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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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ejeitavam, que tinham me<strong>do</strong> de mim, mas eu é que era prepotente,<br />

arrogante e rejeitava-me… talvez por não ter ti<strong>do</strong> quem me fizesse<br />

frente… quem me impedisse desde ce<strong>do</strong>, de viver uma vi<strong>da</strong> marginal…<br />

mas a minha mãe também não saberia como… mas eu também só<br />

agora comecei a aceitar que tenho me<strong>do</strong>s… que queria mais e mais ser<br />

gosta<strong>do</strong>… pela minha mãe… pai não tinha.<br />

292<br />

A circunstância de serem muito escassas as oportuni<strong>da</strong>des destes<br />

a<strong>do</strong>lescentes experimentarem papéis em contextos diversifica<strong>do</strong>s, em contacto com<br />

grupos de referência sociologicamente diversifica<strong>do</strong>s e heterogéneos, não lhes deixa<br />

outra alternativa que não seja aderir aos modelos <strong>do</strong>s grupos que lhe são acessíveis,<br />

o que reforça a necessi<strong>da</strong>de de se imporem como subcultura. Por outras palavras, não<br />

lhes resta outro meio de acesso a uma imagem pública que não seja a afirmação de<br />

uma cultura que suscita temor e preocupação e que contrasta violentamente com a<br />

cultura <strong>do</strong>minante <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de em geral. São subculturas ―malignas‖ 295 , ineficazes,<br />

desajusta<strong>da</strong>s, sem qualquer senti<strong>do</strong> nos contextos <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> social considera<strong>da</strong> normal.<br />

Apesar disso, não deixam de constituir a única possibili<strong>da</strong>de de aceder ao sentimento<br />

de pertença, constituem uma estratégia identitária própria <strong>do</strong>s que lutam com ―as<br />

armas <strong>do</strong>s desarma<strong>do</strong>s‖, nas palavras de Pierre Bourdieu 296 .<br />

Será de to<strong>da</strong> a pertinência que nos interroguemos, então, acerca <strong>da</strong><br />

adequação <strong>do</strong> modelo terapêutico a<strong>do</strong>pta<strong>do</strong> pela Comuni<strong>da</strong>de à superação <strong>da</strong>s<br />

rupturas que estiveram e estão presentes nas vi<strong>da</strong>s <strong>do</strong>s a<strong>do</strong>lescentes de cujas vi<strong>da</strong>s<br />

aqui procuramos <strong>da</strong>r conta. Será possível suscitar as aprendizagens cruciais para a<br />

a<strong>da</strong>ptação ao mun<strong>do</strong> social num contexto que não deixa de ser artificial, desde logo<br />

porque não pode reproduzir to<strong>da</strong> a gama de problemas e desafios que o mun<strong>do</strong> real<br />

impõe aos indivíduos? Poderão os constrangimentos cria<strong>do</strong>s no universo terapêutico<br />

reproduzir minimamente a plurali<strong>da</strong>de e diversi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s exigências impostas pela<br />

socie<strong>da</strong>de actual? O programa Portage foi concebi<strong>do</strong> no pressuposto de que a<br />

reali<strong>da</strong>de exterior, objectiva, tem prima<strong>do</strong> sobre a reali<strong>da</strong>de subjectiva, ou seja que<br />

para induzir mu<strong>da</strong>nças <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de interna é necessário a<strong>do</strong>ptar a prática regular <strong>do</strong>s<br />

comportamentos desejáveis. Ora, o que é, quanto a nós, crucial interrogar a respeito<br />

<strong>da</strong> ressocialização <strong>do</strong>s jovens de cujas vi<strong>da</strong>s aqui <strong>da</strong>mos parcialmente conta é se tal<br />

tarefa pode ser cumpri<strong>da</strong> manten<strong>do</strong> intactas as suas condições de existência fora <strong>da</strong><br />

comuni<strong>da</strong>de terapêutica. A especifici<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s seus trajectos de vi<strong>da</strong> remete para a<br />

acção de lógicas e processos sociais extremamente desigualitários que os privaram de<br />

295 Robert Merton, A Ambivalência Sociológica, Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1979.<br />

296 Pierre Bourdieu, La Misère du Monde, « Les exclus de l‘intérieur » Èditions de Seuil, Paris, 1993 ,<br />

pág.605 a 620.

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