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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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É inegável que a centrali<strong>da</strong>de que foi conferi<strong>da</strong> aos direitos <strong>do</strong> homem<br />

nas modernas sociais-democracias europeias traduz o reconhecimento político <strong>do</strong><br />

individualismo e que a história <strong>da</strong> individualização foi em grande medi<strong>da</strong>, uma história<br />

<strong>da</strong> emancipação. Emancipação relativamente às tradições que aprisionavam a vi<strong>da</strong><br />

quotidiana, emancipação relativamente a to<strong>da</strong>s as figuras <strong>da</strong> dependência social, de<br />

que a libertação <strong>da</strong> mulher <strong>do</strong> círculo familiar, ou a conquista <strong>da</strong> independência por<br />

parte <strong>do</strong>s jovens, são exemplos <strong>do</strong>s mais notáveis. Mas esta fase ―globalmente<br />

positiva‖ <strong>do</strong> individualismo moderno, enquanto meio de progresso e de libertação, está<br />

hoje a chegar ao fim, na sequência <strong>do</strong> lento, mas inexorável, apagamento <strong>da</strong>s<br />

instituições sociais que organizavam e canalizavam os comportamentos individuais.<br />

O <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> trabalho assalaria<strong>do</strong> é precisamente um <strong>da</strong>queles em que<br />

as normas prescritas conheceram recuos severamente devasta<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s laços<br />

sociais, muitos deles conquista<strong>do</strong>s à custa de enormes sacrifícios e sofrimentos <strong>do</strong>s<br />

assalaria<strong>do</strong>s. Crenças e normas colectivas que haviam garanti<strong>do</strong> as bases <strong>do</strong><br />

exercício <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de esboroam-se, ao mesmo tempo que os corpos intermédios.<br />

Exemplo disso é a criação de uma ―nova‖ legislação <strong>do</strong> trabalho destina<strong>da</strong> a destruir a<br />

eficácia <strong>da</strong> organização e acção colectivas que os sindicatos haviam dinamiza<strong>do</strong>.<br />

O desaparecimento <strong>da</strong> classe operária como força de integração e de<br />

identificação, a erosão <strong>do</strong>s sindicatos que haviam alimenta<strong>do</strong> a afirmação <strong>da</strong>s classes<br />

trabalha<strong>do</strong>ras, são fenómenos que ilustram bem até que ponto o esbatimento <strong>do</strong>s<br />

pontos de referência sociais habituais tornou problemáticos os mecanismos de<br />

identificação colectiva nas socie<strong>da</strong>des actuais. As reivindicações e as aspirações, que<br />

anteriormente podiam ser agrega<strong>da</strong>s, canaliza<strong>da</strong>s e instrumentaliza<strong>da</strong>s pelas<br />

organizações sindicais, deixaram de tomar a luta de classes como motor <strong>da</strong> regulação<br />

e <strong>da</strong> integração social e transformam-se em apelos directos ao Esta<strong>do</strong>.<br />

Em face <strong>da</strong> destruição <strong>do</strong> colectivo e <strong>do</strong> desaparecimento <strong>da</strong>s<br />

representações positivas sobre o progresso social, assiste-se ao recrudescimento <strong>do</strong>s<br />

interesses particulares e a formas inéditas de crispação na socie<strong>da</strong>de. Se já não existe<br />

uma representação positiva <strong>do</strong> progresso capaz de gerar uma união, prevalece a<br />

conservação <strong>do</strong> statu quo e a defesa <strong>da</strong>s ―regalias adquiri<strong>da</strong>s‖.<br />

A conquista <strong>da</strong> independência pessoal que, durante muito tempo, foi um<br />

vector <strong>da</strong> evolução positiva surge hoje acompanha<strong>da</strong> de factores mais negativos. Ou<br />

seja, a individualização ocorre num contexto de generaliza<strong>da</strong> desligação, pelo que<br />

existem fortes probabili<strong>da</strong>des de a independência se transformar em vulnerabili<strong>da</strong>de.<br />

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