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O TEMPO NA DIREÇÃO DO TRATAMENTO

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▪ A psicanálise e o discurso capitalista<br />

A brevidade como princípio da eficiência: as<br />

psicoterapias e a clínica do ensurdecimento<br />

Conrado Ramos<br />

m Freud (1988) escreveu:<br />

E“sem dúvida é desejável<br />

abreviar a duração do<br />

tratamento analítico, mas<br />

só podemos conseguir<br />

nosso intuito terapêutico<br />

aumentando o poder da<br />

análise em vir em assistência<br />

do eu 292 ” (p.245). Essa passagem<br />

indica a relação que há entre a abreviação<br />

do tempo de tratamento analítico e os<br />

dispositivos de socorro terapêutico calcados<br />

no imaginário e na sugestão. As modalidades<br />

de tratamento conhecidas<br />

como psicoterapias breves, que sustentam<br />

clínicas ortopédicas, educativas ou<br />

de apoio, ao buscarem o alívio imediato<br />

dos sintomas assemelham-se à prática<br />

médica que, após o diagnóstico da<br />

“doença”, prescreve a conduta mais adequada<br />

à eliminação do sintoma (e não ao<br />

seu questionamento), o que cala o sujeito<br />

que deveria escutar.<br />

A função da pressa, que dentro do tempo<br />

lógico nos aponta àquele momento<br />

em que, por um ato de fala, o sujeito se<br />

implica deixando-se representar na<br />

cadeia de significantes, fora do tempo<br />

lógico – isto é, no tempo cronológico<br />

linear – corresponde ao princípio de<br />

eficiência da lógica capitalista que deve<br />

alcançar o máximo de produção no<br />

mínimo de tempo. Neste caso, nas<br />

psicoterapias o equivalente à função da<br />

pressa assume a forma da brevidade e o<br />

paciente é chamado a produzir tão<br />

rápido quanto puder, devendo, pois,<br />

concentrar todos seus esforços no foco<br />

(ou seja, na associação não-livre).<br />

292<br />

Cientes de que Freud jamais escreveu eu e isso<br />

com os respectivos termos gregos ego e id<br />

adotados na tradução inglesa, optamos por<br />

efetuar as correções nas citações da edição<br />

standard brasileira, originária da versão inglesa.<br />

Além disso, sob a perspectiva do aumento<br />

da produção num mínimo de<br />

tempo, vários recursos são convidados<br />

ao tratamento: da hermenêutica e<br />

codificação da comunicação corporal<br />

(facial, gestual e postural) e do clima de<br />

acolhimento afetivo ao uso combinado de<br />

técnicas de relaxamento e catarse (como<br />

a aplicação de socos em almofadas); do<br />

planejamento de situações-problema e de<br />

manipulações ambientais para além do setting<br />

ao uso do dispositivo de repetição de<br />

frases com vistas à reprogramação de<br />

sistemas cognitivos danificados e<br />

manejos de correção perceptiva e emocional.<br />

Para lembrar Lacan (1960/1998): “o<br />

afeto é incapaz de desempenhar o papel<br />

do sujeito protopático, uma vez que esse<br />

é um cargo que não tem titular ali”<br />

(p.813). De certo modo, todos esses são<br />

dispositivos clínicos de produção de sentidos,<br />

códigos de enredamento dos afetos<br />

numa imagem cristalizada. Vale dizer que<br />

são clínicas da linguagem intersubjetiva, mas<br />

no sentido que esses termos ganham ao<br />

pensarmos na relação especular e na comunicação<br />

cibernética.<br />

Se além do princípio de eficiência da<br />

lógica capitalista recordarmos também da<br />

lei geral da cibernética – para a qual num<br />

mínimo de energia consumida um máximo<br />

de informação deve ser tratada (PO-<br />

CIELLO, 1995) – e sua vertente dentro<br />

da propaganda subliminar – que propõe<br />

que quanto maior a quantidade de estímulos<br />

em menor tempo de exposição,<br />

maior a subliminaridade (CALAZANS,<br />

1992) –, podemos sustentar a existência<br />

de uma fórmula comum para os dispositivos<br />

administrativos de controle e dominação<br />

presentes em nossos dias: a associação<br />

do grau de eficiência ao número<br />

de informações processadas num mesmo<br />

Heteridade 7<br />

Internacional dos Fóruns-Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano 275

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