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O TEMPO NA DIREÇÃO DO TRATAMENTO

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ticulação do tempo e o gozo na psicose<br />

estão relacionados. Verifica-se, assim, a<br />

posição de um sujeito perdido no abismo<br />

do tempo, no vazio que produz uma desorganização<br />

do mundo que o rodeia.<br />

O tempo dos sintomas:<br />

As descobertas freudianas, realizadas<br />

na escuta dos sintomas e das<br />

reminiscências dos pacientes, permitiram<br />

a teorização sobre a importância do<br />

tempo na estruturação do sujeito. Podese<br />

também pensar no tempo como um<br />

modo verbal, pela via do significante. Em<br />

outras palavras, passado, presente e<br />

futuro estão revelados no discurso do<br />

sujeito, embora não seja regra geral. Na<br />

psicose, escutamos sujeitos que<br />

apresentam perdas da percepção da<br />

temporalidade; a foraclusão (10) do<br />

Nome-do-Pai impede a organização da<br />

cadeia significante e as mensagens ficam<br />

destruídas, ininteligíveis. Lacan (11) traz<br />

o caso do Homem dos Lobos para<br />

interrogar “Qual é o valor do passado do<br />

sujeito?”, chamando atenção para a<br />

pouca importância de o sujeito<br />

rememorar, no sentido intuitivo da<br />

palavra, os eventos formadores da sua<br />

existência. Na verdade, o centro de<br />

gravidade do sujeito é a síntese presente<br />

do passado, a que se chama história: “O<br />

que conta é o que ele disso reconstrói<br />

(12)”.<br />

É preciso ir mais além da lembrança, e<br />

a clínica da psicose atesta isso: as lembranças<br />

não são associadas, uma vez que,<br />

na psicose, o tempo se desestrutura e se<br />

confunde por falta da significação fálica.<br />

Escutamos alguns pacientes psicóticos<br />

relembrarem “algo de seu passado”;<br />

todavia, não conseguem associar o que<br />

“irrompe” no discurso, e a causa de sua<br />

doença. Com diagnóstico de paranóia, a<br />

paciente traz uma lembrança do primeiro<br />

tempo da alucinação na infância:<br />

“Meu pai brigava, minha mãe<br />

chorava, ele passou a mão no<br />

meu rosto e saiu pela janela da<br />

sala, o gênio da Lâmpada de<br />

Aladim, voava e passava nas paredes<br />

dos prédios vizinhos.<br />

Muito lindo, era um bom<br />

motivo, isso foi quando era<br />

criança”.<br />

Aqui o ponteiro do relógio aponta para<br />

o tempo no passado a cruzar,<br />

efetivamente, o momento crítico da<br />

alucinação do sujeito e sua fala. O Outro<br />

sem barra passeia pelas paredes,<br />

preenchendo, ocupando o lugar de<br />

ausência da metáfora paterna.<br />

Tempo de construção da metáfora<br />

delirante:<br />

A metáfora delirante é uma construção<br />

que vem substituir a ausência da<br />

metáfora paterna, como uma das<br />

possíveis tentativas de simbolização, de<br />

estabilização do sujeito. Conforme<br />

recorte clínico apresentado, a lembrança<br />

não é a geradora de construções, pois o<br />

tempo do passado não está significado<br />

enquanto tal. Lacan diz que: “O Outro<br />

está excluído na fala delirante; daí, um<br />

fenômeno bruto: a perplexidade. E é<br />

preciso muito tempo para que o sujeito<br />

psicótico tente restituir uma ordem<br />

delirante em torno disso (13)”. O<br />

significante “fecundo”, apregoado por<br />

Flechsig quanto à prescrição dos novos<br />

soníferos, é utilizado por Schreber para<br />

dar origem, depois de longo período de<br />

internação, à possibilidade de fazer uma<br />

amarração na cadeia significante, que se<br />

servirá da causalidade psíquica na construção<br />

da metáfora delirante: “Sou uma<br />

Mulher que vai copular com Deus para<br />

gerar uma nova raça”.<br />

Trazemos um caso de paciente<br />

esquizofrênico, atendido no intervalo de<br />

ausência da analista que o acompanhava<br />

por dez anos. Curiosamente, apesar da<br />

gravidade dos sintomas, com várias<br />

tentativas de suicídios e internações,<br />

acompanhamos, na ausência da referida<br />

analista, uma contenção dos fenômenos<br />

elementares. Ele retoma “seu trabalho<br />

(14)” e comparece às sessões com a<br />

analista substituta, relatando progressos<br />

de escrita e diminuição das consultas<br />

com o psiquiatra, sempre se referindo ao<br />

tempo e ao compromisso de retorno da<br />

analista. A temporalidade para ele é<br />

marcada pela correspondência escri-<br />

Heteridade 7<br />

Internacional dos Fóruns-Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano 213

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