O TEMPO NA DIREÃÃO DO TRATAMENTO
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▪ Tempo e estrutura<br />
Espaço e tempo na experiência do sujeito do<br />
inconsciente<br />
Clarice Gatto<br />
“A fala avança no escuro. O espaço não se estende, mas se escuta. Pela fala, a matéria está aberta, crivada de palavras; o real ali se<br />
desdobra. O espaço não é o lugar dos corpos; ele não nos serve de apoio. A linguagem o carrega agora diante de nós e em nós, visível e<br />
oferecido, tenso, apresentado, aberto pelo drama do tempo no qual estamos com ele suspensos. O que há de mais bonito na linguagem é<br />
que passamos com ela. Tudo isso não é dito pelas ciências comunicativas, mas nós sabemos muito bem disso com nossas mãos na noite:<br />
que a linguagem é o lugar do aparecimento do espaço”.<br />
(Valère Novarina)<br />
ou começar pela dificulda-<br />
premida pelo tempo Vde,<br />
para escrever... O título<br />
surgiu primeiro “espaço e<br />
tempo na experiência do<br />
sujeito do inconsciente” e<br />
logo estranhei já que o<br />
tema do encontro “Os<br />
tempos do sujeito do inconsciente. A psicanálise<br />
no seu tempo e o tempo da psicanálise”<br />
não nos remete imediatamente<br />
a noção de espaço. Ou será que sim?<br />
Na apresentação do livro preparatório<br />
deste Encontro Josée Mattei cita de<br />
modo interessante o livro Vous qui habitez<br />
le temps. Descubro vários livros desse<br />
autor editados em português, interessei-me<br />
especialmente por um. Aí, começou<br />
uma outra busca, o livro está esgotado<br />
no Brasil, depois de alguns dias a editora<br />
entregou um exemplar, belíssimo de<br />
Valère Novarina. Pronto. Esse era o significante<br />
que faltava para a articulação<br />
que eu esperava.<br />
Diante da palavra 161 do poeta me ocorreu<br />
a articulação que eu esperava: estava<br />
lá o tempo todo – inconsciente – estampado<br />
no cartaz do Encontro: a banda de<br />
Moebius, figura topológica por onde Lacan<br />
demonstra a experiência do sujeito<br />
do inconsciente.<br />
Já que nosso tempo é curtíssimo, farei<br />
breves pontuações a propósito de espaço<br />
e tempo e em seguida, por meio de um<br />
fragmento de um caso de histeria, assinalo<br />
para a formação do sintoma por meio<br />
161<br />
NOVARI<strong>NA</strong>, V. Diante da palavra (1999). Rio<br />
de Janeiro: Sete Letras, 2003.<br />
de um dizer no âmbito da experiência do<br />
sujeito do inconsciente.<br />
O espaço: Kant, Lacan, Freud<br />
Os conceitos de espaço e tempo<br />
são para Kant (1724-1804) “duas formas<br />
puras da intuição sensível” (oriundas da<br />
sensibilidade, ou seja, da capacidade de<br />
obter representações mediante o modo<br />
como somos afetados por objetos)<br />
como princípios do conhecimento a<br />
priori e não da “intuição empírica”<br />
proveniente da experiência. Para Kant a<br />
posteriori é o que pode ser dado na<br />
experiência. Espaço e tempo são,<br />
portanto para ele a priori a qualquer<br />
experiência do sujeito. Isto quer dizer<br />
que “o sentido interno mediante o qual a<br />
mente intui a si mesma ou o seu próprio<br />
estado interno, na verdade não<br />
proporciona nenhuma intuição da<br />
própria alma como um objeto; consiste<br />
apenas numa forma determinada unicamente<br />
sob a qual é possível a intuição do<br />
seu estado interno de modo a tudo o que<br />
pertence às determinações internas ser<br />
representado em relações de tempo” 162 .<br />
Aqui Kant lembra Lacan, se é que posso<br />
fazer essa articulação, por exemplo, no<br />
Estádio do espelho como formador da<br />
função do eu tal qual nos é revelado na<br />
experiência psicanalítica. Lacan compara<br />
o estádio do espelho como uma identificação,<br />
no pleno sentido que a análise lhe<br />
confere, ou seja, a transformação produzida<br />
quando o sujeito assume uma imagem<br />
que vai da insuficiência a antecipa-<br />
162<br />
KANT, I. Crítica da razão pura. In: Os<br />
Pensadores. São Paulo: Abril cultural, 1980.<br />
Heteridade 7<br />
Internacional dos Fóruns-Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano 135