Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto
Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto
Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
instância <strong>da</strong> personali<strong>da</strong>de designa<strong>da</strong> de superego, a Sociologia, por seu turno, abre<br />
um campo de reflexão sobre as causas <strong>da</strong>s rupturas no processo de socialização,<br />
demonstran<strong>do</strong> as circunstâncias em que o indivíduo (não) tem oportuni<strong>da</strong>de de criar<br />
um universo simbólico objectiva<strong>do</strong> em tipificações socialmente váli<strong>da</strong>s 287 .<br />
283<br />
Assim, a resolução <strong>da</strong>s crises de identi<strong>da</strong>de será sempre um processo<br />
determina<strong>do</strong> por influências internas e externas, pelo que compreender e intervir na<br />
sua dinâmica implica ter-se presente esta interdependência de factores.<br />
Faz, então, to<strong>do</strong> o senti<strong>do</strong> formular uma nova pergunta, susceptível de<br />
favorecer o aprofun<strong>da</strong>mento <strong>da</strong> nossa reflexão crítica. Se a identi<strong>da</strong>de é um processo<br />
dialéctico entre interiori<strong>da</strong>de individual e meio relacional, é preciso que nos<br />
interroguemos acerca <strong>da</strong>s alterações <strong>do</strong> meio social externo considera<strong>da</strong>s adequa<strong>da</strong>s.<br />
Certo que o internamento fornece um ambiente repara<strong>do</strong>r, mas será o<br />
retorno à vi<strong>da</strong> “normal” possível quan<strong>do</strong> na<strong>da</strong> foi transforma<strong>do</strong> no seu mun<strong>do</strong>?<br />
Se na<strong>da</strong> foi feito para que se apropriem de trunfos decisivos, como, por<br />
exemplo, a escolarização, que esperar <strong>do</strong> seu retorno ao mun<strong>do</strong> real? Será<br />
possível provocar mu<strong>da</strong>nças <strong>da</strong> identi<strong>da</strong>de profun<strong>da</strong> sem criar uma ver<strong>da</strong>deira<br />
ampliação <strong>da</strong>s oportuni<strong>da</strong>des de se apropriarem <strong>do</strong>s conhecimentos adequa<strong>do</strong>s<br />
à i<strong>da</strong>de em que se encontram? Como induzir mu<strong>da</strong>nças cognitivas profun<strong>da</strong>s se<br />
os a<strong>do</strong>lescentes mantêm a percepção de que nunca serão capazes de aceder ou<br />
participar, por meios socialmente legítimos, nos estilos de vi<strong>da</strong> considera<strong>do</strong>s<br />
normais na socie<strong>da</strong>de em que vivemos?<br />
Erikson 288 refere consequências psicopatológicas <strong>do</strong>s conflitos inerentes à<br />
superação <strong>da</strong> crise entre a iniciativa e a culpa que se podem vir a expressar quer sob<br />
a forma de culpa em face de qualquer activi<strong>da</strong>de propicia<strong>do</strong>ra de prazer, quer através<br />
de uma activi<strong>da</strong>de incansável de grande exibição <strong>da</strong> iniciativa e grande dependência<br />
face ao meio.<br />
Se a iniciativa impera sem quaisquer limites internos e externos, fica<br />
irremediavelmente ameaça<strong>da</strong> a possibili<strong>da</strong>de de desenvolver um sentimento de<br />
287 Cfr. Carlota Teixeira, O Tecer e o Crescer – Fios e Desafios ,op.cit. pág. 102<br />
Psicologia e Sociologia complementam-se, assim, no esclarecimento <strong>da</strong> plurali<strong>da</strong>de de factores e<br />
respectivas relações mútuas que (in)viabilizam a resolução equilibra<strong>da</strong> <strong>do</strong> conflito iniciativa/vergonha e<br />
culpa. A Psicologia, esclarece que o equilíbrio entre estes <strong>do</strong>is termos é a causa próxima <strong>do</strong> sucesso<br />
deste processo. A Sociologia, por seu turno, explica que este equilíbrio pode ser dificulta<strong>do</strong>, ou mesmo<br />
impedi<strong>do</strong>, por constrangimentos sociais exteriores à família e ao indivíduo, e que se lhe sobrepõem. De<br />
facto, e como há muito Merton assinalou, certas ―anormali<strong>da</strong>des‖ <strong>da</strong> estrutura social dão lugar à produção<br />
de (sub)culturas que se afastam <strong>da</strong>quela que é maioritária ou <strong>do</strong>minantemente aceite. A activi<strong>da</strong>de social<br />
comporta formas de agir, de pensar e de sentir que o indivíduo não escolheu e que, precisamente por<br />
este motivo, lhe são exteriores.<br />
288 Erik Erikson, A<strong>do</strong>lescence et Crise, Flammarion, France, 1972, pág. 126