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Maria Luisa Pinto.pdf - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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se encontram sob a influência <strong>da</strong> droga. É na sequência de uma ou várias<br />

experiências deste tipo que descobrirá que o seu desvio pode permanecer secreto e<br />

que a sua prudência era excessiva e sem fun<strong>da</strong>mento. Se deseja tomar regularmente<br />

droga, não será mais dissuadi<strong>do</strong> pelos seus receios.<br />

160<br />

Mas, como assinala Becker, o problema não é igualmente agu<strong>do</strong> para<br />

to<strong>do</strong>s os fuma<strong>do</strong>res. Alguns deles estão protegi<strong>do</strong>s pelo seu mo<strong>do</strong> de participação na<br />

vi<strong>da</strong> social, caso <strong>do</strong>s que estão completamente integra<strong>do</strong>s num grupo desviante.<br />

To<strong>da</strong>s as pessoas que o frequentam sabem que fumam marijuana e ninguém se<br />

preocupa com isso, ao mesmo tempo que os seus contactos com o mun<strong>do</strong><br />

convencional são raros e sem importância.<br />

Bernar<strong>do</strong><br />

―Aos oito anos agarrei-me, foi a primeira vez que consumi, substâncias<br />

pesa<strong>da</strong>s … a primeira vez, foi mais por prazer. Eu <strong>da</strong>va-me com pessoal de<br />

20 anos que consumia coca e eu queria ser como eles. E fui parar ao<br />

hospital. Quan<strong>do</strong> vim <strong>do</strong> hospital, fiquei uns meses sem consumir mas<br />

depois voltei a fumar charros, entre os 8 e os 10 anos, e depois aos 10 anos<br />

foi alucinogénios e coca. ...<br />

Os meus dias passaram a ser dias normais de só fazer ―mer<strong>da</strong>‖. De<br />

consumo… quan<strong>do</strong> não ia à escola, isto é, à tarde e à noite, assaltava<br />

ourivesarias, stands, lojas, orientava-me na rua… comecei a <strong>da</strong>r os<br />

primeiros passos, acharam que os planos <strong>da</strong>vam e, então, eu man<strong>da</strong>va<br />

naquela ―porra‖ to<strong>da</strong>. Nem sei bem dizer o que eram aqueles dias. Não sei o<br />

que tirar <strong>da</strong>li. Mas os roubos, os assaltos que fazíamos eram sempre para<br />

termos o que queríamos, roupa, motos, coisas, coisas para carros e às<br />

vezes para comprar acessórios de desporto ou certas coisas que também<br />

traficávamos, «enchousas» … enchousas são coisas, substâncias ilegais<br />

que se compram para nos fazermos à vi<strong>da</strong>, no grupo, por exemplo, tantos<br />

no trabalho, eu não podia estar seguro de mim quan<strong>do</strong> planava. Receava planar demasia<strong>do</strong> e relaxar-me<br />

completamente ou fazer coisas idiotas. Eu não queria quebrar. (Como saíste disso?) Ora bem, meu velho.<br />

São coisas que acontecem. Uma noite eu consumi e de repente senti-me ver<strong>da</strong>deiramente bem, relaxa<strong>do</strong>,<br />

tu sabes, ver<strong>da</strong>deiramente em forma. Desde esse dia eu fiquei perfeitamente capaz de fumar sempre que<br />

o desejava sem ter aborrecimentos. Eu posso sempre controlar tu<strong>do</strong> isso.‖<br />

(Eu sugeri que numerosos fuma<strong>do</strong>res achavam difícil serem eficazes no seu trabalho quan<strong>do</strong> estavam<br />

sob a influência <strong>da</strong> droga. Em resposta, o operário <strong>da</strong> máquina entrevista<strong>do</strong> contou-me como tinha<br />

ultrapassa<strong>do</strong> este obstáculo)<br />

―Não é isso que me atormenta. Fiz uma experiência uma vez que me persuadiu disso. Eu estava de saí<strong>da</strong><br />

de uma vigilância e foi uma noite sagra<strong>da</strong>! Planei ver<strong>da</strong>deiramente. Tínhamos consumi<strong>do</strong> erva e também<br />

álcool. Eu tinha plana<strong>do</strong> de tal maneira que ain<strong>da</strong> não tinha reencontra<strong>do</strong> o meu espírito no dia seguinte<br />

quan<strong>do</strong> fui trabalhar. E tinha um trabalho muito importante a fazer, um trabalho de precisão que devia ser<br />

feito na perfeição. O patrão tinha-me explica<strong>do</strong> alguns dias antes e tinha-me dito com se deveria fazer<br />

tu<strong>do</strong> isso.‖ (Ele foi trabalhar sob a influência <strong>da</strong> droga e ele conseguiu fazer o trabalho, ain<strong>da</strong> que o seu<br />

esta<strong>do</strong> não lhe tivesse permiti<strong>do</strong> guar<strong>da</strong>r dele uma memória clara). ―Por volta <strong>da</strong>s quatro horas menos um<br />

quarto, eu acabei por vir a mim mesmo e disse a mim próprio: ―em nome de Deus! O que é que eu estou<br />

em vias de fazer?‖ Foi o tempo de cortar a electrici<strong>da</strong>de e fui para casa. Quase não <strong>do</strong>rmi nessa noite.<br />

Estava inquieto, perguntava-me se eu tinha feito ―mer<strong>da</strong>‖ neste trabalho ou não. Eu regressei lá np dia<br />

seguinte de manhã; o patrão pôs o assunto à discussão: eu tinha consegui<strong>do</strong> executar este trabalho na<br />

perfeição. Depois disso, nunca mais me preocupei. Há algumas manhãs em que estou a trabalhar sem<br />

estar totalmente no meu espírito, asseguro-te, mas eu nunca tive aborrecimentos‖.

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