O TEMPO NA DIREÃÃO DO TRATAMENTO
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O vínculo associativo entre as duas cenas<br />
é o riso (dos vendedores e o do confeiteiro).<br />
A lembrança evocou o que ela<br />
certamente não estaria apta a sentir na<br />
ocasião: uma liberação sexual que se<br />
transformou em angústia. Devido a essa<br />
angústia, teve medo de que os<br />
vendedores da loja pudessem repetir o<br />
atentado e saiu correndo. Freud conclui<br />
que decisão – de não permanecer<br />
sozinha na loja devido ao risco do<br />
atentado – é perfeitamente lógica,<br />
levando em conta todos os elementos do<br />
processo associativo, e que esse caso é<br />
típico do recalque que se produz na<br />
histeria. Sempre se comprova que se<br />
recalca uma recordação, o qual do<br />
nächtraglich chega a converter-se em<br />
trauma (4).<br />
Em Lacan, podemos pensar nesses elementos<br />
como ‘significantes’, e que foi<br />
‘entre’ eles que algo do sujeito em questão<br />
surgiu. A segunda cena traz o peso<br />
traumático da primeira, sob o efeito do<br />
nächtraglich. Emma sente a recriminação –<br />
o efeito do recalque da primeira cena –<br />
somente na recordação que a segunda<br />
cena lhe traz e do caráter sexual da primeira,<br />
fazendo uma ponte entre elas.<br />
Quando Lacan articula o ‘inconsciente<br />
como uma linguagem’ indica que Freud,<br />
‘dócil à histérica’, chegou a ler os sonhos,<br />
lapsos e até mesmo os chistes como se<br />
decifra uma mensagem cifrada.(5) Vemos<br />
que desde Emma o tempo está posto em<br />
relação à linguagem, conforme nos<br />
indica o próprio Freud em duas<br />
observações nas quais vemos a<br />
possibilidade de leitura do inconsciente<br />
pela via da estrutura de linguagem:<br />
1. O Vínculo associativo: Ele escreve: ‘O<br />
vínculo associativo entre as duas cenas é<br />
o riso.’ Percebemos na leitura que o que<br />
Freud escuta não são os fatos em si, mas<br />
o ‘vínculo associativo’. O riso é lido<br />
como signo que liga o confeiteiro e os rapazes,<br />
signo que tem em si a marca de<br />
algo sexual. ‘Vestido’ como significante<br />
que se repete nas cenas e que porta uma<br />
incongruência lógica.<br />
2. Sobre a Verdrangung (O Recalque), em<br />
sua relação com o tempo ‘só depois’,<br />
Freud escreve: ‘Sempre se comprova que<br />
se recalca uma recordação, o qual do a<br />
posteriori chega a converter-se em trauma.’<br />
O Riso ser um signo nos evoca as tantas<br />
vezes que Lacan recorre à linguística<br />
para articular o que é um significante e o<br />
que é um signo. Enquanto signo, o riso<br />
significa algo para alguém, e esse alguém<br />
é Emma. Para que houvesse ‘vínculo associativo’,<br />
ele precisou deslizar para o caráter<br />
de significante, fazendo assim com<br />
que o sujeito pudesse advir em uma cadeia<br />
/ rede associativa.<br />
O tempo está nesse desenrolar da cadeia,<br />
pois como puro signo algo parava<br />
Emma em seu próprio movimento, haja<br />
vista sua queixa (inibição). Freud a faz<br />
voltar no tempo, recordar para dizer algo<br />
que, apesar de ser passado, está sendo vivido<br />
no agora, em sua ‘agorafobia’. É o<br />
que Lacan aponta na retroação da cadeia<br />
associativa, em seu movimento sincrônico:<br />
um significante não se significa por<br />
si, ele precisa de um outro. As marcações<br />
freudianas no valor do riso e da palavra<br />
‘vestido’ fazem com que essa cadeia se<br />
rompa e passe a outra, marcando um<br />
ponto de basta na história relatada, indicando<br />
sua diacronia, passando a outro<br />
patamar.<br />
Vemos, como indica Lacan, que o instante<br />
de ver é a sincronia, que no relato<br />
de Emma se localiza nessa mirada dos<br />
vendedores rindo para ela e o desencadeamento<br />
de sua ‘agorafobia’. A<br />
diacronia é o tempo para compreender,<br />
que no caso dessa paciente se dá pelas<br />
escansões que Freud efetua e que a faz<br />
voltar à cena de sua infância. O<br />
momento de concluir é a pressa que,<br />
pensando neste caso específico, poderia<br />
ser sua liberação para o movimento, sua<br />
saída do sintoma (6).<br />
Em seu seminário 23, Lacan diz que: ‘A<br />
reminiscência é distinta da rememoração.<br />
As duas funções são distintas em Freud,<br />
porque ele tinha o senso das distinções<br />
[...] A idéia testemunhada por Freud no<br />
projeto é de figurar isso através de redes,<br />
e foi isso talvez o que me incitou a lhes<br />
dar uma nova forma, mais rigorosa, fazendo<br />
com isso alguma coisa que se<br />
Heteridade 7<br />
Internacional dos Fóruns-Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano 150