Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb
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O teatro-educação enquanto componente curricular no meio rural: uma experiência na escola comunitária Brilho do Cristal<br />
– Lá em casa tem um mosquiteiro velho<br />
– Traga para a gente fazer a poeira cósmica...<br />
Outra situação extremamente criativa foi<br />
uma criança intriga<strong>da</strong> com o desafio <strong>da</strong> forma<br />
física do personagem dinossauro. Ela mexia em<br />
tudo no quartinho de Teatro em busca de algo<br />
que solucionasse seu problema. De repente, no<br />
meio dessa aflição, ela pegou um cabo de vassoura<br />
e colocou sob o lençol deixando seu rosto<br />
escondido, só aparecendo parte do corpo. Com<br />
o lençol para o alto, em movimentos lentos e<br />
grandes falou: eu sou um dinossauro. Realmente<br />
estávamos na frente do dinossauro. A ca<strong>da</strong> instante<br />
as soluções criativas iam surgindo, como<br />
uma mágica.<br />
Primeiramente as crianças fizeram a pesquisa<br />
e escreveram todo o resumo. Depois,<br />
transformaram o resumo em cenas, deram o<br />
nome às cenas e criaram um roteiro. Em segui<strong>da</strong>,<br />
fizeram o texto. A colagem de cena apresentava<br />
uma seqüência bem marca<strong>da</strong> do<br />
surgimento <strong>da</strong> terra e de sua evolução até chegar<br />
ao homem de hoje. O homem de hoje para<br />
eles é o homem que produz lixo, an<strong>da</strong> rápido,<br />
come lixo, é superficial, é intelectual e é ignorante.<br />
Para fechar o espetáculo, eles fizeram o<br />
planeta Terra de papier-mâché e ca<strong>da</strong> um em<br />
cena, na medi<strong>da</strong> em que recebia a Terra <strong>da</strong> mão<br />
do colega, falava uma poesia <strong>da</strong> própria autoria<br />
em homenagem a Terra. A experiência de vêlos,<br />
numa atitude plena, com a Terra na mão<br />
recitando sua poesia é indescritível.<br />
Esse trabalho foi apresentado para os alunos<br />
<strong>da</strong> Brilho do Cristal e para mães e pais na<br />
reunião pe<strong>da</strong>gógica 9 . Dessa forma,os pais e as<br />
mães iam tomando consciência, ca<strong>da</strong> vez mais,<br />
<strong>da</strong> importância do Teatro na educação <strong>da</strong>s crianças.<br />
- A invasão dos Portugueses<br />
Perseguíamos o diálogo entre as disciplinas,<br />
que fluía ca<strong>da</strong> vez mais. Como estava sendo<br />
também professora de História, resolvi propor<br />
às crianças de 1ª a 4ª série encenarmos a invasão<br />
dos portugueses ao Brasil. Pesquisamos<br />
coletivamente e individualmente o conteúdo te-<br />
112<br />
mático. Identificamos as indumentárias dos portugueses<br />
e dos índios <strong>da</strong>quela época, o que nos<br />
serviu de inspiração para construirmos nossa<br />
indumentária. Todos ficaram muito empenhados<br />
nas construções de adereços, cenários e<br />
até construíram uma oca de palha. Para maquiar<br />
os índios fizemos as tintas com argila, urucum,<br />
carvão e açafrão.<br />
Tivemos uma apresentação itinerante que<br />
acontecia em vários lugares <strong>da</strong> Escola. Tínhamos<br />
curumins por todo os lados. Lembro-me<br />
bem <strong>da</strong>s caravelas em alto mar e chegando a<br />
terra firme. O mar era o campo de futebol, imenso,<br />
as caravelas eram duas caixas de papelão<br />
emen<strong>da</strong><strong>da</strong>s, com os fundos desfeitos. Todos<br />
seguravam nas bor<strong>da</strong>s <strong>da</strong> caixa-caravela e<br />
com uma postura imponente navegavam rumo<br />
às terras indígenas. Quando eles navegavam<br />
na caravela, em alto mar, víamos seus pés, em<br />
passos, provocando o deslocamento <strong>da</strong> caravela,<br />
porém não deixávamos de ver a caravela<br />
e seu movimento e isso é o que para mim é<br />
inesquecível, esse momento de entrega, esse<br />
momento em que a criança assume o jogo, o<br />
jogador ou o personagem. A estética teatral<br />
estava além <strong>da</strong>s aparências.<br />
- Um Minuto de Teatro<br />
No ano de 1995 faltou professor de Português<br />
e lá fui eu ser professora de Português<br />
e Teatro na terceira e quarta série. Persistindo<br />
na união e não na separação, propus o projeto<br />
Um minuto de Teatro. O projeto deveria ser<br />
executado pelas crianças de maneira mais independente<br />
possível, como quase to<strong>da</strong>s as nossas<br />
propostas. Os objetivos gerais eram<br />
transformar textos literários em textos teatrais<br />
e fazer a encenação do texto a<strong>da</strong>ptado. Os objetivos<br />
específicos eram incentivar construções<br />
autônomas, trabalhar escrita e leitura, identifi-<br />
9 Nossas reuniões pe<strong>da</strong>gógicas acontecem a ca<strong>da</strong> bimestre e<br />
têm como objetivo principal refletir nossos processos pe<strong>da</strong>gógicos.<br />
Metodologicamente, optamos em trazer para<br />
nossas reuniões um pouco de nossas práticas, não só de<br />
teatro como <strong>da</strong>s outras áreas, como forma de melhor se<br />
estabelecer um diálogo crítico.<br />
<strong>Revista</strong> <strong>da</strong> <strong>FAEEBA</strong> – <strong>Educação</strong> e Contemporanei<strong>da</strong>de, Salvador, v. 15, n. 25, p. 99-115, jan./jun., 2006