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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Ilídio<br />

eu tornei-me rebelde porque quero uma vi<strong>da</strong> diferente… quero<br />

activi<strong>da</strong>des de risco… como fazer surf e an<strong>da</strong>r de moto… os meus pais<br />

não mo autorizam… não tenho de seguir o que eles querem… eu sei o<br />

que pode ser melhor para mim… e não é com certeza a vi<strong>da</strong> que me<br />

querem impor… se calhar faço muitas coisas porque não gosto de<br />

mim… não gosto <strong>da</strong> minha imagem… mas não há forma de esquecer o<br />

passa<strong>do</strong>… e não me parece que para isso tenha de estar interna<strong>da</strong><br />

numa clínica.<br />

Para mim foi triste vir para a clínica porque me custou deixar o meu irmão<br />

e o meu primo e ter vin<strong>do</strong> para aqui sozinho… a assistente social explicou<br />

que eu vinha para cá para deixar de consumir drogas e que depois voltava<br />

para a minha avó e os meus irmãos… fican<strong>do</strong> cá, acho que vou ficar mais<br />

forte para lá fora saber li<strong>da</strong>r com as drogas e com amigos negativos… e<br />

com os meus problemas …<br />

Neste momento, o que quero mais é sair <strong>da</strong>qui e ir ter com o meu irmão e<br />

fazer a nossa vi<strong>da</strong>. Já estou cá há um ano e três meses… tive aqui maus<br />

momentos, maus momentos porque não fiz o que devia, não fiz terapia…<br />

por exemplo, devia fazer e não fiz, aju<strong>da</strong>r outros que gostavam de mim e<br />

eu só pensava em mim e não ajudei, falar de mim, custa-me muito… custa<br />

fazer terapia… custa falar de mim e <strong>do</strong>s meus problemas com outros, com<br />

outros que não conheço, porque custa aqui na comuni<strong>da</strong>de é difícil<br />

cumprir com to<strong>da</strong>s as regras mas, principalmente com a terapia… é difícil<br />

fazer a terapia… o que me custa mais é ser confronta<strong>do</strong> e partilhar<br />

sentimentos… confrontar custa ain<strong>da</strong> mais porque é mais difícil ter que<br />

responder e ter de fazer perguntas aos outros… às vezes também custa<br />

ter de cumprir direcções… porque às vezes não apetece fazer as tarefas…<br />

também custa assumir responsabili<strong>da</strong>des… é preciso estar atento a nós e<br />

aos outros… é isso que se espera na vi<strong>da</strong> desta família… que ajudemos<br />

para também dessa maneira nos aju<strong>da</strong>rmos a nós próprios… eu no<br />

colégio também tinha regras e cumpria… os horários, por exemplo, o ir às<br />

aulas, o respeitar os outros… eu não tinha problemas com os outros…<br />

também era bem comporta<strong>do</strong> com os professores e com os colegas… vim<br />

para aqui por causa <strong>da</strong>s drogas… eu gostava era de voltar para a minha<br />

avó… agora já sou mais cresci<strong>do</strong> e não queria ir para o colégio… eu vou<br />

começar a trabalhar… sim, eu sei que é to<strong>do</strong>s os dias, mas eu não me<br />

importo… o meu me<strong>do</strong> é de voltar a consumir, porque aí tu<strong>do</strong> se estraga…<br />

foi difícil habituar-me aqui… durante to<strong>do</strong> este tempo eu já fugi muitas<br />

vezes, mas voltei sempre e nunca consumi <strong>da</strong>s vezes em que fugi… fugi<br />

para casa <strong>da</strong> minha avó… voltava sempre porque quero me tratar, porque<br />

tenho me<strong>do</strong> de algum dia voltar a consumir, porque não quero ter uma<br />

vi<strong>da</strong> com droga, porque quero ter um trabalho e fazer a minha vi<strong>da</strong>, mas<br />

tenho me<strong>do</strong> de voltar a consumir… na casa <strong>da</strong> minha avó, ia buscar<br />

carinho, ia procurar carinho… aqui tenho amigos, posso aju<strong>da</strong>r amigos a<br />

ficarem mais fortes mas não posso ter aquele carinho <strong>da</strong> minha avó… falo<br />

de festas e de mimos… e isso a minha avó dá-me e depois dá-me dinheiro<br />

para os transportes para eu regressar à clínica. …<br />

Quan<strong>do</strong> sair <strong>da</strong>qui penso arranjar trabalho, talvez num café junto ao<br />

restaurante onde a minha mãe trabalha e vai ser uma surpresa, uma<br />

grande surpresa para a minha mãe… ela vai ficar contente, mesmo que<br />

tenha outra vi<strong>da</strong>, vai ficar surpreendi<strong>da</strong> de ver este seu filho agora<br />

cresci<strong>do</strong> e a trabalhar.<br />

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