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Curso de Direitos Humanos (2017) - André de Carvalho Ramos

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<strong>de</strong> seus textos normativos à realida<strong>de</strong> e seus conflitos” (voto do Min. Eros Grau, ADPF 153, Rel. Min.<br />

Eros Grau, julgamento em 29-4-2010, Plenário, DJE <strong>de</strong> 6-8-2010) 67.<br />

A interpretação é, assim, a chave da aplicação da norma jurídica pelos juízes e não mais a subsunção<br />

mecânica que os transformava na “boca da lei” (“bouche <strong>de</strong> la loi”), na expressão francesa do século<br />

XIX que retratava o receio <strong>de</strong> que os juízes subtraíssem, pela via da interpretação, o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> criação <strong>de</strong><br />

normas do Legislativo.<br />

Esse receio foi superado pelo reconhecimento <strong>de</strong> que a interpretação das normas é indispensável a<br />

qualquer aplicação do direito. Por isso, sem maiores traumas para a <strong>de</strong>mocracia brasileira, o Supremo<br />

Tribunal Fe<strong>de</strong>ral assumiu esse novo papel da interpretação em vários prece<strong>de</strong>ntes. Como exemplo, ainda<br />

o Min. Eros Grau, em voto elogiado por vários outros ministros, sustentou abertamente que “as normas<br />

resultam da interpretação e po<strong>de</strong>mos dizer que elas, enquanto textos, enunciados, disposições, não dizem<br />

nada: elas dizem o que os intérpretes dizem que elas dizem” (voto do Min. Eros Grau, ADPF 153, Rel.<br />

Min. Eros Grau, julgamento em 29-4-2010, Plenário, DJE <strong>de</strong> 6-8-2010, grifo nosso).<br />

Com base nessa introdução sobre interpretação, observo que as regras tradicionais <strong>de</strong> interpretação<br />

são também insuficientes no campo dos direitos humanos. As normas <strong>de</strong> direitos humanos são redigidas<br />

<strong>de</strong> forma aberta, repletas <strong>de</strong> conceitos in<strong>de</strong>terminados (por exemplo, “intimida<strong>de</strong>”, “<strong>de</strong>vido processo<br />

legal”, “duração razoável do processo”) e ainda inter<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes e com riscos <strong>de</strong> colisão (liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

informação e intimida<strong>de</strong>, proprieda<strong>de</strong> e direito ao meio ambiente equilibrado, entre os casos mais<br />

conhecidos). Consequentemente, a interpretação é indispensável para que possamos precisar e <strong>de</strong>limitar<br />

os direitos humanos. A interpretação dos direitos humanos é, acima <strong>de</strong> tudo, um mecanismo <strong>de</strong><br />

concretização <strong>de</strong>sses direitos. Tratar em abstrato dos direitos humanos transcritos nas Constituições e<br />

nos tratados internacionais é conhecê-los apenas parcialmente: somente após a interpretação pelos<br />

Tribunais Supremos e pelos órgãos internacionais é que a <strong>de</strong>limitação final do alcance e sentido <strong>de</strong> um<br />

<strong>de</strong>terminado direito ocorrerá.<br />

Com isso, é indispensável o estudo dos direitos humanos interpretados pelos tribunais nacionais e<br />

internacionais. Essa visão se choca com a visão tradicional, escorada na separação <strong>de</strong> po<strong>de</strong>res, que<br />

<strong>de</strong>fendia a escravidão do juiz às normas criadas, em última análise, pelo Po<strong>de</strong>r Legislativo. Logo, a<br />

subsunção seria a única técnica utilizada pelos intérpretes na aplicação do direito, sendo composta pela<br />

i<strong>de</strong>ntificação da premissa maior, que era a norma jurídica, apta a incidir sobre os fatos, que eram a

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