Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto
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O que mais essencialmente distingue a cultura no novo capitalismo por<br />
relação à sua fase anterior remete para a transferência de poder, nas grandes<br />
empresas, <strong>da</strong> direcção para os accionistas e a correlativa libertação de um enorme<br />
excedente de capitais em busca de investimentos à escala mundial 24 . Com o<br />
aparecimento <strong>do</strong>s accionistas, uma nova fonte de poder lateral surgiu no topo, muitas<br />
vezes literalmente estranha, ou mesmo, indiferente à cultura forja<strong>da</strong> no longo prazo<br />
pelas associações e alianças no seio <strong>da</strong> grande empresa. Por outras palavras, os<br />
investi<strong>do</strong>res tornaram-se juízes activos com capaci<strong>da</strong>de para criar ou desfazer<br />
empresas inteiras perante a impotência <strong>da</strong> sua administração. A ascensão <strong>do</strong><br />
chama<strong>do</strong> ―capital impaciente‖ 25 transformou a estrutura <strong>da</strong>s empresas, tornan<strong>do</strong>-as<br />
mais atractivas para os investi<strong>do</strong>res. Pressões consideráveis foram exerci<strong>da</strong>s sobre as<br />
empresas para que investissem na rentabili<strong>da</strong>de a curto prazo o que precipitou<br />
transformações organizacionais em busca <strong>da</strong> tão proclama<strong>da</strong> flexibili<strong>da</strong>de dinâmica,<br />
mesmo quan<strong>do</strong> a empresa estável funcionava perfeitamente. A solidez institucional e a<br />
estabili<strong>da</strong>de passaram a ser vistas como sinal de fraqueza, de incapaci<strong>da</strong>de de inovar<br />
e de gerir a mu<strong>da</strong>nça, logo como características negativas.<br />
A coesão <strong>da</strong>s empresas e <strong>da</strong>s instituições que fun<strong>da</strong>ram o capitalismo<br />
social vem sofren<strong>do</strong> rudes golpes a partir <strong>da</strong> expansão de formas de organização <strong>do</strong><br />
trabalho que não permitem construir identi<strong>da</strong>des relativamente claras e estáveis. Nas<br />
organizações burocráticas <strong>da</strong> fase anterior <strong>do</strong> capitalismo, os operários aprendiam a<br />
conhecer-se através <strong>da</strong>s frustrações ou <strong>da</strong> cólera que experimentavam a respeito de<br />
24 Richard Sennett, A Cultura <strong>do</strong> Novo Capitalismo op. cit., p. 28. Nomea<strong>da</strong>mente nos países <strong>do</strong> Médio<br />
Oriente, ricos em petróleo, nos bancos <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, <strong>do</strong> Japão e <strong>da</strong> Alemanha, bem como na rede<br />
de etnia chinesa <strong>do</strong> Pacífico, houve uma grande sede de investimentos. Nos anos 80 e 90, gigantescos<br />
fun<strong>do</strong>s de pensão e pequenos investi<strong>do</strong>res priva<strong>do</strong>s seguiram o movimento, em busca de novas<br />
oportuni<strong>da</strong>des além-fronteiras. Os negócios bancários transformaram-se, para fazer frente a este como de<br />
abundância. A banca comercial tornou-se ver<strong>da</strong>deiramente internacional. Em Londres, por exemplo, as<br />
redes que os banqueiros tinham forja<strong>do</strong> no antigo império britânico passaram a ser proprie<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s<br />
bancos norte-americanos, japoneses e alemães quan<strong>do</strong> estes compraram as firmas britânicas.<br />
Actualmente, a Bolsa de Londres continua a ser um centro <strong>da</strong> finança mundial, mas a própria Bolsa já não<br />
é uma instituição britânica. Os bancos comerciais centraram-se ca<strong>da</strong> vez mais nas fusões e aquisições e<br />
também eles perderam a conexão com os interesses <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>-nação. Nos anos 50, Siegmund Warburg<br />
fora o pioneiro <strong>da</strong>s técnicas de compras hostis de grandes empresas com base nacional. Uma <strong>da</strong>s<br />
consequências deste fluxo de riqueza foi o facto de a absorção hostil se ir converten<strong>do</strong> numa arte, à<br />
medi<strong>da</strong> que o dinheiro procurava novas vias de instalação.<br />
25 Richard Sennett, A Cultura <strong>do</strong> Novo Capitalismo op.cit., pág. 36. E, facto decisivo, para eles foi mais a<br />
cotação <strong>da</strong>s acções que os dividen<strong>do</strong>s <strong>da</strong> empresa que se tornou o indica<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s. Comprar e<br />
vender acções num merca<strong>do</strong> flui<strong>do</strong> e aberto proporcionava lucros mais rápi<strong>do</strong>s e mais importantes <strong>do</strong> que<br />
guar<strong>da</strong>r títulos a longo prazo. Por isso, quan<strong>do</strong> em 1965 os fun<strong>do</strong>s de pensão norte-americanos detinham<br />
as acções por um perío<strong>do</strong> médio de 46 meses, em 2000, grande parte <strong>da</strong>s carteiras desses investi<strong>do</strong>res<br />
institucionais mu<strong>da</strong>va de mãos, em média, to<strong>do</strong>s os 3,8 meses. A cotação <strong>da</strong>s acções inverteu as<br />
medi<strong>da</strong>s tradicionais de comportamento, como as relações custos/benefícios, como foi o caso bem<br />
conheci<strong>do</strong> <strong>do</strong>s anos 90, em que o valor <strong>do</strong>s títulos disparou em flecha em empresas que não<br />
apresentavam quaisquer benefícios.<br />
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