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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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François Dubet refere a respeito <strong>do</strong>s jovens franceses residentes nos<br />

subúrbios que a degra<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>s condições de vi<strong>da</strong> também se manifesta nas relações<br />

hostis ou difíceis que opõem os mora<strong>do</strong>res desses lugares relega<strong>do</strong>s. O recurso a<br />

cães treina<strong>do</strong>s para atacar as pessoas, o uso de armas de fogo ou armas brancas, a<br />

destruição de vidros, paredes, mobiliário, tu<strong>do</strong> isso são alguns sinais <strong>da</strong> violência que<br />

impera nestes habitats. A aprendizagem social <strong>do</strong>s jovens inseri<strong>do</strong>s nestes meios<br />

desde a infância ocorre num quadro de interacções pauta<strong>da</strong>s pela agressivi<strong>da</strong>de e a<br />

desconfiança entre os adultos. As possibili<strong>da</strong>des de aprenderem a situar-se no mun<strong>do</strong><br />

social não melhoram por via <strong>do</strong> seu ingresso na escola. Na reali<strong>da</strong>de, as escolas têm-<br />

se torna<strong>do</strong> contextos de relacionamento social ver<strong>da</strong>deiramente problemáticos <strong>do</strong><br />

ponto de vista <strong>da</strong> aprendizagem social. Não correremos o risco de enviesar a<br />

reali<strong>da</strong>de se, como o próprio Dubet sublinha, dissermos que entre os professores<br />

prevalecem certos tipos de conduta, to<strong>do</strong>s eles igualmente incapazes de cumprir as<br />

tarefas inerentes à educação. A imprevisibili<strong>da</strong>de <strong>do</strong> seu comportamento, o recurso<br />

exclusivo à punição como forma de regular to<strong>do</strong> e qualquer acto de indisciplina,<br />

mesmo que este seja de pequena gravi<strong>da</strong>de, a per<strong>da</strong> de controlo sobre as condutas, a<br />

ponto de se deixarem bater ou desrespeitar, to<strong>da</strong>s essas atitudes <strong>do</strong>s <strong>do</strong>centes<br />

contribuem para tornar impossível o trabalho de elaboração <strong>do</strong>s impulsos e <strong>do</strong>s<br />

desejos, a aprendizagem <strong>do</strong>s valores e <strong>da</strong>s regras colectivas. Os muitos sinais de<br />

violência juvenil no seio <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de escolar expressam o vazio normativo que hoje<br />

impera neste importante contexto de socialização.<br />

Os testemunhos que recolhemos revelam que, sem excepção, os jovens<br />

iniciaram a sua vi<strong>da</strong> em famílias e contextos habitacionais gravosamente priva<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s<br />

recursos de que mais decisivamente depende a obtenção de um lugar na socie<strong>da</strong>de.<br />

Na reali<strong>da</strong>de, não é apenas a desqualificação profissional, a ausência de emprego e a<br />

inexistência de meios de ganhar a vi<strong>da</strong> em moldes socialmente legítimos que definem<br />

o quadro de vi<strong>da</strong> <strong>do</strong>s adultos que povoam o universo <strong>do</strong>s jovens cujas vi<strong>da</strong>s<br />

pretendemos conhecer. Outras privações bem mais graves <strong>do</strong> ponto de vista <strong>da</strong><br />

obtenção de um lugar social estiveram presentes nas suas curtas vi<strong>da</strong>s,<br />

designa<strong>da</strong>mente a restrição <strong>da</strong>s redes de relacionamento social aos iguais e a<br />

desvalorização simbólica indutora de relegação social. Perante uma conjugação de<br />

factores tão perversos, as aprendizagens <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> social ficam inevitavelmente<br />

comprometi<strong>da</strong>s, não sen<strong>do</strong> descabi<strong>do</strong> conceber a hipótese de a toxicodependência<br />

ser induzi<strong>da</strong> pela necessi<strong>da</strong>de de pertencer.

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