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Revista de Letras - Utad

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Caleidoscópio <strong>de</strong> histórias <strong>de</strong> encantamentos e encantados… 173Outra lenda fantástica contada pela Vó Maria que marcousignificativamente a nossa infância era do(a) Curupira. Dizia ela que aspopulações interioranas na Amazónia acreditam que um ser estranho habita afloresta 4 . É um ser com jeito <strong>de</strong> gente, mas tendo ambos os pés com oscalcanhares virados para frente. Sua cara nunca alguém chegou a vê-la. Tambémnunca se ouviu sua voz. Contava a nossa narradora que o(a) Curupira não quermatar as suas presas. Seu <strong>de</strong>sejo é apenas o <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixá-las perdidas no mato, poiso(a) Curupira consi<strong>de</strong>ra-se um <strong>de</strong>fensor da mata e dos animais. Assim é que ocaboclo ribeirinho da Amazónia po<strong>de</strong> caçar livremente a semana inteira, maso(a) Curupira se reserva o direito <strong>de</strong> não <strong>de</strong>ixá-lo às sextas-feiras. Quem <strong>de</strong>safiao po<strong>de</strong>r do(a) Curupira, saindo à procura <strong>de</strong> alguma presa numa sexta-feira,arrisca-se a ficar perdido. Este ser, que protege a mata, gosta é <strong>de</strong> brincar <strong>de</strong>juju 5 e, não tendo com quem, trata <strong>de</strong> escon<strong>de</strong>r os que vão caçar. Ele tem po<strong>de</strong>rmesmo à distância. Basta que ele concentre sua atenção na vítima, para que estafique perturbada, com o pensamento embaralhado, sem saber o que está fazendo.É por isso que não po<strong>de</strong> acertar com o caminho tantas vezes percorrido.Só mais tar<strong>de</strong>, fomos perceber nessa conversa com nossas lembranças queas histórias ouvidas na infância fizeram (e ainda hoje fazem) parte da memória<strong>de</strong> infância <strong>de</strong> muitas crianças da região Amazónica. Po<strong>de</strong>mos dizer que a nossanarradora não era a famosa Scheraza<strong>de</strong> <strong>de</strong> As Mil e uma Noites, que com apalavra mágica tece a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas histórias, mas assim como essa jovem que,por meio <strong>de</strong> suas narrativas, mantém o príncipe preso ao fio <strong>de</strong> suas palavras, VóMaria contava-nos histórias que, por meio da labiríntica trama <strong>de</strong> suasnarrativas, nos seduziam lentamente. O nosso imaginário se construiu nas váriasviagens que fizemos pelo mar <strong>de</strong> histórias contadas por essa envolventenarradora. Com esta apren<strong>de</strong>mos ainda o po<strong>de</strong>r das plantas da Amazónia paracurar “mau-olhado” e para “amansar” criança traquina e malcriada: um simplesbanho <strong>de</strong> cravo <strong>de</strong> <strong>de</strong>funto, às sextas-feiras, era “tiro e queda”. Vó Maria eraverda<strong>de</strong>iramente a representação típica da singularida<strong>de</strong> do caboclo Amazónicorepleto <strong>de</strong> superstições, costumes, crenças e simpatias. Assim como nós,certamente, muitas crianças da região tiveram (e ainda hoje têm) o privilégio <strong>de</strong>contar com uma Scheraza<strong>de</strong> que acalante no seu imaginário o espaço amazónico.No caso das crianças da Amazónia, é possível dizer que no seu discursonarrativo há a presença <strong>de</strong> todo o universo cultural da sua região, porque estácercada <strong>de</strong> narradores que transmitem toda a poética imaginária da Amazónia.4 O Curupira ou a Curupira, segundo a lenda, é conhecido como a “Mãe do Mato”, embora seapresente na forma masculina, feminina ou ainda assexuada. É consi<strong>de</strong>rado protetor da selva e dacaça. Os Curupiras habitam muito <strong>de</strong>ntro da mata, porque não gostam <strong>de</strong> locais muito habitados.5 Juju é uma brinca<strong>de</strong>ira muito apreciada pelas crianças da região amazónica. Também conhecidacomo escon<strong>de</strong>-escon<strong>de</strong>.

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