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O TEMPO NA DIREÇÃO DO TRATAMENTO

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fundada, até então, numa tentativa de<br />

“tapeação do real”.<br />

Lacan, crítico das concepções de final<br />

de análise que tinham como objetivo a<br />

identificação com o eu do analista e\ou<br />

uma adaptação à realidade, separa do sujeito<br />

suposto saber a pessoa do analista, a<br />

transferência é com um significante qualquer<br />

do analista. O sujeito suposto saber<br />

é um equivoco, e a psicanálise visa reduzir<br />

sua função até sua destituição ao final<br />

de uma análise: “No começo da psicanálise<br />

está a transferência” 150 . “E o sujeito suposto<br />

saber é o eixo a partir do qual se articula tudo o<br />

que acontece com a transferência” 151 .<br />

Mas o que condiciona a transferência?<br />

Embora Lacan diga nesse texto que não<br />

temos que dar conta do que a condiciona,<br />

não cessou de formalizá-lo (o que a<br />

condiciona) e sua possível resolução, até<br />

o final do seu ensino.<br />

A psicanálise não inventou a transferência,<br />

ela sempre existiu, é um fenômeno<br />

geral, efeito da linguagem. O mérito<br />

de Freud, desde Anna O., foi não ter recuado<br />

frente a sua manifestação, isolando-a<br />

e incorporando-a ao tratamento<br />

analítico. Lacan demonstrou-a, precisou<br />

seu manejo e resolução partindo da lógica<br />

e da topologia.<br />

A partir do ensino de Lacan, escolhi<br />

um ponto do seminário “De um Outro ao<br />

outro 152 ” para tentar articular, inicialmente,<br />

aquilo que se verifica na prática<br />

em uma análise levada a seu termo. Minha<br />

intenção é falar disso que ocorre, no<br />

momento de concluir, o desfecho final<br />

quando o sujeito conclui sobre aquilo<br />

que ele foi como objeto para o Outro ao<br />

mesmo tempo em que surge a suposição<br />

de saber no Outro e sua destituição.<br />

No seminário “De um Outro ao outro 153 ”,<br />

Lacan, retoma a questão do sujeito na<br />

sua relação com o Outro, e precisa a<br />

questão do sujeito suposto saber e a função<br />

lógica do objeto a. A partir da teoria<br />

150<br />

LACAN, J. “Proposição de 9 de outubro de<br />

1967”, p 252. In: Outros Escritos.<br />

151 Idem, p.253.<br />

152<br />

LACAN, J. O seminário, livro 16: De um Outro ao<br />

outro. Publicação do Centro de Estudos<br />

Freudianos do Recife. Publicação não comercial<br />

exclusiva.<br />

153<br />

Idem.<br />

dos conjuntos, Lacan, mais uma vez coloca<br />

em evidência que o que “condiciona”<br />

a transferência, é a estrutura do sujeito:<br />

transferência é a transferência da estrutura,<br />

ou seja, sua estrutura de linguagem.<br />

Mais uma vez, Lacan recorre à fórmula:<br />

o significante é o que representa o<br />

sujeito para o Outro significante e demonstra<br />

a coalescência entre a estrutura<br />

do sujeito e o sujeito suposto saber. É a<br />

própria crença do sujeito no saber inconsciente<br />

que possibilita que ele se dirija<br />

a um Outro que ocupe essa função. Lacan<br />

enfatiza, que o sujeito é representado<br />

como um (1) para um outro significante,<br />

este um Outro, é o que representa o um<br />

(1), unário(marca de um gozo) no Outro.<br />

Cada inscrição do traço unário no Outro<br />

visa a repetição de um gozo enigmático.<br />

Lacan nos diz que é necessário acrescentar<br />

a esse um no Outro, o conjunto vazio<br />

(segundo a definição da teoria dos<br />

conjuntos) 1, (1,0).O que está dentro do<br />

parêntese é o Outro (A), o conjunto vazio,<br />

“esse um-a-mais”, representado por<br />

círculos que se engendram indefinidamente,<br />

transformando o que era interior<br />

em exterior. Essa repetição se organiza<br />

ao redor de uma borda, um buraco, o lugar<br />

do objeto a: “[...] um buraco sozinho<br />

basta para fixar toda uma conduta subjetiva 154 .<br />

Esse conjunto vazio representa a incompletude<br />

do Outro (ele evoca o paradoxo<br />

de Russel) que o objeto a, em-forma, ou<br />

seja, o objeto a enforma A. Este Outro<br />

inconsistente, esse vazio, o objeto a (esse<br />

falso ser) irá enformar (envolver).<br />

Podemos afirmar que o sujeito busca<br />

na transferência, na suposição de saber, o<br />

ser, ser Um. O sujeito dividido, falta-aser,<br />

demanda ao Outro, ser, como explicita<br />

Lacan em “Posição do Inconsciente”: “ A<br />

espera do advento desse ser em sua relação com o<br />

que designamos desejo do analista,[...] [...]por<br />

sua própria posição, é essa a última e verdadeira<br />

mola do que constitui a transferência. Eis<br />

porque a transferência é uma relação estritamente<br />

ligada ao tempo e ao seu manejo 155 ”.<br />

O que “condiciona” a transferência é a<br />

“coalescência” entre o toro do sujeito e o<br />

154<br />

Ibidem, p.253.<br />

155<br />

LACAN, J. “Posição do inconsciente”, p.858.<br />

In: Escritos. Rio de Janeiro, Zahar, 1998.<br />

Heteridade 7<br />

Internacional dos Fóruns-Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano 125

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