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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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com jovens <strong>da</strong> sua i<strong>da</strong>de e com outros adultos. Quan<strong>do</strong> nos conhecemos, Ilídio<br />

revelava uma grande incerteza quanto ao futuro, não saben<strong>do</strong> muito bem o que iria<br />

fazer <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>. Ten<strong>do</strong> conheci<strong>do</strong> vários adultos e locais, acabou por não<br />

experimentar, nem durante a sua formação escolar, ligações especiais, o que de<br />

algum mo<strong>do</strong> o deixou sem um sentimento básico de pertença. Realçan<strong>do</strong> os tempos<br />

iniciais <strong>do</strong> colégio em que experimentava sentimentos de raiva face à mãe, não deixa<br />

to<strong>da</strong>via de sublinhar que o seu desejo é poder vir a obter o seu reconhecimento.<br />

Tu<strong>do</strong> indica que, para se sentir vivo e superar os sofrimentos de uma<br />

história sem vínculos sóli<strong>do</strong>s, sem afectos e sem oportuni<strong>da</strong>des de construir o gosto<br />

por si, a idealização <strong>da</strong> mãe ausente constituiu a defesa que pôs em funcionamento,<br />

―como quem mantém viva a esperança de uma saí<strong>da</strong> mágica‖ 130 .<br />

Reflectin<strong>do</strong> sobre a história deste jovem, pode deduzir-se que o<br />

sentimento de rejeição associa<strong>do</strong> ao aban<strong>do</strong>no por parte <strong>da</strong> mãe potenciou uma<br />

espécie de suspeição básica em relação à fiabili<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s adultos, torna<strong>da</strong> extensiva a<br />

tu<strong>do</strong> ou to<strong>do</strong>s que o rodeiam. Nas estruturas mais intervenientes na sua socialização<br />

secundária, não se chegaram a gerar as oportuni<strong>da</strong>des para conquistar a confiança<br />

básica que permita acreditar nos adultos, para conquistar os recursos relacionais e<br />

escolares necessários para elevar a crença em si próprio, e delinear um projecto de<br />

vi<strong>da</strong>. Não usufruiu de oportuni<strong>da</strong>des para reparar uma estrutura psicológica<br />

profun<strong>da</strong>mente marca<strong>da</strong> pelo vazio afectivo e modelos de relação inseguros e<br />

rejeitantes.<br />

―Quan<strong>do</strong> nasci, vivia com o meu pai, a minha mãe e 9 irmãos, três mais<br />

velhos <strong>do</strong> que eu. (…) Tinha <strong>do</strong>is anos, quan<strong>do</strong> o meu pai morreu com um<br />

ataque cardíaco… era muito pequeno… não me lembro <strong>do</strong> que senti… na<br />

altura, quem me disse foi a minha mãe, mas não me lembro dele. O meu pai<br />

não sei o que fazia, cresci sem pai, mas a minha mãe era cozinheira, num<br />

restaurante… entretanto, fomos to<strong>do</strong>s viver com a minha avó, mãe <strong>da</strong><br />

minha mãe, …em Campanhã, só trabalhava a minha mãe e a minha avó<br />

tomava conta de to<strong>do</strong>s nós… era uma vi<strong>da</strong> de dificul<strong>da</strong>des, de pobreza,<br />

mas eu lembro-me de me sentir bem… depois elas tiveram uma discussão,<br />

as duas, porque a minha mãe chegava tarde a casa e não aju<strong>da</strong>va nos<br />

trabalhos em casa, e a minha avó meteu a minha mãe fora de casa… nós<br />

to<strong>do</strong>s … meteu to<strong>do</strong>s em colégios. Dois em Matosinhos e eu e um irmão<br />

mais velho em Campanhã, no Centro Juvenil de Campanhã. Sobre os<br />

outros não sei. Eu tinha dez anos nessa altura… nesse tempo, em que vivi<br />

com a avó era bom. Dávamo-nos to<strong>do</strong>s bem. Eu an<strong>da</strong>va por lá com os<br />

meus irmãos e até ir para o colégio, com dez anos, nunca tinha i<strong>do</strong> à<br />

escola. No colégio estava com o meu irmão, um primo e um sobrinho … eu<br />

nem sabia <strong>da</strong> existência deste sobrinho, nem o conhecia. Foi ele que me<br />

disse que era filho de uma minha irmã… mas não sei o nome dela porque<br />

só descobri quan<strong>do</strong> ele me disse…foi um tempo triste… eu e o meu irmão<br />

chorávamos muitas vezes… como eu já lhe tinha conta<strong>do</strong>, a minha mãe<br />

tinha-nos aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong>… foi ela que nos levou, mas nem nos tinha<br />

avisa<strong>do</strong>… não é fácil viver com esse sentimento… desse tempo, no<br />

princípio <strong>do</strong> colégio, lembro-me que foi difícil porque tinha sau<strong>da</strong>des <strong>da</strong><br />

130 Pedro Strecht, Preciso de Ti, op. cit., pág. 99.<br />

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