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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Ilídio<br />

relações mesmo importantes são a minha família de acolhimento, os meus<br />

tios.<br />

Quan<strong>do</strong> fui para o colégio detestei… era uma revolta grande que eu<br />

sentia… sentia sau<strong>da</strong>des <strong>da</strong> minha família de acolhimento… eles <strong>da</strong>vamme<br />

afecto e ali não tinha na<strong>da</strong>… havia regras e eu não aceitava… sentiame<br />

injustiça<strong>da</strong>… no colégio não era como com os meus ―tios‖… com eles<br />

era mesmo uma família e, como lhe disse, também havia regras… mas ali<br />

estávamos muito sozinhas e havia castigos por qualquer coisa… falar?,<br />

ninguém falava connosco… só <strong>da</strong>r ordens… eu já não ligava e foi quan<strong>do</strong><br />

comecei a consumir drogas… com amigas que estavam lá… faltava às<br />

aulas… ninguém sabia por onde eu an<strong>da</strong>va… até cheguei a traficar…<br />

lembro-me agora que não devia ter fugi<strong>do</strong> <strong>do</strong> colégio.. que eu devia pensar<br />

mais no que queria, não era assim à toa… sempre agi sem pensar… era o<br />

impulso e pronto… Devia pensar mais antes de fugir porque eu, no colégio,<br />

pelo menos podia ir aos fins-de-semana a casa e agora, aqui, não posso.<br />

Podia estar com os meus tios nos fins-de-semana e agora não. Devia ter<br />

pensa<strong>do</strong> mais … Deu-me um ―bite‖ na cabeça e fugi …<br />

135<br />

Deixa<strong>do</strong> pela mãe num colégio quan<strong>do</strong> tinha dez anos, Ilídio refere como<br />

um marco significativo esta mu<strong>da</strong>nça, momento que viveu com tanto mais sofrimento<br />

quanto só soube que ia lá ficar justamente quan<strong>do</strong> chegou à porta <strong>do</strong> colégio.<br />

―Com dez anos fiquei num colégio (Centro Juvenil de Campanha) com um<br />

irmão, um primo e um sobrinho. (…) Para o Colégio foi a minha mãe que<br />

nos levou… desse tempo recor<strong>do</strong> que fiquei magoa<strong>do</strong>, triste, quan<strong>do</strong> fui<br />

para o Colégio porque a minha mãe não me disse na<strong>da</strong>. Ela levou-me e<br />

disse: ―tens aqui um primo e um sobrinho, vens com o teu irmão e eles vão<br />

tomar conta de ti… fiquei zanga<strong>do</strong>… zanga<strong>do</strong>… era só raiva e revolta…<br />

Nunca no colégio me propuseram estar com a minha mãe e eu não procurei<br />

estar com ela, porque ela tinha-me aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong> e eu não quis saber mais …<br />

Eu e o meu irmão falávamos disso e começávamos os <strong>do</strong>is a chorar… não,<br />

não falava com outros adultos… aquele era o meu problema… e depois<br />

queríamos fazer as coisas direitas e se alguém lhe tocasse, eu cobria-lhe as<br />

costas. (…) No princípio gostei <strong>do</strong> colégio… lá tinha amigos e gostava <strong>da</strong><br />

directora…mas não me <strong>da</strong>va com outras pessoas… a directora gostava de<br />

mim e isso fazia-me sentir bem, mas houve muitos momentos em que<br />

chorava muito com o meu irmão… tinha sau<strong>da</strong>des <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> em casa <strong>da</strong><br />

minha avó, até aos dez anos… tinha sau<strong>da</strong>des dela e <strong>do</strong>s meus irmãos…<br />

nos tempos livres às vezes vínhamos fazer piqueniques aqui a Vila <strong>do</strong><br />

Conde e eu gostava e cheguei a cozinhar para setenta e cinco pessoas…<br />

sim, eu estudei um curso de hotelaria… sozinho no colégio, mas os<br />

professores também ensinavam… eu queria fazer alguma coisa… havia<br />

regras e eu acatava, mas também comecei a desobedecer e a ser mais<br />

rebelde à medi<strong>da</strong> que fui crescen<strong>do</strong>… acho porque sentia revolta… por<br />

causa <strong>da</strong> minha mãe…<br />

Durante esses anos no colégio nunca mais estive com a minha mãe. Eu<br />

estava mesmo interno. A minha mãe nunca mais me visitou. Com a minha<br />

avó via-a no Natal. Só nessa altura é que ia a casa. Com os meus irmãos<br />

nunca mais estive. Só com um que me veio visitar à clínica. Este está num<br />

colégio em Matosinhos. O irmão que foi comigo para o Centro Juvenil de<br />

Campanhã sei que continua lá porque ele também veio cá visitar-me. Sobre

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