O TEMPO NA DIREÃÃO DO TRATAMENTO
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▪ Modalidades subjetivas do tempo<br />
O tempo de constituição da inibição<br />
Glória Justo Martins<br />
clínica psicanalítica revela<br />
as diferentes formas<br />
A<br />
da realidade do tempo,<br />
vivenciadas por cada<br />
sujeito, dependendo das<br />
fases da vida e da<br />
estrutura psíquica. A<br />
proposta deste trabalho<br />
é estabelecer uma relação entre o efeito<br />
do tempo e a sua conseqüência no estudo<br />
da inibição neurótica, a partir de<br />
fragmentos de um caso clínico.<br />
O termo inibição, numa abordagem<br />
médica, diz respeito à “suspensão, diminuição<br />
ou retardamento transitório da<br />
atividade de uma parte do organismo,<br />
por efeito de excitação nervosa”1. Nos<br />
primórdios da Psicanálise, no período das<br />
suas correspondências a Fliess, Freud utiliza,<br />
pela primeira vez, no Manuscrito A2,<br />
o termo inibição (Hemmung), cujas referências<br />
posteriores vêm associadas à<br />
defesa do aparelho psíquico, devido ao<br />
excesso de sexualidade psíquica que gera<br />
desprazer.<br />
No estudo sobre Uma lembrança da infância<br />
de Leonardo da Vinci3, por exemplo,<br />
Freud associa o tema da inibição à<br />
questão da pesquisa sexual. Enfoca, em<br />
particular, a pulsão escópica, ou o desejo<br />
de ver o corpo nu da mãe, gerando o impulso<br />
de saber - Wissensdrang. A hipótese<br />
freudiana é que a acentuada curiosidade<br />
de Leonardo está relacionada com os primeiros<br />
anos de vida em que ficou entregue<br />
à carinhosa sedução materna e à privação<br />
total da autoridade do Outro paterno.<br />
Naquele período, despertou-se nele<br />
uma comprovada intensificação da atividade<br />
sexual infantil e, consequentemente,<br />
de suas pesquisas infantis. A pulsão escópica<br />
e o desejo de saber foram fortemente<br />
excitados pelas impressões mais remotas<br />
da infância. Sua tendência para a curiosidade<br />
sexual foi sublimada numa<br />
ânsia geral de busca do saber. A outra<br />
parte da sua libido, muito menor,<br />
representa a vida sexual adulta, com<br />
traços homossexuais.<br />
A partir daí, verificou-se que o impulso<br />
de saber vai ter três destinos diferentes:<br />
1) inibição neurótica, em que a pesquisa<br />
participa do destino da sexualidade – a<br />
curiosidade intelectual permanece inibida<br />
e a liberdade da atividade intelectual<br />
poderá ficar limitada; 2)<br />
desenvolvimento intelectual,<br />
suficientemente forte para resistir ao<br />
recalque sexual que o domina – a pesquisa<br />
torna-se uma atividade sexual e, por<br />
muitas vezes, a substitui, visando, compulsivamente,<br />
a encontrar o gozo sexual<br />
das primeiras investigações; 3) impulso<br />
de saber, o qual escaparia à inibição do<br />
pensamento neurótico compulsivo – a<br />
atividade sexual é recalcada e substituída<br />
pela pesquisa compulsiva.<br />
Freud destaca que Leonardo estaria no<br />
terceiro caso, em que a libido se junta à<br />
curiosidade sexual: desvia seu alvo<br />
através do mecanismo da sublimação, e a<br />
pesquisa intelectual torna-se libidinal,<br />
sem tratar do saber sexual. Esse algo que<br />
escapa pela via da sublimação é o que faz<br />
Leonardo criar – por excelência, a arte<br />
de driblar o recalque.<br />
Anos mais tarde, em 1926, em<br />
Inibição, sintoma e angústia4, Freud<br />
articula o conceito de inibição com<br />
outros dois conceitos presentes na<br />
clínica: o sintoma e a angústia, formando<br />
uma tríade de relevante importância na<br />
teoria analítica. Assinala que os conceitos<br />
de inibição e de sintoma não se<br />
encontram no mesmo plano. A inibição<br />
é um processo que ocorre,<br />
exclusivamente, na dimensão do eu e se<br />
expressa como redução funcional<br />
normal, não sendo, necessariamente,<br />
algo da ordem do patológico. Contudo,<br />
quando essa função apresentar-se<br />
modificada, ou surgir nova manifestação<br />
Heteridade 7<br />
Internacional dos Fóruns-Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano 165