O TEMPO NA DIREÃÃO DO TRATAMENTO
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▪ O tempo na direção do tratamento<br />
O futuro anterior na experiência psicanalítica<br />
Sonia Campos Magalhães<br />
ara iniciar este trabalho, to-<br />
um fragmento de um Pmarei<br />
artigo de Daniela Chatelard<br />
no qual ela nos diz que<br />
“em alguns momentos,<br />
quase fugazes, de uma<br />
psicanálise, o sujeito<br />
percebe o seu ser de gozo<br />
pois se confronta com o que ele fora<br />
como objeto para o Outro. Assim, deve<br />
passar por um desvio em torno da<br />
questão de sua existência: o que sou?”<br />
A resposta para esta indagação – o que<br />
sou? –, a autora deste artigo vai buscar<br />
na frase que Lacan toma de empréstimo<br />
a Paul Valéry para mostrar que o gozo<br />
fala: “Sou no lugar de onde se vocifera<br />
que o universo é uma falha na pureza do<br />
Não-ser” . Ao situar esta frase, Lacan lhe<br />
dá uma seqüência. Ele diz que esta<br />
resposta não é sem razão porque “esse<br />
lugar, para se preservar, faz o próprio Ser<br />
ansiar com impaciência. Chama-se o<br />
Gozo, e é aquele cuja falta tornaria vão o<br />
universo” .<br />
Se voltarmos ao fragmento do texto situado<br />
no início deste trabalho,<br />
poderemos perceber que o gozo que<br />
fora, ali, atribuído ao Outro, seria um<br />
gozo encontrado no momento mesmo<br />
em que se dá a sua destituição, a<br />
destituição do Outro, momento também<br />
no qual, de forma fugaz, o sujeito<br />
percebe o seu ser de gozo.<br />
Neste artigo de Chatelard, a autora<br />
recorre à literatura para trabalhar o tema<br />
“Gozo e posição subjetiva a partir de<br />
considerações sobre o romance O<br />
arrebatamento de Lol V. Stein. Ela quer<br />
mostrar que através deste texto de<br />
Marguerite Duras, se pode perceber não<br />
só as mudanças da posição da<br />
personagem Lol como, também, onde<br />
estaria situado o seu ponto de gozo que,<br />
por tratar-se de um romance, fica<br />
intocável para ela.<br />
Nesse nosso trabalho, através do relato<br />
de um sonho, tentaremos levantar<br />
questões a respeito dos tempos do<br />
sujeito na experiência analítica buscando<br />
nos aproximar do que nos diz Lacan a<br />
respeito do futuro anterior.<br />
O Sonho<br />
O sonho que escolhemos para trazer<br />
neste trabalho é um material situado logo<br />
no começo de uma experiência psicanalítica.<br />
Ao longo do percurso desta<br />
análise, este sonho será muitas vezes<br />
retomado e, a cada vez, embora em<br />
sendo o mesmo sonho, ele não será mais<br />
o mesmo, mostrando que a experiência<br />
analítica avança, em um tempo de<br />
compreender, passando, de início, pela<br />
vertente do mito, pelo romance familiar,<br />
mas apontando para o final, lá onde o<br />
furo exigirá que o sujeito conclua em<br />
termos estruturais, que o Outro não<br />
existe, que há do UM mas não há nada<br />
do Outro.<br />
Relato do sonho:<br />
Bem próxima do caixão aberto, de pé,<br />
ela olhava a sua mãe imóvel, como que<br />
adormecida... Entre as flores dispostas<br />
com o apuro que ela amara em vida, o<br />
corpo encoberto da mãe, agora, quase<br />
não se dava a ver. O seu rosto, no<br />
entanto, lá estava por inteiro. Nele, o<br />
nariz afilado se destacava entre as<br />
pálpebras cerradas e os lábios finos,<br />
discretos, na palidez da morte.<br />
Bem próxima do caixão florido, muito<br />
tempo ela esteve assim, de pé, olhando a<br />
mãe com a estranheza de vê-la, enfim,<br />
emudecida...<br />
Perdeu-se no tempo...<br />
De repente, dispôs-se a sair. Sempre a<br />
olhá-la, deslizou num movimento para<br />
trás, em direção à porta. Viu, então, que<br />
enquanto recuava, o corpo da mãe, num<br />
movimento sutil, se erguia.... e, lá estava<br />
Heteridade 7<br />
Internacional dos Fóruns-Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano 104