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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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de trabalhar e perturba a vontade. O fuma<strong>do</strong>r torna-se escravo <strong>da</strong> droga, aban<strong>do</strong>na-se<br />

voluntariamente a uma habituação <strong>da</strong> qual não consegue escapar.<br />

163<br />

Ora, se o consumi<strong>do</strong>r leva a sério um tal estereótipo não pode deixar de<br />

se deparar com uma imagem muito negativa de si próprio. Para poder começar ou<br />

continuar a utilizar a droga, ou aumentar o seu consumo, precisa de neutralizar a sua<br />

sensibili<strong>da</strong>de a este estereótipo, a<strong>do</strong>ptan<strong>do</strong> uma outra interpretação <strong>da</strong> sua prática. Se<br />

não consegue realizar esta neutralização, condenar-se-á a si mesmo, ao olhar <strong>da</strong><br />

maior parte <strong>do</strong>s membros <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de, a ser visto como um desviante na margem<br />

desta socie<strong>da</strong>de.<br />

Apesar de haver aderi<strong>do</strong> aos pontos de vista convencionais acima<br />

referi<strong>do</strong>s, o indivíduo que passa a frequentar um meio não conformista é susceptível<br />

de adquirir um ponto de vista mais afasta<strong>do</strong> <strong>da</strong>s normas morais implica<strong>da</strong>s na<br />

caracterização habitual <strong>do</strong> utiliza<strong>do</strong>r de droga. Tal ponto de vista deve fornecer uma<br />

explicação que justifique a não rejeição <strong>do</strong> uso <strong>da</strong> droga, e que, de algum mo<strong>do</strong>,<br />

desvalorize as convenções estabeleci<strong>da</strong>s que o condenam. A observação recorrente<br />

<strong>do</strong>s outros consumi<strong>do</strong>res incita o noviço a não reconhecer a aplicabili<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s normas<br />

convencionais ao caso particular <strong>da</strong> marijuana, ao mesmo tempo que lhe proporciona<br />

as condições que permitem escapar à influência destas normas. No decurso <strong>da</strong><br />

frequentação de grupos utiliza<strong>do</strong>res de marijuana, o noviço vai adquirin<strong>do</strong> um conjunto<br />

de racionalizações e de justificações úteis para responder às objecções contra a<br />

utilização <strong>da</strong> droga. Uma <strong>da</strong>s racionalizações mais habitualmente utiliza<strong>da</strong>s é a que<br />

assinala que as pessoas respeita<strong>do</strong>ras <strong>da</strong>s convenções se permitem activi<strong>da</strong>des bem<br />

mais nocivas <strong>do</strong> que fumar marijuana, por exemplo, o uso <strong>do</strong> álcool 173 .<br />

Amélia<br />

Comecei a consumir por volta <strong>do</strong>s 15 anos… o consumo de drogas surgiu<br />

na minha vi<strong>da</strong> como a via para buscar felici<strong>da</strong>de, esquecer os problemas,<br />

um processo para ―anestesiar‖ os sentimentos, uma forma de me sentir<br />

viva… porque eu pensava assim, se eles consomem parece que ficam<br />

felizes, então deixa experimentar também…<br />

173 Howard Becker, Outsiders, Études de sociologie de la deviance op.cit., pág. 98: «Tu não gostas de<br />

álcool?] Não, isso não me diz na<strong>da</strong>. [Porquê?] Não sei. Não gosto, é tu<strong>do</strong>. Bom, escuta, eis o que se<br />

passou. Antes de atingir a i<strong>da</strong>de em que os rapazes se põem a beber, eu já tinha o hábito de planar, e eu<br />

via as vantagens, eu quero dizer que não havia mal nenhum e que era melhor <strong>do</strong> ponto de vista <strong>do</strong><br />

merca<strong>do</strong>. Foi uma <strong>da</strong>s primeiras coisas que eu aprendi. Para quê beber? É muito menos caro planar, isso<br />

não te põe <strong>do</strong>ente e demora menos tempo. Eu acabei por aí encontrar justamente o que precisava. É por<br />

isso, percebes, que eu planei em vez de beber.<br />

[O que pretendes dizer com: ―é uma <strong>da</strong>s primeiras coisas que eu aprendi‖ ?] Ora bem! Como te dizia, eu<br />

acabava justamente de começar a trabalhar como músico quan<strong>do</strong> consumi marijuana; eu poderia também<br />

beber no trabalho, tu sabes. Os meus companheiros disseram-me simplesmente que era um disparate<br />

beber. Eles também não bebiam.» «Algumas vezes quan<strong>do</strong> consumo, tenho a impressão de estar<br />

ver<strong>da</strong>deiramente…revigora<strong>do</strong>, e isso dá-me apetite. Isso dá-me uma fome terrível. É provavelmente bom<br />

para as pessoas com falta de peso.»

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