O TEMPO NA DIREÃÃO DO TRATAMENTO
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▪ O tempo na direção do tratamento<br />
Os tempos de uma práxis<br />
Ronaldo Torres<br />
uais são os tempos de<br />
Quma praxis? Para a isso<br />
responder devemos recuperar<br />
que o ato na<br />
praxis, que concerne<br />
tanto ao campo da ética<br />
quanto ao da política na<br />
Grécia antiga, apresenta<br />
uma configuração bem diferente do ato<br />
presente na natureza (phisis) e na arte<br />
(poiesis). Só para se ater à dimensão do<br />
tempo, o ato na phisis se desdobra em<br />
um tempo de desenvolvimento<br />
necessário de uma ordenação do logos,<br />
na passagem determinada da potência ao<br />
ato; e na poiesis o tempo se coloca no<br />
intervalo entre o agente e o produto,<br />
onde a techne acha seu lugar. Por seu<br />
lado, na praxis, devido ao fato de que não<br />
há distinção entre agente, produto e<br />
finalidade no ato (ou seja, o ato, na<br />
praxis, é o agente, o produto e<br />
finalidade), o tempo é indexado de forma<br />
diferente. Ele é marcado tanto pelo<br />
instante do ato, por exemplo, de um ato<br />
justo, como também traz em si a extensão<br />
histórica de seu agente, por exemplo,<br />
um homem notadamente injusto. Por<br />
essa razão, o tempo do ato na praxis<br />
pode ser tanto um tempo de repetição,<br />
quanto pode ser um tempo de<br />
reordenação, de irrupção do novo.<br />
Essa marca do ato penetra toda a<br />
praxis na medida em que a ética não é<br />
um campo do singular. Assim, da mesma<br />
forma, o ethos, como campo transindividual,<br />
apresenta a mesma pulsação<br />
entre repetição e criação. Devemos<br />
lembrar a dupla nomeação do ethos: por<br />
um lado o “ethos (com eta inicial)<br />
designa a morada do homem...a metáfora<br />
da morada e do abrigo indica justamente<br />
que, a partir do ethos, o espaço do<br />
mundo torna-se habitável para o homem.<br />
O domínio da phisis ou o reino da<br />
necessidade é rompido pela abertura do<br />
espaço humano do ethos no qual irão se<br />
inscrever as ações... A segunda acepção<br />
de ethos (com épsilon inicial) diz respeito<br />
ao comportamento que resulta de um<br />
constante repetir dos mesmos atos”<br />
(Lima Vaz, 1993, p. 12). Assim, como<br />
hábito, o ethos traz em si a marca do que<br />
se repete e, como costume a inscrição do<br />
novo, da criação que escapa à<br />
necessidade natural.<br />
No que toca a psicanálise e em particular<br />
Lacan é importante lembrar que a<br />
nomeação da experiência analítica pelo<br />
termo praxis só acontece a partir do sétimo<br />
ano de seu seminário, justamente em:<br />
“A Ética da Psicanálise”. Até então,<br />
Lacan normalmente utilizava a expressão<br />
“técnica psicanalítica”. Fica por saber,<br />
então, porquê um seminário em que há<br />
um claro esforço para distanciar a experiência<br />
psicanalítica do orthoslogos aristotélico,<br />
deixa-nos também, contraditoriamente,<br />
a herança de localizar a psicanálise<br />
no campo da praxis. A resposta<br />
pode estar em certa disjunção da “Ética a<br />
Nicômano” que se pode operar entre o<br />
que seria relativo às propriedades do<br />
ethos, nas quais vemos elementos concernentes<br />
à psicanálise, e o que toca a teleologia<br />
da ética aristotélica, diante da<br />
qual Lacan posiciona a experiência analítica<br />
como uma espécie de antítese.<br />
Sobre o que afasta a psicanálise da ética<br />
aristotélica, isto está bem claro neste<br />
seminário na crítica à noção de “Soberano<br />
Bem” e no tratamento dado à questão<br />
do desejo. Esse não será o foco de nossa<br />
exposição. Mas pelo lado contrário,<br />
podemos trabalhar a aproximação da<br />
experiência analítica a praxis por alguns<br />
vértices, como a questão da alteridade e<br />
do endereçamento que se coloca no ato<br />
ou a questão da suposição ao saber também<br />
presente nesse ato. Devemos recordar<br />
que a liberdade implicada no ethos,<br />
como possibilidade de criação, está con<br />
dicionada a alteridade posta no ethos<br />
como repetição. Isso decorre da dialética<br />
Heteridade 7<br />
Internacional dos Fóruns-Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano 111