida na professora. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. FIGUEIREDO, L. C. Escutar, recordar, dizer: encontro heiddegerianos com a clínica psicanalítica. São Paulo: Escuta, 1994. FOUCAULT, M. A ordem do discurso. 3. ed. São Paulo: Loyola, 1996. FREUD, S. Obras completas. Volumes 3, 7, 9, 10, 22, CD ROM. Rio de Janeiro: Imago, 1976. FUKS, B.B. Freud e a cultura. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. GILLY, M. Les représentations sociales dans le camp éducatif. In: JODELET, D. (Org.). Les représentations sociales. Paris: Presses Universitaires de France, 1994. p. 363-386 (Sociologie d’aujourd’hui) GUARESCHI, P; JOUCHELOVITCH. S. (Org.). Textos em representações sociais. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 1995. IBANEZ, G. T. Representaciones sociales, teoría y método. In: IBANEZ, G.T. (coord.). Ideologías de la vida cotidiana. Barcelona: Sendai, 1988. P.32-51. JERUSALINSKI, A. Apesar de você amanhã há de ser outro dia: dialética da demanda e do desejo na educação. In: CALIGARIS, E. et al. Educa-se uma criança? Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1995. p. 66-81. JODELET, D. (Org.) As representações sociais. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2001. _____. (Dir.) Les représentations sociales. Paris: Presses Universitaires de France, 1989. KAES, R. Psicanálise e representação social. In: JODELET, D. (Org). As representações sociais. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2001. p. 67-90. KUPFER, M.C. Educação para o futuro e psicanálise: o legado de Freud e Lacan. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996. Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 15, n. 25, p. 211-225, jan./jun., 2006
Page 2 and 3:
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA - U
Page 4 and 5:
Revista da FAEEBA - EDUCAÇÃO E CO
Page 6 and 7:
185 Arte em movimento: a potenciali
Page 8 and 9:
185 Art in Motion: the potentiality
Page 10 and 11:
10 O terceiro bloco de textos dá u
Page 12 and 13:
12 nation. Juvino Alves, for exampl
Page 14 and 15:
RESUMO ECLIPSE DO LÚDICO Revista d
Page 16 and 17:
número de casas indicado pelos dad
Page 18 and 19:
uma exposição com algo a mais e e
Page 20 and 21:
mais, perdido e descrente, o quão
Page 22 and 23:
Tomo nota de tudo, registro com o o
Page 24 and 25:
Acredito, como Freire apostou, que
Page 26 and 27:
Ludicidade e educação emocional n
Page 28 and 29:
Page 30 and 31:
Page 32 and 33:
Page 34 and 35:
Page 36 and 37:
Page 38 and 39:
Page 40 and 41:
Revista da FAEEBA - Educação e Co
Page 42 and 43:
Aspectos da teoria de D. Winnicott:
Page 44 and 45:
pois de passar pela elaboração me
Page 46 and 47:
liberais e técnicos em relação
Page 48 and 49:
ções, modos de ensino, em que a c
Page 50 and 51:
_____. A família e o desenvolvimen
Page 52 and 53:
Se der a gente brinca: crenças das
Page 54 and 55:
Page 56 and 57:
Page 58 and 59:
Page 60 and 61:
Page 62 and 63:
Page 64 and 65:
Page 66 and 67:
Page 68 and 69:
Page 70 and 71:
Page 72 and 73:
Page 74 and 75:
Page 76 and 77:
mem com o trabalho e que ressaltam
Page 78 and 79:
Arroyo (2000, p. 19), ao estudar o
Page 80 and 81:
Ao lado dos fatores ligados às pol
Page 82 and 83:
Notamos com este estudo que, mesmo
Page 84 and 85:
A ludicidade está presente na aç
Page 86 and 87:
dinâmicas de grupo para ensinar, m
Page 88 and 89:
ção pessoal. Esta tensão exige a
Page 90 and 91:
Os autores ora citados parecem conv
Page 92 and 93:
Page 94 and 95:
Page 96 and 97:
uma experiência de educação extr
Page 98 and 99:
constrangedora, as crianças nativa
Page 100 and 101:
tóricas: Invasão dos Portugueses,
Page 102 and 103:
pedagógicos eu procurava, sempre q
Page 104 and 105:
efletir a respeito de suas proposta
Page 106 and 107:
Na Semana do Meio Ambiente, todas a
Page 108 and 109:
car a diferença nos dois gêneros
Page 110 and 111:
Teatro, além de provocar uma ruptu
Page 112 and 113:
Do desenho das palavras à palavra
Page 114 and 115:
Page 116 and 117:
Page 118 and 119:
Page 120 and 121:
Page 122 and 123:
Page 124 and 125:
Page 126 and 127:
Page 128 and 129:
As atividades lúdicas na alfabetiz
Page 130 and 131:
Page 132 and 133:
Page 134 and 135:
Page 136 and 137:
Page 138 and 139:
Page 140 and 141:
Page 142 and 143:
O especial dos jogos e brincadeiras
Page 144 and 145:
Page 146 and 147:
Page 148 and 149:
Page 150 and 151:
Page 152 and 153:
Arte: estampas híbridas de arco-í
Page 154 and 155:
Page 156 and 157:
Page 158 and 159:
Bandas, filarmônicas e mestres de
Page 160 and 161:
Page 162 and 163:
Page 164 and 165: Bandas, filarmônicas e mestres de
Page 166 and 167: RESUMO UMA ESCOLA DE MÚSICA E ARTE
Page 168 and 169: dos os tipos (políticos, comerciai
Page 170 and 171: um processo que deve acontecer na i
Page 172 and 173: tampouco se fechar num gueto cultur
Page 174 and 175: a popular ao corpo docente como tam
Page 176 and 177: das-mirins, corais, grupos de teatr
Page 178 and 179: Izabel Dantas de Menezes ARTE EM MO
Page 180 and 181: média, etc. É com base na percep
Page 182 and 183: Espaço onde a arte experimentada p
Page 184 and 185: zes a gente vem para uma reunião p
Page 186 and 187: Educação, entramos em contato com
Page 188 and 189: mos, porque na visão do sistema n
Page 190 and 191: A valorização das manifestações
Page 192 and 193: uma prática que potencializa no ed
Page 194 and 195: UM PERCURSO DE ESCUTAR POR TODOS OS
Page 196 and 197: foi uma idéia inicial, que partilh
Page 198 and 199: cada com o espetacular 5 O treiname
Page 200 and 201: cultural da terra. Há o mercado, p
Page 202 and 203: Maria de Lourdes S. Ornellas FALA E
Page 204 and 205: Faz-se necessário pontuar a escrit
Page 206 and 207: quanto à psicologia - o que leva a
Page 208 and 209: Ora, a psicanálise é uma das áre
Page 210 and 211: em que se tenta nomear, fazer rela
Page 212 and 213: nhecimento, ocupando o lugar supere
Page 216 and 217: Maria de Lourdes S. Ornellas LACAN,
Page 218 and 219: A concepção de conhecimento profi
Page 230 and 231: In search of América: latina/os (r
Page 248 and 249: RESENHAS RESENHAS
Page 250 and 251: idéias sobre possíveis riscos e c
Page 252 and 253: em como práticas que lhes caberá
Page 254 and 255: COHN, Clarice. Antropologia da cria
Page 256 and 257: QUEIROZ, Delcele Mascarenhas. Unive
Page 258 and 259: INSTRUÇÕES AOS COLABORADORES A Re
show all

Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb

Create successful ePaper yourself

Delete template?

Save as template?