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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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177<br />

Pensan<strong>do</strong> nas vi<strong>da</strong>s <strong>do</strong>s jovens de que nos socorremos para pensar a<br />

droga enquanto manifestação de um comportamento aditivo 196 , faz senti<strong>do</strong> questionar<br />

até que ponto a existência quotidiana que se desenrola num território onde a maioria<br />

<strong>do</strong>s seus habitantes na<strong>da</strong> tem a ganhar porque, também, na<strong>da</strong> tem perder, provoca a<br />

emergência de subculturas que tendem a inverter a escala de valores. O senti<strong>do</strong><br />

comum atribuí<strong>do</strong> ao tráfico de droga, como prática justificável pela necessi<strong>da</strong>de de<br />

alimentar os filhos, assim como aos diversos tipos de expedientes para satisfazer<br />

necessi<strong>da</strong>des e desejos interditos pelas vias considera<strong>da</strong>s mais normais é o que<br />

povoa o universo simbólico <strong>do</strong>s jovens em causa. Por outras palavras, cabe admitir a<br />

hipótese de estes jovens não haverem ti<strong>do</strong> oportuni<strong>da</strong>des de partilhar outras<br />

experiências, tal como não tiveram oportuni<strong>da</strong>de de contactar com outras formas de<br />

responder às dificul<strong>da</strong>des <strong>da</strong> existência sem passar pela transgressão. O<br />

comportamento é social quan<strong>do</strong> diferentes seres humanos respondem <strong>da</strong> mesma<br />

forma ao mesmo gesto e partilham as mesmas experiências.<br />

Ao afirmar que o ser humano possui um self, G. H. Mead pretende<br />

salientar que o indivíduo age socialmente na relação com as outras pessoas, ao<br />

mesmo tempo que interage socialmente consigo próprio. A construção <strong>do</strong> self<br />

depende <strong>da</strong>s ―definições‖ devolvi<strong>da</strong>s pelos outros que assim servem de referencial<br />

para que o indivíduo possa ver-se a si mesmo. A socie<strong>da</strong>de representa, pois, o<br />

contexto dentro <strong>do</strong> qual o self surge e se desenvolve. Isto significa que se não estiver<br />

integra<strong>do</strong> num contexto de interacção com outros, o indivíduo não pode, sequer,<br />

pensar sobre si próprio.<br />

Na continuação <strong>do</strong> exercício de aplicação <strong>da</strong> teoria de Mead ao caso<br />

específico <strong>do</strong>s jovens que estamos a analisar, não parece descabi<strong>do</strong> assinalar que o<br />

fechamento <strong>da</strong>s suas sociabili<strong>da</strong>des num círculo restrito de actores socialmente muito<br />

idênticos não poderá deixar de pesar sobre a natureza <strong>do</strong> estádio de imitação na<br />

primeira infância, expon<strong>do</strong>-os ao contacto regular e relativamente generaliza<strong>do</strong> com o<br />

tráfico e o consumo <strong>da</strong>s drogas. Expon<strong>do</strong>-os, sobretu<strong>do</strong>, a mo<strong>do</strong>s de vi<strong>da</strong> cujo traço<br />

característico mais forte será a capitulação face aos pesa<strong>do</strong>s constrangimentos e à<br />

competição social. Diria Pierre Bourdieu que enfrentam o mun<strong>do</strong> com ―as armas <strong>do</strong>s<br />

desarma<strong>do</strong>s‖. Num submun<strong>do</strong> relacional onde a maioria define como legítimas práticas<br />

de ganhar a vi<strong>da</strong> alternativas ao trabalho considera<strong>do</strong> honesto, que na reali<strong>da</strong>de não<br />

são mais <strong>do</strong> que a manifestação de uma terrível impotência para se fazer valer numa<br />

socie<strong>da</strong>de fortemente competitiva, não há margem para duvi<strong>da</strong>r que os mais novos, à<br />

196 Terminologia de Cândi<strong>do</strong> <strong>da</strong> Angra in ―Sujeito Autopoiético e Toxicodependência” Centro Internacional<br />

de Criminologia Compara<strong>da</strong>, Universi<strong>da</strong>de de Montreal, 1991.

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