Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb
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As ativi<strong>da</strong>des lúdicas na alfabetização político-estética de jovens e adultos<br />
3. A exclusão social e a fragmentação<br />
<strong>da</strong>s dimensões humanas<br />
138<br />
Eu quero aprender a ler<br />
para adquirir digni<strong>da</strong>de.<br />
(Alcelino dos Santos, 43 anos,<br />
estu<strong>da</strong>nte <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> de<br />
Jovens e Adultos)<br />
Pensar e atuar na <strong>Educação</strong> de Jovens e<br />
Adultos sem considerar o sistema capitalista de<br />
exclusão social significa simplificar e fragmentar<br />
a compreensão <strong>da</strong> situação de abandono vivi<strong>da</strong><br />
por este público. No trabalho na educação<br />
de jovens e adultos, torna-se imprescindível refletir<br />
sobre este sistema que hierarquiza as relações<br />
com o conhecimento sistematizado pela<br />
escola e pela universi<strong>da</strong>de, tendo como hegemonia<br />
as práticas que envolvem a relação com a<br />
língua escrita. Aqueles que ain<strong>da</strong> não dominam<br />
este código de comunicação escrita estão fa<strong>da</strong>dos<br />
à exclusão em diversos aspectos.<br />
Além disso, percebe-se que a supervalorização<br />
<strong>da</strong> língua escrita é um processo mais<br />
amplo e que abrange diferentes setores sociais,<br />
pois com a hegemonia <strong>da</strong> ciência basea<strong>da</strong> no<br />
intelecto, as práticas sociais volta<strong>da</strong>s para a<br />
coletivi<strong>da</strong>de, sensibili<strong>da</strong>de e afetivi<strong>da</strong>de estão<br />
sendo, aos poucos, elimina<strong>da</strong>s do convívio social,<br />
principalmente, nos espaços <strong>da</strong> educação<br />
formal. Dessa forma, percebe-se que o raciocínio<br />
tem assumido, hegemonicamente, um lugar<br />
de destaque na produção de conhecimentos<br />
não somente na escola. O pensamento científico,<br />
por exemplo, caracterizado pela mensuração,<br />
classificação e quantificação dos <strong>da</strong>dos<br />
coletados em testes rigorosos tem ocupado o<br />
principal espaço <strong>da</strong> produção do saber historicamente<br />
acumulado. Verifica-se, nesse contexto,<br />
a fragmentação entre as estruturas humanas<br />
(razão/emoção e corpo/mente) em detrimento<br />
do aprendizado integral e potencializador <strong>da</strong><br />
criativi<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> re-invenção do conhecimento<br />
humano. Confirma-se, portanto, a ruptura entre<br />
o pensar e o fazer, a razão e a emoção e<br />
entre o físico e o racional, dificultando a compreensão<br />
sobre o fazer do sujeito como ação<br />
coletiva e cultural.<br />
As ativi<strong>da</strong>des relaciona<strong>da</strong>s à inteligência do<br />
coração e à afetivi<strong>da</strong>de não têm sido considera<strong>da</strong>s<br />
como práticas propulsoras do desenvolvimento<br />
<strong>da</strong>s diferentes dimensões <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />
humana. Neste modelo de socie<strong>da</strong>de, a emoção<br />
torna-se espetaculariza<strong>da</strong> e transforma<strong>da</strong><br />
em objeto sensacionalista dentro de um mercado<br />
de consumo que produz padrões e estereótipos<br />
culturais, massificando as formas de pensar,<br />
de sentir e de agir no campo social.<br />
Essa fragmentação tem causado diversos<br />
<strong>da</strong>nos para a aprendizagem escolar de jovens e<br />
adultos e na vivência no campo social. Os estu<strong>da</strong>ntes<br />
analfabetos que não dominam o sistema<br />
escrito <strong>da</strong> língua encontram-se inseridos nesta<br />
reali<strong>da</strong>de que privilegia o pensamento racional<br />
e técnico. O problema <strong>da</strong> supervalorização <strong>da</strong><br />
razão também é encontrado na escola, na qual<br />
os conhecimentos são compartimentados em<br />
disciplinas, cabendo ao aluno o aprendizado<br />
mínimo de conteúdos para a formação de uma<br />
mão-de-obra barata e sem uma contextualização<br />
mais ampla sobre a reali<strong>da</strong>de sócio-histórico-cultural<br />
do país. A escola ain<strong>da</strong> está pauta<strong>da</strong><br />
nesta lógica racionalista de acúmulo de conteúdos,<br />
sem destinar uma abor<strong>da</strong>gem crítica, reflexiva<br />
e questionadora em relação aos<br />
conhecimentos trabalhados.<br />
Em geral, a reflexão sobre a importância dos<br />
conteúdos para a vi<strong>da</strong> dos educandos e sobre a<br />
fonte histórica e cultural que deu origem ao<br />
conhecimento é realiza<strong>da</strong> de forma superficial<br />
e técnica. Pouco tem se refletido, na escola,<br />
sobre o porquê e o para quê trabalhar com determinados<br />
conhecimentos, condutas e valores<br />
com os aprendizes. Nesse sentido, torna-se<br />
possível ressaltar que nenhuma forma de conhecimento<br />
é neutra, pois nenhum ser humano<br />
ou grupo social é neutro em sua atuação cultural.<br />
Assim, o conhecimento é transmitido de<br />
forma unilateral dentro de uma estrutura cognitivista<br />
que se separa do desenvolvimento <strong>da</strong><br />
imaginação e <strong>da</strong> criativi<strong>da</strong>de.<br />
É evidente que fora <strong>da</strong> escola o aluno jovem<br />
ou adulto também se encontra nessa estrutura<br />
fragmenta<strong>da</strong>, na medi<strong>da</strong> em que as relações<br />
sociais estipulam o momento certo para o trabalho<br />
(considerado como ativi<strong>da</strong>de séria e pro-<br />
<strong>Revista</strong> <strong>da</strong> <strong>FAEEBA</strong> – <strong>Educação</strong> e Contemporanei<strong>da</strong>de, Salvador, v. 15, n. 25, p. 133-146, jan./jun., 2006