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Revista de Letras - Utad

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314 Maria Cecília <strong>de</strong> Sousa Vieira1. O cruzamento da História com a LiteraturaO conto em análise é um conto <strong>de</strong> cruzamentos: cruza-se a História com aLiteratura, cruza-se o Passado com o Presente, cruza-se o Árabe com oPortuguês, cruza-se a Realida<strong>de</strong> com o Fantástico, cruza-se o Verosímil com oInverosímil…A relação entre História e Literatura vem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> tempos imemoriais, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> amitologia dos gregos. Segundo o mito, Zeus e Mnemósine, o pai dos <strong>de</strong>uses e a<strong>de</strong>usa da memória, tiveram sete filhas, as sete musas das artes. De entre elas,Calíope, a musa da Literatura e Clio, a <strong>de</strong>usa da História. Portanto, seguindo aexplicação mitológica, verificamos que a relação entre estas duas artes é estreitae que o diálogo entre elas é uma constante.Não é, pois, <strong>de</strong> estranhar o cruzamento da História com a Literatura, porqueambas – no dizer <strong>de</strong> Sandra Pesavento – têm a “capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> partilhar e cruzarformas <strong>de</strong> percepção e conhecimentos sobre o mundo”, embora tendo “métodose exigências diferenciadas e metas distintas” (Pesavento 2000: 7-8).Se a aceitação <strong>de</strong>sta conexão tem sido aceite por alguns <strong>de</strong> forma pacíficaou até com entusiasmo, por outros, tem sido alvo <strong>de</strong> acesas polémicas, insistindoestes últimos na necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer/<strong>de</strong>marcar fronteiras rígidas.No século XXI, cremos nós, não faz já sentido querer fixar limites entre osdois territórios. Aliás, a fragilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fronteiras 1 e, até, a supremacia daliteratura sobre a História para falar do passado está atestada em escritores comoWalter Scott ou Alexandre Herculano 2 .Cremos também que não faz sentido consi<strong>de</strong>rar, como Pierre Barbéris, que averda<strong>de</strong>ira história não é escrita pelos historiadores mas pelos bons romancistashistóricos 3 .1 A <strong>de</strong>marcação <strong>de</strong> fronteiras pouco precisas entre História e Ficção está já patente em Aristóteles:“não é ofício <strong>de</strong> poeta narrar o que aconteceu; é sim, o <strong>de</strong> representar o que po<strong>de</strong>ria acontecer,quer dizer: o que é possível segundo a verosimilhança e a necessida<strong>de</strong>. Com efeito, não diferem ohistoriador e o poeta, por escreverem verso ou prosa (pois que bem po<strong>de</strong>riam ser postas em versoas obras <strong>de</strong> Heródoto, e nem por isso <strong>de</strong>ixariam <strong>de</strong> ser história, se fossem em verso o que era emprosa) – diferem, sim, em que um diz as coisas que suce<strong>de</strong>ram, e outro as que po<strong>de</strong>riam suce<strong>de</strong>r”(apud Arnaut 2002: 290).2Afirma Alexandre Herculano: “Quando o carácter dos indivíduos ou das nações ésuficientemente conhecido, quando os monumentos e as tradições, e as crónicas <strong>de</strong>senharam essecarácter com pincel firme, o romancista po<strong>de</strong> ser mais verídico do que o historiador; porque estámais habituado a recompor o coração do que é morto pelo coração do que vive, o génio do povoque passou pelo que passa” (apud Marinho 1999: 15-16).Ainda com uma perspectiva idêntica, eis as palavras <strong>de</strong> Rebelo da Silva: “Em assuntoshistóricos, o <strong>de</strong>ver do romance consiste em cunhar com a verda<strong>de</strong> mais aproximada a expressão doviver e crer <strong>de</strong> Portugal, ou <strong>de</strong> qualquer outra nação” (apud Marinho 1999: 18).3 No século XIX, muitos romancistas pretendiam convencer o leitor <strong>de</strong> que a leitura <strong>de</strong> um bomromance era mais didáctica do que um verda<strong>de</strong>iro tratado histórico. Eis, a título <strong>de</strong> curiosida<strong>de</strong>,a forma como Pierre Barbéris apresenta o conceito <strong>de</strong> História:- Histoire: la réalité (?)historique;

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