12.07.2015 Views

Revista de Letras - Utad

Revista de Letras - Utad

Revista de Letras - Utad

SHOW MORE
SHOW LESS
  • No tags were found...

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

172 Laura Alves e Armindo MesquitaSobre a prática <strong>de</strong> contar histórias na região amazónica, Tocantins (1963),referindo-se a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Belém do Pará, diz que não há menino que <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong>ouvir histórias fantásticas, transmitidas pelas amas, empregadas domésticas,geralmente pessoas vindas do interior do Estado, on<strong>de</strong> sobrevive, intensa, atradição oral <strong>de</strong>ssas lendas 2 .Lembramo-nos dos dias passados por entre as mangueiras e as chuvas queconstantemente caíam (e ainda caem) aos arredores da Baía <strong>de</strong> Guajará (gran<strong>de</strong>baía que circunda a parte histórica da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Belém do Pará). Fui uma criança<strong>de</strong> quintal. Brincava com minhas irmãs e outras crianças, mas o que maisgostava era <strong>de</strong> brincar <strong>de</strong> “ouvir histórias”. Ficávamos horas e horas ouvindomirabolantes histórias típicas do contexto cultural amazônico. Não eramhistórias <strong>de</strong> fadas madrinhas, <strong>de</strong> príncipes encantados, <strong>de</strong> bruxas malvadas, massim histórias <strong>de</strong> Curupiras, <strong>de</strong> cobras, <strong>de</strong> Botos, <strong>de</strong> sacis, <strong>de</strong> matintas e muitasoutras histórias que ro<strong>de</strong>iam o universo imaginário do homem da Amazónia.Ainda na infância, tivemos oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> incorporar melhor o universoimaginário do povo amazónico por meio <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> figura <strong>de</strong> nossa infância:Dona Maria. Senhora <strong>de</strong> traço acaboclado, nascida no interior do Estado do Pará,que cuidava <strong>de</strong> nós, era nossa gran<strong>de</strong> narradora. Embora não sabendo ler, nemescrever, Vó Maria, como lhe chamávamos, era <strong>de</strong> extrema sabedoria, sendoportadora <strong>de</strong> uma valiosa memória oral. Escutámos <strong>de</strong>la muitas históriaslendárias <strong>de</strong> encantamentos e <strong>de</strong> seres encantados lá dos confins da florestaAmazónia que seduzem o povo ribeirinho. Com ela, pu<strong>de</strong>mos ouvir que os rios,os igarapés e as ilhas, que circundam a floresta Amazónia, têm seusencantamentos e estão repletas <strong>de</strong> seres com po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> encantar.Ficaram registadas em nossa memória duas histórias que Vó Maria contava.Dizia que nas vilas ribeirinhas da Amazónia, em noites <strong>de</strong> lua cheia, o Boto 3 saidas águas e transforma-se em um belo e atraente rapaz. Trajando um paletóbranco e usando um chapéu para encobrir o orifício que tem sobre a cabeça, elese introduz furtivamente nas festas dos lugares para seduzir as jovens caboclas.Após possuí-las, as moças, ainda encantadas, lamentam sua ausência afogandocom lágrimas o próprio ventre, já dilatado pela presença <strong>de</strong> um ser que estásendo gerado. E a linda moça acreditava estar gerando o filho do Boto.2 O autor refere-se à vinda para cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Belém <strong>de</strong> interioranos para se empregar, para estudar oucomo é costumeiro até hoje na cida<strong>de</strong> se adotar mocinhas do interior que se tornam “crias” dacasa. E como assumem o papel <strong>de</strong> amas, transmitem às crianças que cuidam as crenças <strong>de</strong> seuslugares <strong>de</strong> origem.3 O Boto, segundo a lenda, habita os rios da Amazónia, tem po<strong>de</strong>res sobrenaturais, po<strong>de</strong>ndotransformar-se em homem. Tem o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> seduzir virgens ou mulheres casadas. Tal é as forçassedutoras do Boto, que até hoje nas feiras <strong>de</strong> Belém, são vendidas para fabricação artesanal <strong>de</strong>perfumes partes dos órgãos genitais do animal. Além disso, todas as partes <strong>de</strong> seu corpo sãoaproveitadas para amuletos, <strong>de</strong>fumações, perfumes com fins mágicos.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!