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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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experiência <strong>da</strong> impotência e <strong>do</strong> fracasso? Que amor-próprio podem desenvolver se as<br />

expectativas <strong>do</strong>s professores a seu respeito são as mais baixas? Que amor-próprio<br />

podem desenvolver se os pais, toxicodependentes, os aban<strong>do</strong>nam a si próprios e para<br />

eles remetem as tarefas <strong>da</strong> sobrevivência?<br />

Como tivemos ocasião de expor em pontos anteriores, existe um<br />

consenso considerável em torno <strong>da</strong> tese que analisa a toxicodependência como efeito<br />

de uma socie<strong>da</strong>de em que o valor <strong>do</strong>s laços e <strong>da</strong>s relações afectivas se vai perden<strong>do</strong>,<br />

uma socie<strong>da</strong>de em que o químico e o consumo preenchem o vazio de valores e de<br />

elos colectivos. To<strong>da</strong>via, importa sublinhar que esse processo de desfiliação social, de<br />

que fala Robert Castel 72 , atinge de mo<strong>do</strong> particularmente drástico os que menos<br />

recursos detêm. A ascensão <strong>do</strong> individualismo que abor<strong>da</strong>mos em pontos anteriores<br />

aumenta exponencialmente a vulnerabili<strong>da</strong>de social <strong>do</strong>s mais pobres em capital<br />

económico, social e simbólico. Que implicações tem essa vulnerabili<strong>da</strong>de no plano<br />

psicológico? Que contornos assume o processo de separação/individuação nas<br />

famílias cuja existência se encontra muito próximo <strong>do</strong>s limites em que a vi<strong>da</strong> deixa de<br />

ser possível, em que as carências no plano alimentar se acumulam à falta de<br />

condições de higiene, de cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s básicos de saúde, de habitação condigna?<br />

Que particulari<strong>da</strong>des assumirá esse processo de separação/individuação<br />

quan<strong>do</strong> os membros <strong>da</strong> família são to<strong>do</strong>s ou quase to<strong>do</strong>s analfabetos, desemprega<strong>do</strong>s<br />

ou com empregos muito esporádicos? Que especifici<strong>da</strong>des decorrem <strong>da</strong> forte<br />

visibili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> situação <strong>da</strong>s famílias e <strong>do</strong>s indivíduos que vivem em bairros de lata,<br />

bairros degra<strong>da</strong><strong>do</strong>s, ou bairros de habitação social?<br />

Que peculiari<strong>da</strong>des atravessam o processo de individuação/separação<br />

em circunstâncias que tornam a família incapaz de gerar os recursos, materiais ou<br />

simbólicos, que permitem participação activa no jogo <strong>da</strong>s relações sociais? Que<br />

contornos toma esse processo quan<strong>do</strong> se cresce numa família carente <strong>da</strong>s<br />

competências para procurar meios de vi<strong>da</strong>? Serão possíveis relacionamentos<br />

familiares compatíveis com o estabelecimento de uma vinculação saudável, nos<br />

termos em que a definem os psicólogos nestas condições? De que mo<strong>do</strong> poderá a<br />

miséria, profun<strong>da</strong>mente desvaloriza<strong>da</strong> <strong>do</strong> ponto de vista simbólico, ameaçar as tarefas<br />

<strong>da</strong> construção identitária? Poderão os que existem ao abrigo <strong>da</strong> cari<strong>da</strong>de, pública ou<br />

priva<strong>da</strong>, estabelecer com os seus filhos o tipo de relação que neles pode gerar<br />

sentimentos de segurança?<br />

72 Robert Castel, As metamorfoses <strong>da</strong> questão social - uma crónica <strong>do</strong> salário, Editora Vozes, Petrópolis,<br />

2003.<br />

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