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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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aqui estamos a analisar foram to<strong>do</strong>s remeti<strong>do</strong>s para sociabili<strong>da</strong>des restritas e<br />

restritivas, viven<strong>do</strong> fecha<strong>do</strong>s num universo <strong>do</strong>s iguais, sem outras referências culturais<br />

que não sejam as que decorrem <strong>da</strong> psicoa<strong>da</strong>ptação à miséria. No que respeita à<br />

dimensão simbólica, a sua privação é <strong>da</strong>s mais gravosas, já que as condutas <strong>do</strong>s seus<br />

pais convocam a produção de estereótipos altamente estigmatizantes. O sofrimento<br />

destes jovens não está apenas associa<strong>do</strong> à fragili<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s relações que os seus pais<br />

com eles mantêm, mas, também, ao descrédito de que as condutas <strong>do</strong>s seus<br />

progenitores são objecto. Para o seu sofrimento concorre igualmente a desvalorização<br />

colectiva que severamente atinge o seu auto conceito. Como muito bem analisou<br />

Goffman, o rótulo que não pode ser contesta<strong>do</strong>, por falta de poder para tal, isto é, o<br />

rótulo aceite, marca o início de uma carreira que precipita o indivíduo nas ―margens‖<br />

<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de. Não se podem orgulhar <strong>do</strong>s seus pais, experimentam sentimentos de<br />

vergonha que recalcam e que neles desencadeiam o mecanismo de identificação com<br />

os agressores. Estamos, pois, em presença de uma conjugação perniciosa de<br />

factores, diríamos uma autêntica engrenagem de que não somente é muito difícil sair,<br />

como <strong>da</strong> qual não é possível sair sozinho.<br />

121<br />

Poderíamos dizer, numa curta síntese, que as suas famílias maltratantes<br />

são igualmente famílias maltrata<strong>da</strong>s, sujeitas a lógicas e dinâmicas sociais que<br />

exacerbam os efeitos mais perniciosos <strong>da</strong> competição social.<br />

Em face de uma interacção tão perversa de factores surge-nos a<br />

interrogação central neste ponto. A institucionalização de crianças e a<strong>do</strong>lescentes<br />

pode constituir uma oportuni<strong>da</strong>de de reparação de to<strong>da</strong>s as aquisições e<br />

aprendizagens que é suposto serem realiza<strong>da</strong>s na socialização primária e que estes<br />

jovens não tiveram oportuni<strong>da</strong>de de realizar?<br />

A exclusão social na infância é um problema social grave, não só porque<br />

os seus protagonistas na<strong>da</strong> fizeram para merecer tal sorte, mas, ain<strong>da</strong>, porque desse<br />

problema decorrem outros bem mais difíceis de reverter, designa<strong>da</strong>mente, e voltan<strong>do</strong><br />

a Goffman 146 , a interiorização de uma imagem de si próprios desencadea<strong>do</strong>ra <strong>da</strong>s<br />

carreiras de delinquência, toxicodependência, pobreza, desinserção social.<br />

A exclusão social na infância é, além disso, um problema social grave<br />

porque atinge, de mo<strong>do</strong> muitas vezes irreversível, a possibili<strong>da</strong>de de crescer como ser<br />

humano e de construir uma identi<strong>da</strong>de positiva. Os a<strong>do</strong>lescentes de que aqui falamos<br />

permaneceram tempo demasia<strong>do</strong> no mais absoluto aban<strong>do</strong>no e na mais avassala<strong>do</strong>ra<br />

ausência de motivação para aprender a amar, por haverem passa<strong>do</strong> os primeiros anos<br />

<strong>da</strong> existência no mais completo vazio de objectivos, entregues a si próprios, numa<br />

146 Erving Goffman: Estigma: notas sobre a manipulação <strong>da</strong> identi<strong>da</strong>de deteriora<strong>da</strong>, Zahar, Riode Janeiro,<br />

1982.

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