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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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É uma tese tanto mais para<strong>do</strong>xal quanto, como assinala este autor, a<br />

afirmação <strong>da</strong> independência e <strong>da</strong> autonomia individuais recolhe uma adesão sem<br />

precedentes na história <strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de. Contu<strong>do</strong>, se formos mais fun<strong>do</strong> na análise <strong>da</strong><br />

concepção de liber<strong>da</strong>de que impera nas socie<strong>da</strong>des contemporâneas, podemos<br />

descobrir que essa concepção remete para um individualismo exacerba<strong>do</strong> inscrito num<br />

processo, mais amplo, de autêntica destruição <strong>do</strong>s elos sociais. Da desvinculação<br />

entre o indivíduo e a socie<strong>da</strong>de, uma <strong>da</strong>s características mais fortes <strong>da</strong>s modernas<br />

socie<strong>da</strong>des mais desenvolvi<strong>da</strong>s, resulta um conjunto de efeitos francamente perversos<br />

no que respeita às possibili<strong>da</strong>des de se poder ser efectivamente livre.<br />

O enfraquecimento <strong>do</strong>s laços colectivos (que é possível constatar em<br />

to<strong>do</strong>s os contextos de socialização, desde a religião, ao trabalho, à família, passan<strong>do</strong><br />

pela escola e instâncias <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> partidária e política) é um fenómeno visível no<br />

desvanecimento <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> <strong>do</strong>s valores morais comuns e <strong>do</strong>s laços de soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de,<br />

na recusa <strong>do</strong> compromisso e falta de exigências <strong>do</strong>s adultos na educação <strong>da</strong>s<br />

crianças.<br />

Numa socie<strong>da</strong>de em que a liber<strong>da</strong>de e a independência individuais são<br />

ditas e reafirma<strong>da</strong>s com uma intensi<strong>da</strong>de jamais alcança<strong>da</strong> em outros tempos, assiste-<br />

se precisamente ao desencadear de uma plurali<strong>da</strong>de de lógicas e de processos que,<br />

pelo contrário, matam as possibili<strong>da</strong>des de se ser livre. Quan<strong>do</strong> o indivíduo não tem<br />

outras referências a não ser ele próprio, a não ser os seus desejos, os seus<br />

interesses, a sua necessi<strong>da</strong>de de reconhecimento social, essa estranha liber<strong>da</strong>de<br />

deste século, então, estão cria<strong>da</strong>s as condições para se lançar numa imaginária vi<strong>da</strong><br />

de inovação, expon<strong>do</strong>-se a experiências que contêm o risco de desencadear<br />

comportamentos, muitas vezes, regressivos nos planos individual e cultural.<br />

Num contexto de crise generaliza<strong>da</strong> <strong>do</strong>s mecanismos de integração<br />

social, em virtude de uma fragilização sem precedentes <strong>da</strong>s normas colectivas, os<br />

indivíduos, sobretu<strong>do</strong> os <strong>da</strong>s jovens gerações, deixam de ter à sua disposição as<br />

referências construí<strong>da</strong>s pelas gerações anteriores, muitas vezes, à custa de esforços<br />

consideráveis. Deixam de poder partilhar valores e projectos colectivos que conferem<br />

um senti<strong>do</strong> à existência e alimentam a ver<strong>da</strong>deira capaci<strong>da</strong>de de criar o novo e<br />

exercer a liber<strong>da</strong>de.<br />

Sem essa ligação à reali<strong>da</strong>de colectiva que, como analisou Durkheim,<br />

proporciona a consciência <strong>do</strong>s constrangimentos reais e, desse mo<strong>do</strong>, aju<strong>da</strong> a situar<br />

os desejos individuais num quadro de possibili<strong>da</strong>des objectivas, aumentam as<br />

probabili<strong>da</strong>des de ocorrerem processos de individualismo auto-destrutivo. O estu<strong>do</strong><br />

clássico deste autor acerca <strong>do</strong> suicídio, demonstran<strong>do</strong> a relação entre a fraqueza <strong>da</strong><br />

coesão social e a incidência <strong>da</strong>s taxas de suicídio continua a ser uma referência<br />

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