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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Ilídio<br />

Eu fui para um colégio em Campanhã, no <strong>Porto</strong>… eu ia à escola de DD e<br />

juntei-me às pessoas que conhecia e fumava ―ganza‖ e fazia disparates …<br />

comprava a droga a uns que an<strong>da</strong>vam no colégio, ou que iam lá, mas não<br />

iam às aulas…<br />

Era fácil arranjar a droga… conheci<strong>do</strong>s, amigos de amigos,… e há em muito<br />

la<strong>do</strong>, mas geralmente eu comprava na escola… não tinha me<strong>do</strong>… havia<br />

sempre quem tinha para vender…<br />

Fumávamos de manhã, almoçava na escola e, de tarde, íamos roubar e<br />

fazer ―mer<strong>da</strong>‖ … roubávamos lojas, carros, pessoas, roubávamos para ter<br />

dinheiro e comprar mais e beber e consumir… Sentia que podia fumar à<br />

minha vontade, consumia e não acontecia na<strong>da</strong>. Quanto mais fazia, mais<br />

queria.<br />

Parece que gostava <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> que estava a levar. Nunca se pensa mais na<strong>da</strong>.<br />

Se calhar, sentia-me um homem diferente. Era um homem que tinha<br />

problemas familiares e, de repente, mu<strong>do</strong>u de vi<strong>da</strong>. Fumava droga e era<br />

outra experiência de vi<strong>da</strong>… nessa fase ain<strong>da</strong> pensava que roubar era<br />

necessário, era para a droga… tinha de me safar… tinha de me fazer à<br />

vi<strong>da</strong>…<br />

Fui expulso porque fumava no colégio, virava-me a to<strong>do</strong>s, não queria saber<br />

<strong>do</strong> que me diziam, só fazia o que queria, não ia à escola. … Quan<strong>do</strong> mudei<br />

outra vez de colégio, tinha 16 anos, mas fiquei na mesma escola. É nesta<br />

altura que comecei a consumir a ―branca‖. Foi um colega meu que ma deu e<br />

eu gostei. Depois, há um momento, no Natal, em que o meu irmão veio cá<br />

fora e fica em casa desse meu colega que já tinha vinte e tal anos e vivia<br />

sozinho. Consumimos os três. Geralmente comprávamos sempre à mesma<br />

pessoa, mas se ela acabava procurávamos outros sítios e outras pessoas…<br />

não era difícil… conhecíamos os lugares e quem vendia…<br />

A heroína era diferente <strong>da</strong> ―ganza‖. Podia ficar to<strong>do</strong> luso, mas só no<br />

momento em que puxa, depois porque depois fico to<strong>do</strong> mole, não conseguia<br />

an<strong>da</strong>r. A branca é diferente, quer mais e mais. Ficava com ansie<strong>da</strong>de …<br />

Continuava no colégio, mas só consumia… Roubava e fazia ―mer<strong>da</strong>‖…<br />

Chegava ao colégio e portava-me mal, berrava com os monitores, com<br />

to<strong>do</strong>s … só queria estar só … Os meus dias eram só a consumir, consumir,<br />

consumir … Consumia em casa desse meu colega… nessa fase já não<br />

queria saber de ninguém… só <strong>da</strong> droga…<br />

Comecei a perceber que a droga não resolvia na<strong>da</strong>, não resolvia os meus<br />

problemas, mas não conseguia parar. Com a droga só arranjava mais<br />

problemas e, então, rejeitava os outros e no colégio só fazia ―mer<strong>da</strong>‖, como,<br />

por exemplo, comecei a roubar, havia pessoas que já não confiavam em<br />

mim, roubava coisas de valor, se havia alguém que me queria aju<strong>da</strong>r, eu<br />

empurrava, batia, não queria saber, faltava às aulas …<br />

Não consigo explicar o que sentia … acho que me sentia mal, sentia-me só,<br />

não queria viver … queria enterrar-me, enterrar-me … não conseguia parar,<br />

sei lá, pensava assim, agora que comecei, vou enterrar-me. Já tinha<br />

problemas, já tinha a droga, roubei, sei lá, não via saí<strong>da</strong> … Os problemas?<br />

achava que eram problemas de infância, o meu pai ter-me bati<strong>do</strong> sem eu<br />

perceber porquê, o meu irmão preso … se calhar meti-me na droga para<br />

não viver esses sentimentos …<br />

Foi no colégio que comecei a consumir. Tinha onze anos quan<strong>do</strong> vi o meu<br />

sobrinho a fumar haxixe e também quis experimentar para saber como era.<br />

Depois também fui para a escola e também tinha lá amigos negativos,<br />

éramos um grupo e, nos intervalos, íamos para a casa de banho fumar<br />

haxixe. Aprender a fumar foi fácil… há sempre quem já tenha<br />

experimenta<strong>do</strong> e ajude os outros… dinheiro para a droga, não precisava…<br />

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