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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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minha i<strong>da</strong>de que eram filhos de traficantes e de consumi<strong>do</strong>res. . .. … o que<br />

eu queria era liber<strong>da</strong>de … lembro-me que os meus amigos não tinham<br />

prisão <strong>do</strong>s pais … eu queria era essa liber<strong>da</strong>de e quan<strong>do</strong> me contrariavam<br />

eu sentia era revolta … contra as pessoas <strong>da</strong> minha família porque o que<br />

eu queria era a vi<strong>da</strong> que tinham os meus amigos … eu achava que eles me<br />

prendiam … nunca me passou pela cabeça que eles queriam o meu bem .<br />

… nunca me passou isso … nunca. … ninguém me aju<strong>do</strong>u … ninguém me<br />

aju<strong>do</strong>u como eu queria … quan<strong>do</strong> me <strong>da</strong>vam regras já não aceitava na<strong>da</strong><br />

porque já tinha i<strong>do</strong> muito longe, muito longe nessa liber<strong>da</strong>de … mas<br />

também sentia que ninguém me aju<strong>da</strong>va … na minha família, só o meu<br />

padrinho falava comigo … com a minha mãe não havia conversas , não<br />

havia amizade … acho que nunca tive um pai ….‖<br />

Quan<strong>do</strong> tinha 14 anos, andei com um namora<strong>do</strong>, andei quase um ano e<br />

meio. Acabei com ele porque me traiu. Depois, comecei uma nova relação<br />

com outro rapaz que tinha conheci<strong>do</strong> noutro grupo de amigos. Os<br />

namora<strong>do</strong>s eram importantes para mim porque me sentia segura. Não<br />

sentia tanto a falta <strong>da</strong> minha família. Se calhar, eu estava era a tentar fazer<br />

uma família … não me sentia só … de algum mo<strong>do</strong>, eles substituíam a<br />

família de que sentia falta. … Eles já me impunham regras, pediam-me para<br />

ir para casa.<br />

Aos 15 anos fugi de casa durante quinze dias. Quan<strong>do</strong> voltei, a minha mãe<br />

abriu a porta mas não queria falar <strong>do</strong>s assuntos…tinha me<strong>do</strong> … tinha me<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> minha reacção. Que eu lhe batesse.‖ …. ―o que eu nunca tive … foi um<br />

pai‖ … O choro brota apesar <strong>da</strong> tentativa de o amor<strong>da</strong>çar …<br />

Sílvio (14 anos)<br />

Encontramos Sílvio na Comuni<strong>da</strong>de Terapêutica. Está nesta estrutura por<br />

decisão <strong>do</strong> Tribunal. No seu trajecto de vi<strong>da</strong> passou por duas transições a que atribui<br />

relevância: há uns anos, mu<strong>da</strong>nça <strong>da</strong> família de origem para um Colégio, em regime<br />

de internato, quan<strong>do</strong> tinha cerca de 11/12 anos e, posteriormente, inserção na<br />

Comuni<strong>da</strong>de Terapêutica. Contu<strong>do</strong>, a passagem pelo Colégio é lembra<strong>da</strong> de forma<br />

breve, uma vez que fugiu nos primeiros dias. Refere, no entanto, que o motivo que<br />

esteve na origem <strong>da</strong> i<strong>da</strong> para o Colégio foi o ambiente familiar conflituoso e o<br />

aban<strong>do</strong>no a que os filhos eram vota<strong>do</strong>s pelo facto de os pais serem consumi<strong>do</strong>res de<br />

drogas.<br />

O habitat residencial onde nasceu é um caso típico de território<br />

socialmente relega<strong>do</strong>, que o mesmo é dizer, separa<strong>do</strong>, coloca<strong>do</strong> à parte, visto pela<br />

ci<strong>da</strong>de como lugar perigoso, habita<strong>do</strong> por marginais, gente que é preciso pôr à<br />

distância. Viver <strong>da</strong> droga é, nestes locais, um mo<strong>do</strong> de vi<strong>da</strong> tanto mais aceite quanto<br />

os que o a<strong>do</strong>ptam pouco ou na<strong>da</strong> têm a perder com isso. A droga é um meio de<br />

sobrevivência em torno <strong>do</strong> qual se organizam muitas vi<strong>da</strong>s, fazen<strong>do</strong> parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong><br />

de muitos meninos como o Sílvio, desde a sua mais tenra infância. São socializa<strong>do</strong>s<br />

nessa cultura de sobrevivência em que os valores morais se dissipam sob o peso<br />

constrange<strong>do</strong>r <strong>da</strong>s condições extremamente adversas e <strong>da</strong> falta de expectativas de<br />

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