12.07.2015 Views

Revista de Letras - Utad

Revista de Letras - Utad

Revista de Letras - Utad

SHOW MORE
SHOW LESS
  • No tags were found...

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

216 Henriqueta Maria GonçalvesNa cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Leão on<strong>de</strong> tudo aconteceu, conta-se que el-rei arrastou opadre para o seu quarto <strong>de</strong> dormir, se, <strong>de</strong>le, d’el-rei, e exigiu-lhe, sobameaça <strong>de</strong> excomunhão encomendada, que o beijasse na boca e, emsimultâneo, lhe cantasse nas profun<strong>de</strong>zas da garganta. D. Afonso VIacreditava que, se o padre assim fizesse, ele, rei, tornar-se-ia cantor porcontágio.O caso é que o padre cheirava mal da boca!D. Afonso VI <strong>de</strong>u mando ao padre que botasse a língua <strong>de</strong> fora e,agarrando-lha com uma das mãos, com a outra, esfregou-lha com umaescova com que era hábito el-rei esfregar os seus cabelos. Por mor doesfolamento que el-rei fez na língua <strong>de</strong> Diogo, este passou a usar <strong>de</strong> umalinguagem grosseira e a praticar actos cruéis. Incarnou o lobo do rebanhoque pastoreava!Certa vez agarrou uma moça no meio duma praça quando ela, a moça,carregava um caneco com água. Agarrou-a e apalpou-lhe as carnes <strong>de</strong>s<strong>de</strong> orabo até aos seios! Não contente com tanto apalpar, ainda arrastou arapariga para <strong>de</strong>ntro da igreja e serviu-se da dita diante do Santíssimo!(Laiginhas 2007: 38)Na primeira parte do relato dos factos, o discurso ainda tem um certo grau<strong>de</strong> neutralida<strong>de</strong>. Mas na segunda e terceira partes, o discurso atinge um elevadograu <strong>de</strong> corrosão satírico-jocosa relativamente a ambas as figuras.Um outro momento muito similar ocorre quando nos é relatado o queD. Afonso Henriques fez aos “mouros alentejanos”:uma sentinela veio, correndo como corre uma lebre chumbada pela bandadas ancas, botar uma novida<strong>de</strong> nos ouvidos <strong>de</strong> D. Afonso Henriques:– Um enxame <strong>de</strong> mouros, daqueles que são alentejanos, dorme no chãodos chaparros a duas léguas ligeiras daqui.– E como sabes que são mouros alentejanos? – inquiriu D. AfonsoHenriques.– Porque dormem pelas horas em que há estrelas no céu, e dormempelas horas em que não há estrelas no céu, e dormem pelas horas em que osol acen<strong>de</strong> as searas – explicou o soldado.D. Afonso Henriques subiu a um monte e mirou o longe.Viu campos <strong>de</strong> cevada – campos <strong>de</strong> cevada madura.Viu uma dúzia <strong>de</strong> chaparros – doze chaparros em pé, no meio daquelescampos <strong>de</strong> cevada.Viu mouros alentejanos ressonando à sombra <strong>de</strong> chaparros. […]alembrou-se, como somente é dado a um rei alembrar-se, duma táctica <strong>de</strong>guerrear mouros alentejanos. Uma táctica <strong>de</strong> combate <strong>de</strong> sua imaginosaindústria:Deu or<strong>de</strong>ns a cinquenta soldados do seu exército – dos que sãoinferiores por apenas terem préstimo nas fileiras da peonagem serviçal –que se besuntassem, e besuntassem as roupas que cobriam os seus corpos,com todo o azeite que havia naquele acampamento.Os soldados tudo fizeram como industriou o comandante daqueleexército. Assemelhavam-se a torcidas <strong>de</strong> can<strong>de</strong>ia. Torcidas encharcadas <strong>de</strong>

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!