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Revista de Letras - Utad

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Dos dois lados do Atlântico: cartas <strong>de</strong> conterrâneos miran<strong>de</strong>ses 117António Mourinho, nesta carta como na maior parte dos seus escritos,procura construir uma imagem, uma face positiva <strong>de</strong> si para legar essa imagemàs gerações vindouras.Em jeito <strong>de</strong> conclusãoA primeira carta, <strong>de</strong> Eliseu Augusto Atanázio, é uma carta <strong>de</strong> um emigranteportuguês no Brasil, na década <strong>de</strong> 50. É um discurso exemplar dacorrespondência emigrante, porque <strong>de</strong>le emergem os temas mais frequentes<strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> textos: a partida do país <strong>de</strong> origem; a chegada e a adaptação a umpaís estranho; o trabalho árduo; o sucesso económico; a ascensão social;a exibição do êxito obtido em terras longínquas; os donativos pecuniários àal<strong>de</strong>ia natal; a sauda<strong>de</strong> da família chegada <strong>de</strong>ixada no torrão natalício e avonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> retorno.A carta <strong>de</strong> António Mourinho é, igualmente, uma carta lapidar <strong>de</strong> um“erudito local” (García Lorenzana 2001: 196), <strong>de</strong> um intelectual reconhecidopelo seu percurso cultural na sua terra, Miranda do Douro, no país e, já umpouco, no estrangeiro. A preocupação do referido autor em investigar aliteratura, a cultura, a história, a coreografia e a língua miran<strong>de</strong>sas levou-o asentir necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> arquivar todos seus documentos, ou seja, conduziu-o aoinevitável “arquivamento do eu” (Artières 1998: 3). Mourinho arquivou cartasoriginais e cópias <strong>de</strong> textos enviados (dactiloscritos), muitas vezes essas cópiasforam passadas através <strong>de</strong> papel químico. Custodiou missivas <strong>de</strong> outros e as suaspróprias respostas, como justamente observa Manuela Parreira da Silva:“A cópia que se guarda é também uma maneira <strong>de</strong> formalizar a auto-<strong>de</strong>stinação.Nela, o seu autor po<strong>de</strong>, mais tar<strong>de</strong>, rever-se, contemplar-se…” (Silva 1998: 131),porque, em dados momentos, o autor po<strong>de</strong>ria observar-se, e, sobretudo, po<strong>de</strong>rialegar aos outros a imagem <strong>de</strong> si próprio que ia construindo a seu gosto.O discurso <strong>de</strong> uma carta po<strong>de</strong>, como acontece com as cartas analisadas,narrar as etapas cronológicas <strong>de</strong> uma existência, po<strong>de</strong> também dar conta daforma <strong>de</strong> viver <strong>de</strong> um escrevente, po<strong>de</strong> representar um momento históricopreciso, ou, usando as palavras <strong>de</strong> Armando Malheiro da Silva po<strong>de</strong> “trazerfactos (a imagem do acontecido) <strong>de</strong> ontem para a superfície do hoje, doagora…” (Silva 2004: 244), ou dito <strong>de</strong> outra forma, as correspondênciaspermitem leituras e releituras constantes dos textos que os seus produtores nosquiseram legar e confiar.

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