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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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criou …só soube que ele não era meu pai quan<strong>do</strong> ele morreu, tinha eu 17<br />

anos …. A minha mãe estava sempre a aban<strong>do</strong>nar-nos … ia e vinha … ia e<br />

vinha …entre eles havia muita violência…eu sou o mais velho de 4 irmãos,<br />

um rapaz que tem 19 anos e duas irmãs, uma de 18 e outra de 15 anos …<br />

até aos meus 13 anos, vivemos juntos com o meu pai … vivíamos com<br />

muitas dificul<strong>da</strong>des…faltava dinheiro para comer…para a água, para a luz,<br />

para tu<strong>do</strong>…depois, fui para um colégio … foi pior <strong>da</strong>í para a frente …vivia<br />

revolta<strong>do</strong>, sempre revolta<strong>do</strong>…eu quase não vivi com a minha mãe . Ela ia e<br />

vinha. … não queria saber … ela teve pouca importância na minha vi<strong>da</strong>. ..<br />

quem teve mesmo foi o meu pai … sentia raiva porque ela só estava poucos<br />

dias … ela dizia que aban<strong>do</strong>nou a nós por o meu pai ser alcoólico …Mas<br />

deixou-nos muitas vezes. O meu pai trabalhava e nós íamos para a escola<br />

… O meu pai era calceteiro…vivíamos mal…também às vezes não<br />

comíamos em condições…havia pouco dinheiro, … éramos muitos, só com<br />

o meu pai a trabalhar…<br />

Quan<strong>do</strong> eu tinha 12 anos, as minhas irmãs foram para um colégio … foi pior<br />

… o meu pai falava muito connosco, de madruga<strong>da</strong> … falávamos muito.<br />

Falávamos de coisas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, <strong>do</strong> que devíamos ser. Aos 13 anos fui para<br />

um colégio. O meu pai esteve de acor<strong>do</strong> e eu achei que ia ser bom, ia estar<br />

com as minhas irmãs, íamos voltar a estar to<strong>do</strong>s juntos, porque o meu irmão<br />

também foi para o colégio … Achei que podia ser bom…mas não foi… foi<br />

pior…fiz muitas coisas más…como já lhe disse, até querer morrer…O meu<br />

pai visitava-me. O meu pai quis que fossemos para o colégio porque já<br />

metia tribunal e tu<strong>do</strong>. Outros… (a paróquia), outros pensavam ser melhor<br />

para to<strong>do</strong>s. A minha mãe não sei o que pensava, só foi lá uma ou duas<br />

vezes com o meu pai…. mas também já metia assistente social e tribunal…<br />

era difícil continuar a viver só com o meu pai, naquele ambiente… ele era<br />

alcoólico, mas dizia coisas importantes…<br />

Hoje eu sei que eram importantes. Falávamos de como sermos, <strong>do</strong> futuro,<br />

de como tínhamos que ser para ser gente. O meu pai dizia que eu podia ser<br />

alguém. Podia ser o que eu quisesse. Da minha mãe é que não falávamos.<br />

Esse é que era o ponto fraco. O meu pai tinha um ponto fraco que éramos<br />

nós. Esse era o seu ponto fraco. O meu pai era capaz de matar por nós, se<br />

alguém nos quisesse fazer mal…<br />

A vi<strong>da</strong> era difícil… o meu pai batia-me, mas eu não ligava, já não sentia….<br />

bater-me ou não era indiferente… os meus irmãos tinham me<strong>do</strong>… no início<br />

eu também tinha, mas, depois, não tinha. Eu também tinha me<strong>do</strong>. Tinha,<br />

tinha muito me<strong>do</strong>. Eu agia revolta<strong>do</strong> e era só me<strong>do</strong>. Me<strong>do</strong> de tu<strong>do</strong> à minha<br />

volta.… tanto fazia que me batesse como não… na<strong>da</strong> me importava… só<br />

queria proteger os meus irmãos… o meu pai batia-me só a mim… eu não<br />

deixava que batesse aos meus irmãos… batia-me quan<strong>do</strong> bebia… eu já não<br />

sentia… não sentia na<strong>da</strong>… não queria saber, o que me importava eram os<br />

meus irmãos… e porque percebia que o meu pai também tinha conversas<br />

importantes connosco…<br />

Vasco (17 anos)<br />

Conhecemo-nos numa Comuni<strong>da</strong>de Terapêutica. O seu percurso de vi<strong>da</strong><br />

engloba duas transições relevantes: uma primeira transição, <strong>da</strong> família de origem para<br />

um Colégio, em regime de internato, quan<strong>do</strong> tinha 7 anos; e uma segun<strong>da</strong>, quan<strong>do</strong><br />

ingressa na Comuni<strong>da</strong>de. De notar, contu<strong>do</strong>, que entretanto passou por vários<br />

Colégios, <strong>do</strong>s quais fez fugas sistemáticas. Desse perío<strong>do</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, até aos 7 anos,<br />

Vasco recor<strong>da</strong> ter vivi<strong>do</strong> com o pai, a mãe e um irmão mais velho, cerca de 10 anos, e<br />

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