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O TEMPO NA DIREÇÃO DO TRATAMENTO

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objeto a será de fundamental importância<br />

para pensar os três tempos lógicos<br />

envolvendo o instante de ver, o tempo<br />

para compreender e o momento de<br />

concluir. É dentro desta lógica que a<br />

psicanálise passará a tratar o sintoma.<br />

Utilizemos aqui do exemplo de Dora<br />

para tratar deste tema.<br />

Tudo funcionava bem na vida da jovem<br />

de 18 anos até que ela se descobre fazendo<br />

parte de um agenciamento amoroso<br />

no qual ela era oferecida ao marido da<br />

suposta amante de seu pai. Dora acredita<br />

que o comércio sexual empreendido está<br />

na origem do seu mal-estar. Entretanto,<br />

seus sintomas denunciam como ela<br />

participa do mal-estar do qual se queixa.<br />

Absorvida pelo enigma da feminilidade<br />

que lhe causa horror, Dora fica, durante<br />

duas horas, fixada frente a um quadro da<br />

Madona Sistina, de uma galeria de Dresden.<br />

O quadro, tal qual a Sra K., a<br />

captura pela brancura da pele ou pelo<br />

“adorável corpo alvo”, que segundo<br />

Freud teria uma “tônica mais apropriada<br />

a uma amante do que a uma rival” .<br />

Freud vai insistir em tratar o caso Dora<br />

habilitando-a à vida amorosa. Com<br />

Lacan, podemos dizer que Freud estaria<br />

aí tamponando a falta-a-ser com objeto<br />

de amor.<br />

Entretanto, o que nos interessa no nosso<br />

esforço de aproximar o tempo e o sintoma,<br />

é em que medida a pulsão escópica<br />

revela estar Dora, enquanto sujeito, capturada<br />

neste instante de ver. No episódio<br />

do lago com o Sr K. Dora experimenta<br />

algo similar, pois o Sr K. ao declarar que<br />

sua esposa não significa nada para ele,<br />

deixa Dora frente a frente com a Sra K.<br />

A cena do quadro reatualiza o que Dora<br />

experimenta no lago. Tal reatualização<br />

evidência “a raiz da pulsão escópica” que<br />

deve ser pega, nos diz Lacan no Seminário<br />

XI, retomando Freud, “no fato de<br />

que o sujeito se vê a si mesmo”. Uma<br />

ressalva importante, o sujeito não se vê<br />

no espelho, mas é “a sexualidade como<br />

tal faz retorno, [...], por intermédio das<br />

pulsões parciais”, no caso de Dora pela<br />

pulsão escópica.<br />

A circularidade da pulsão ao mostrar<br />

que “a heterogeneidade da ida e da volta<br />

mostra no seu intervalo uma hiância” revela<br />

como a sexualidade faz retorno no<br />

sintoma. A hiância aponta para<br />

dimensão da falta tanto para o sujeito<br />

como para o Outro. Neste percurso, o<br />

sintoma surge ali onde “a representação<br />

do Outro falta, precisamente, entre esses<br />

dois mundos opostos que a sexualidade<br />

nos designa como masculino e<br />

feminino”. Logo, para além de uma<br />

habilitação ao amor seria preciso levar<br />

Dora a poder lidar com a sua divisão<br />

subjetiva, vislumbrada pela hiância, pela<br />

falta que se instaura no cerne do sujeito.<br />

Como sabemos nos anos 50, Lacan vai<br />

enfocar, sobretudo, a sua tese do inconsciente<br />

estruturado como uma linguagem<br />

e vai partir da premissa do significante<br />

como causa do sujeito. Mas já neste<br />

período, Lacan vai construindo a<br />

elaboração de que o sujeito é causado<br />

por um objeto. Tanto que em 1960, ele já<br />

fala que “a relação do objeto com o<br />

corpo” revela “que esse objeto é<br />

protótipo da dotação de sentido do<br />

corpo como pivô do ser”. E em 1975, ele<br />

diz que “o sujeito é causado por um<br />

objeto que só é notável por uma escritura<br />

e é assim que um passo é dado na<br />

teoria... objeto que designo, que escrevo<br />

com a escritura pequeno a, e da qual<br />

nada é pensável, com o senão apenas de<br />

que tudo que é sujeito, sujeito do pensamento<br />

que se imagina Ser, é por isso<br />

determinado.<br />

Apoiando-nos na “consistência entre o<br />

sintoma e o inconsciente” vamos tentar<br />

dar prosseguimento na nossa elaboração<br />

acerca do sintoma como um marcador<br />

lógico dos tempos do sujeito do<br />

inconsciente. Voltaremos ao Seminário<br />

XI, na tentativa de articular as duas<br />

causas do sujeito: significante e objetal.<br />

Neste seminário, Lacan diz que o<br />

fechamento e abertura do inconsciente<br />

mostra que “a sua essência é de marcar<br />

esse tempo, pelo qual, por nascer como<br />

significante, o sujeito nasce dividido”.<br />

Com a ressalva de que “o sujeito é esse<br />

surgimento que, justo, não era nada, mas<br />

que, apenas aparecido”, pela extração do<br />

objeto a, “se coagula em significante” .<br />

Heteridade 7<br />

Internacional dos Fóruns-Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano 144

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