Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb
Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb
Revista da FAEEBA Educação e Contemporaneidade - Uneb
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Ban<strong>da</strong>s, filarmônicas e mestres de ban<strong>da</strong> <strong>da</strong> Bahia: formação de músicos e ci<strong>da</strong>dãos<br />
cípulos e os aprendizes. O mestre rege a ban<strong>da</strong><br />
e prepara o repertório, com arranjos próprios,<br />
arranjos de outros compositores e composições<br />
próprias. O contramestre é um músico experiente,<br />
de destaque entre os demais que afina a<br />
ban<strong>da</strong>, ensaia os trechos mais difíceis com os<br />
colegas e substitui o mestre na sua ausência. O<br />
professor de música é uma pessoa, às vezes<br />
músico veterano, com especial talento para pe<strong>da</strong>gogia,<br />
responsável pela escolinha de música<br />
que irá prover o corpo musical de novos executantes.<br />
Os discípulos são músicos de destaque,<br />
que o mestre seleciona para transmitir seus<br />
conhecimentos de regência, instrumentação e<br />
liderança. Finalmente, os aprendizes são os alunos<br />
matriculados na escola de música manti<strong>da</strong><br />
pela socie<strong>da</strong>de filarmônica.<br />
Uma <strong>da</strong>s mais importantes personali<strong>da</strong>des<br />
na criação, organização e difusão <strong>da</strong>s Socie<strong>da</strong>des<br />
Filarmônicas na Bahia foi o Mestre de Ban<strong>da</strong><br />
Manuel Tranquillino Bastos 8 que atuava<br />
como compositor, educador musical, arranjador,<br />
instrumentista, escritor, teórico musical e obolicionista,<br />
ao lado de relevantes figuras de sua<br />
época, como o distinto poeta Sabino de Campos,<br />
que escreveu a letra do “Hymno <strong>da</strong> Cachoeira”,<br />
composto por Tranquillino Bastos, em<br />
1922. De acordo com Jorge Ramos, Tranquillino<br />
nasceu <strong>da</strong> união de um português com uma<br />
negra alforria<strong>da</strong> e, ain<strong>da</strong> menino, aprendeu a<br />
tocar clarineta e se incorporou ao Coro de Santa<br />
Cecília, a padroeira dos músicos e, mais tarde,<br />
à Ban<strong>da</strong> Marcial São Benedito, forma<strong>da</strong><br />
basicamente por músicos negros. (A TARDE-<br />
Cultural [Salvador-Ba], 07 de Outubro de 2000).<br />
Fred Dantas afirma que “Manuel Tranquilino<br />
Bastos foi o principal compositor surgido no<br />
seio <strong>da</strong>s filarmônicas <strong>da</strong> Bahia no final do século<br />
XIX”. (DANTAS, 2003, p. 116). De acordo<br />
com sua autobiografia, escrita em seu<br />
“Caderno de Anotações” (BASTOS, 1910-<br />
1924), Tranquillino foi o responsável pelo surgimento<br />
de mais de seis dessas socie<strong>da</strong>des, criando<br />
ou organizando-as. Dentre elas estão a Ban<strong>da</strong><br />
Musical <strong>da</strong> “Socie<strong>da</strong>de Euterpe Ceciliana” e<br />
sua “orchestra religiosa”, que mais tarde tornou-se<br />
a “Socie<strong>da</strong>de Cultural Orpheica Lyra<br />
Ceciliana” (1870), a “Filarmônica Comercial”<br />
168<br />
e a “Harpa Sanfelixta”, <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de São Félix,<br />
a Ban<strong>da</strong> <strong>da</strong> “Socie<strong>da</strong>de Filarmônica Victoria”,<br />
de Feira de Santana e a “Socie<strong>da</strong>de Musical<br />
Lyra São Gonçalense”, de São Gonçalo dos<br />
Campos, hoje to<strong>da</strong>s centenárias e algumas delas<br />
extintas, como a “Socie<strong>da</strong>de Filarmônica<br />
Victoria”, a “Harpa Sanfelixta” e a “Filarmônica<br />
Comercial”. A primeira Ban<strong>da</strong> regi<strong>da</strong> por<br />
Tranquillino pertencia à “Socie<strong>da</strong>de Recreio<br />
Cachoeirano”.<br />
Manuel Tranquillino Bastos esteve sempre<br />
à frente dos movimentos sociais e políticos de<br />
sua ci<strong>da</strong>de natal e de seu país. Isso pode ser<br />
verificado através de algumas de suas obras 9<br />
como o “Hymno Abolicionista” (1884), “Hymno<br />
13 de Maio” (1888), “Hymno <strong>da</strong> Cachoeira”,<br />
o “Dobrado Navio Negreiro”, homônimo<br />
do poema de Castro Alves, seu contemporâneo.<br />
A Letra do “Himno Abolicionista” proclama:<br />
“Brasileiros cantai liber<strong>da</strong>de/ Nossa pátria<br />
não quer mais escravos/Os grilhões vão quebrar-se<br />
num povo/De origem somente de Bravos”...)<br />
e, mais adiante: “O jugo do servilismo/<br />
Role em pe<strong>da</strong>ços no chão/ Pize altiva a liber<strong>da</strong>de<br />
sobre o pó <strong>da</strong> escravidão (...) Quebre-se os<br />
ferros <strong>da</strong> tyrania, sejamos todos livres um dia”.<br />
Essas obras eram compostas como forma<br />
de protesto e repúdio à escravidão, expressado<br />
também através de seus escritos em crônicas<br />
que versavam ain<strong>da</strong> sobre assuntos diversos<br />
como arte, religião, cultura, vi<strong>da</strong>, morte, comportamento<br />
social, música, e vários outros temas<br />
humanísticos. Essas crônicas eram<br />
publica<strong>da</strong>s numa coluna dominical denomina<strong>da</strong><br />
de “Cartas Musicaes” no semanário “O Pequeno<br />
Jornal” que circulava em Cachoeira. Elas<br />
foram escritas entre 1924 até sua morte, em<br />
1935. Tais crônicas foram arrola<strong>da</strong>s por Tran-<br />
8 Ver, a respeito, SANTOS FILHO, Juvino Alves. Manuel<br />
Tranquilino Bastos (1850-1935): mestre dos mestres de<br />
ban<strong>da</strong> <strong>da</strong> Bahia. In:MENEZES, Jaci et al <strong>Educação</strong> na Bahia:<br />
memória, registros, testemunhos. Salvador: EDUNEB, 2005;<br />
e SANTOS FILHO, Juvino Alves. Manuel Tranquillino Bastos:<br />
estudo de duas obras para clarineta. Universi<strong>da</strong>de Federal<br />
<strong>da</strong> Bahia, Tese de Doutorado, 2003.<br />
9 Uma pequena amostra <strong>da</strong> obra de Manuel Tranquilino Bastos<br />
foi produzi<strong>da</strong> pelo autor desse texto no CD “Cartas<br />
Musicaes – Manuel Tranquilino Bastos – O Mestre dos Mestres<br />
de Ban<strong>da</strong> <strong>da</strong> Bahia”, projeto vencedor do Prêmio Brasken<br />
Cultura e Arte 2002, patrocinado pela Braskem S.A.<br />
<strong>Revista</strong> <strong>da</strong> <strong>FAEEBA</strong> – <strong>Educação</strong> e Contemporanei<strong>da</strong>de, Salvador, v. 15, n. 25, p. 163-171, jan./jun., 2006